CPI acha provas do “gabinete do ódio” de Bolsonaro

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Foto: Pedro França / Pedro França/Agência Senado

Mensagens em poder da CPI da Covid indicam que blogueiros ligados ao governo usavam grupos de Whatsapp para coordenar ataques nas redes sociais contra adversários políticos do presidente Jair Bolsonaro. A estratégia foi usada em mobilizações contra o governador de São Paulo, João Doria (PSDB), o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e a deputada federal Joice Hasselmann (PSL-SP), uma das principais denunciantes do suposto esquema que envolveria também a divulgação de notícias falsas e o uso de robôs — a parlamentar prestou depoimento à CPI das Fake News. O material foi obtido com exclusividade pelo GLOBO.

Em uma conversa num grupo de WhatsApp, em abril de 2020, o youtuber bolsonarista Bernardo Küster afirmou: “Recebi ordens do GDO para levantar forte a tag #DoriaPiorQueLula. Bora lá no Twitter”, escreveu, sendo apoiado por outros integrantes do chat. O termo “GDO”, segundo senadores da CPI da Covid, seria uma referência a “Gabinete do Ódio”, forma como um grupo de auxiliares do presidente com atuação nas redes ficou conhecido.

Em um diálogo com um assessor parlamentar da deputada bolsonarista Caroline de Toni (PSL-SC), que tinha acesso a documentos sigilosos da CPI das Fake News, Küster perguntou quando poderia “vazar” uma informação que obtivera sobre a “Pepa”, termo jocoso usado para se referir a Joice, que denunciou ataques orquestrados de apoiadores de Bolsonaro nas redes sociais.

O assessor, contudo, ficou com medo de passar a informação e ser descoberto pela parlamentar, mas buscou uma alternativa: “Falei com o adv (advogado) do gabinete do Edu, e ele disse que vai tentar outro caminho (…) Se isso vier a público agora, a Joice vai solicitar ao pessoal lá quem acessou (o sistema). Vai foder o cara lá e a mim tbm, que contei (sic)”, explicou o assessor parlamentar a Kuster. A CPI apura se “Edu” seria uma referência ao deputado Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), que, àquela época, fazia ataques frequentes a Joice.

Em outubro de 2019, o mesmo assessor avisou a Küster que a CPI das Fake News havia apresentado requerimento para convocar o youtuber. Küster reclamou que a medida teve como fundamento uma reportagem, e o assessor complementou: “Absurdo mesmo. O pessoal do Gabinete do Ódio tbm foi assim. Filipe G. Martins (assessor de Bolsonaro para assuntos internacionais) também foi convocado com base nessa reportagem lixo”. O auxiliar, então, diz que atuaria para tentar impedir a convocação de Küster.

A expressão “gabinete do ódio” ficou conhecida publicamente para indicar assessores lotados no Palácio do Planalto encarregados de utilizar a internet para atacar opositores do governo e disseminar fake news. O núcleo de Bolsonaro sempre negou a existência do grupo, mas, nas mensagens, o termo é usado com frequência.

Em uma delas, em dezembro de 2019, Küster diz a Filipe Martins, assessor para assuntos internacionais da Presidência, que havia acabado de entrevistar Bolsonaro. O youtuber relatou que a conversa no Planalto ocorreu na presença de “um gordinho de óculos”. Martins respondeu: “O Tércio. Membro original do gabinete do ódio”. Tércio Arnaud é assessor especial lotado na Presidência da República e é um dos responsáveis por produzir conteúdo para as redes de Bolsonaro.

Em outra conversa no mesmo mês, Küster sugeriu a Mateus Diniz, também assessor de Bolsonaro e apontado como integrante do “gabinete do ódio”, que o presidente deveria gravar uma mensagem de Natal desejando votos de felicidades aos brasileiros e passando uma mensagem “de esperança”. Diniz respondeu, brincando: ” O Gabinete do Ódio Ltda. Já pensou nisso hahaha”.

Indagado sobre a mensagem em que cita “ordens do gabinete do ódio” para fazer publicações no Twitter, Küster afirmou ao GLOBO ter escrito a frase em tom de brincadeira.

— Essa história se tornou uma narrativa em 2018. Eu digo isso, “ordens do GDO”, mas na verdade não tem ordem de ninguém. Nunca recebi ordem do Carluxo (referência ao vereador Carlos Bolsonaro) nem de ninguém. É uma coisa espontânea, uma brincadeira. Se o GDO de fato existisse, ninguém saberia.

Sobre o episódio envolvendo Joice Hasselmann e a CPI das Fake News, Küster afirmou que as informações mencionadas sobre a deputada nunca chegaram a ser publicadas.

— Eram informações que não posso revelar, porque estavam sendo apuradas, mas que não foram confirmadas. Queria vazar para um jornal, mas o assessor disse que não poderia porque, do contrário, saberiam quem vazou. E, como não tivemos confirmação de que o assunto era de fato relacionado à deputada Joice, ninguém vazou nada, e o assunto morreu ali.

Filipe Martins preferiu não se pronunciar. Tércio Arnaud não foi localizado para comentar.

O Globo

 

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