Bolsonaristas falsificam “chegada apoteótica” de Bolsonaro nos EUA
Foto: Reprodução
Os conteúdos distribuídos nas redes bolsonaristas sobre a visita de Jair Bolsonaro à Nova York para participar da Assembleia Geral das Nações Unidas retratam uma viagem bem diferente do que de fato ocorreu. Ao longo do dia, os grupos de WhatsApp e Telegram foram inundados de vídeos e postagens sugerindo que Bolsonaro foi aplaudido por uma multidão e se tornou uma “celebridade mundial”, além de edições da conversa com o primeiro-ministro do Reino Unido, Boris Johnson, sem a cena em que o britânico pergunta se Bolsonaro tomou a vacina contra a Covid-19.
O vídeo mais reproduzido ao longo do dia, postado inclusive na rede Gettr, do ex-assessor de Donald Trump Jason Miller, mostra Bolsonaro supostamente chegando ao Aeroporto Internacional John F. Kennedy, em Nova York, e sendo recebido por uma multidão que invade o saguão do aeroporto para abraçá-lo.
No vídeo, Bolsonaro faz uma chegada apoteótica ao som de Locked Out Of Heaven, de Bruno Mars. Depois, é carregado pelos apoiadores – algo recorrente na campanha presidencial de 2018 – e ainda coloca os óculos que significaram, à época, a representação do “mito” Bolsonaro.
Como legenda para as imagens, os seguidores do presidente postaram: “Bolsonaro chegando no aeroporto internacional JFK em Nova York ! Olha a situação que ficou o saguão de desembarque do aeroporto………”, dizia uma legenda. Em outra, lia-se : “Bolsonaro celebridade mundial”.
Tudo fake. A gravação, na verdade, é de maio de 2018 e foi feita em Natal (RN), quando o então deputado federal percorria o país como candidato.
Alguns até alertaram que o vídeo no aeroporto era antigo, mas não houve jeito. No mundo paralelo do WhatsApp bolsonarista, os “fatos alternativos” sempre colam. “Bolsonaro chega a NY para fazer um discurso na ONU e é recepcionado pelos brasileiros e simpatizantes de outros países! Nenhum outro chefe de governo, de Estado ou monarca foi tão festejado! É verdadeiramente um MITO”, escreveu um seguidor.
Outra militante respondeu com vários emojis de corações. “Que orgulho! E a imprensa tem a cara de pau de colocar o Luladrão em primeiro nas pesquisas, como se o povo fosse idiota. O povo acordou!”, bradou outro.
Não seria necessária uma checagem e nem mesmo um aviso para confirmar que se tratava de uma informação falsa. Um chefe de Estado estrangeiro jamais deixaria um dos aeroportos mais visados do mundo pela porta da frente, tampouco misturado a uma multidão sem qualquer cordão de segurança. E como se isso não bastasse, é possível perceber no fundo do saguão uma loja chamada “Serra Dourada”, em bom português.
A narrativa fantasiosa foi disseminada depois de o presidente passar por uma série de constrangimentos. Primeiro, ele precisou entrar pela porta dos fundos de seu hotel em Nova York, porque, na entrada, manifestantes contra seu governo se preparavam para recebê-lo.
Depois, ao sair com parte da comitiva para comer pizza de pé em uma calçada de Nova York acompanhado de ministros e do presidente da Caixa Econômica, Bolsonaro acabou virando alvo de críticas da imprensa americana e do próprio prefeito de Nova York, Bill de Blasio, que colocou um posto de vacinação móvel na porta das Nações Unidas. De Blasio chegou a marcar Bolsonaro no seu perfil no Twitter junto com uma lista de centros de imunização. O prefeito declarou ainda que Bolsonaro não deveria ter viajado à cidade sem ter se vacinado.
Além disso, um integrante de sua comitiva testou positivo para Covid-19 na segunda-feira, véspera da Assembleia-Geral. Para completar a saga, segundo o colunista do GLOBO Ancelmo Gois, o filho e deputado federal Eduardo Bolsonaro (PSL-SP) foi vaiado na loja da Apple em NY.
Na tarde desta segunda-feira, durante o encontro bilateral com o primeiro-ministro britânico Boris Johnson, o presidente brasileiro ainda teve de ouvir Johnson dizer que já se vacinou contra a Covid com duas doses do imunizante da AstraZeneca e perguntar se ele, Bolsonaro, também já havia tomado.
Bolsonaro fez que não, numa cena exibida em todos os canais de TV. No vídeo que circulou nas redes de seguidores, porém, o momento da pergunta não aparece. A cena termina logo depois que Johnson diz que a vacina da AstraZeneca é uma ótima vacina. “A mídia não mostra absolutamente nada. Liberdade (só) pelo zap zap”, dizia uma legenda postada por um militante. Os seguidores ainda colocaram mais postagens dizendo que Boris, um político conservador, saiu encantado da conversa com Bolsonaro.
Outra tentativa de “vacinar” os seguidores contra os fatos mostrados pela imprensa foi a reprodução de uma notícia antiga destacando elogios do ex-prefeito de Nova York Rudy Giuliani a Bolsonaro, a quem o americano chamou de “herói”. A declaração, na verdade, aconteceu no ano passado, durante um jantar promovido pelo então presidente Donald Trump na Flórida.
Giuliani acabou caindo em desgraça ao advogar por Trump na fracassada tentativa de reverter a vitória de Joe Biden na eleição presidencial de 2020. Hoje, ele não tem cargo público e perdeu a licença de advocacia em Nova York e em Washington D.C. O ex-prefeito foi penalizado pela sua sustentação infundada de que Trump foi vítima de uma fraude eleitoral generalizada na disputa contra Biden.
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