Funcionários relatam rotina de dono de empresa envolvida no caso Covaxin

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Foto: Pedro Ladeira

Pagamento de salários em dinheiro vivo, grande circulação de malas, galpão sempre vazio, tempo ocioso para “ficar assistindo Netflix” no trabalho e figuração de diretores em dias de fiscalização.

Essa rotina incomum no mercado empresarial foi descrita à Folha, sob a condição de anonimato, por seis ex-funcionários que trabalharam na última década nas firmas de Francisco Emerson Maximiano, empresário que está no centro das apurações da CPI da Covid sobre a negociação para a compra da vacina indiana Covaxin pelo governo Jair Bolsonaro.

Os trabalhadores também afirmam não ter visto nenhum produto médico ou remédio no tempo em que atuaram nos escritórios das companhias. Eles dizem que as situações atípicas deixavam o ambiente pesado, pelo temor de estarem atuando em firmas de fachada dedicadas à lavagem de dinheiro.

Os ex-funcionários ouvidos pela reportagem dizem que pelo menos quatro empresas ligadas a Maximiano ocupavam o último andar de um prédio comercial na área nobre comercial da cidade de Barueri, na Grande São Paulo: a Precisa Medicamentos, a Global Gestão em Saúde, a BSF Saúde e a Saudebank.

As diretorias das firmas tinham algumas diferenças entre si, mas os escalões inferiores eram compartilhados pelas companhias, relatam os trabalhadores.

Uma situação que deixava os funcionários contrariados era o pagamento dos salários em dinheiro vivo em alguns meses, pois eles tinham que levar os valores até agências bancárias para fazer depósitos, correndo o risco de serem roubados no caminho.

Os ex-empregados dizem recordar que isso ocorreu principalmente no fim de 2018, quando esse modo de quitação ocorreu por três meses seguidos.

Outra situação que causava estranheza, segundo os relatos, era que os dirigentes da empresa movimentavam malas e bolsas com alças com frequência nas dependências do escritório, e levavam os volumes para uma sala na qual só eles podiam ter acesso.

Indagados se dentro das malas e bolsas não poderiam estar medicamentos ou documentos, os funcionários disseram ser improvável essa hipótese, pois nunca viram produtos farmacêuticos no local e muito pouco papel era impresso ​nas dependências das firmas.

Constrangimentos também ocorriam em dias de fiscalizações ou auditorias, quando era preciso simular situações para atender a exigências de quem inspecionava o local, afirmam os trabalhadores.

Houve momentos em que até diretores foram convocados a fazer figuração. A ocasião mais lembrada pelos ex-empregados foi uma em que um superintendente teve que colocar o uniforme da equipe de call center de uma das empresas e sentar em um dos postos do setor para completar o número que constava nos registros da companhia.

Nesses dias também eram comum trocar ou instalar placas de identificação em portas e mesas, dependendo da necessidade da empresa que passava pelo crivo dos fiscalizadores.

Os ex-funcionários dizem que outro fato atípico era que o grupo tinha um depósito em uma região de galpões industriais na entrada do município de Itapevi, a alguns quilômetros da sede em Barueri, mas que nunca viram qualquer produto ou medicamento no local.

Uma sétima ex-empregada ouvida pela Folha, que também pediu anonimato, disse que não viveu situações foram do comum nas empresas ou que tenha recebido salários em dinheiro vivo.​

Procurada, a defesa de Maximiano afirma que as empresas tiveram contas auditadas e aprovadas, para clientes públicos e privados.

Além dos relatos dos ex-empregados, a suspeita do uso das empresas de Maximiano para atividades ilícitas também já surgiu em uma delação premiada.

Alexandre Romano, advogado e ex-vereador de Americana (SP) pelo PT, disse ao Ministério Público Federal em dois depoimentos, em 2015 e 2016, que firmou contratos simulados com a Global Gestão em Saúde, uma das empresas de Maximiano.

Entre o fim de 2011 e o início de 2012, segundo o relato, a Global fechou negócio para fornecer medicamentos com desconto aos funcionários dos Correios, em contratos firmados inicialmente por meio de uma conveniada à estatal e depois pela Postal Saúde (caixa de assistência de saúde dos funcionários dos Correios).

De acordo com o delator, um dirigente dos Correios recebeu propina para viabilizar essas contratações da Global.

Para operacionalizar essa propina, a Global contratava o escritório e empresas de Romano, que é conhecido como Chambinho. Ele teria que prestar supostos serviços, nunca realizados, de “assessoria jurídica de solução econômica-financeira e due dilligence legal visando a captação de recursos para sua expansão no mercado brasileiro”.

Metade do dinheiro que ele recebia era repassado ao dirigente dos Correios. Romano afirmou que o suborno foi pago a ele pela Global de três maneiras: parte em dinheiro vivo (sem nota ou qualquer formalização), parte em transferência, com emissão de notas fiscais, e ainda pela cessão a ele de um apartamento em Brasília em 2014.

Alvo da CPI da Covid no Senado, Maximiano foi convocado para prestar depoimento, mas optou por ficar em silêncio na maioria dos questionamentos dos senadores no último dia 19.

Ele também não aceitou o compromisso de apenas dizer a verdade durante sua oitiva. Maximiano obteve um habeas corpus do STF que garantiu o direito ao silêncio e mesmo mentir para não se incriminar.

Responsável pela intermediação do contrato de R$ 1,6 bilhão para compra de 20 milhões de doses da Covaxin, a Precisa Medicamentos também se tornou alvo da CGU (Controladoria-Geral da União).

Por meio de um PAR (processo administrativo de responsabilização), o corregedor-geral da União, Gilberto Waller Júnior, apontou fraude e “comportamento inidôneo” por parte da empresa.

Somente com as revelações de irregularidades o governo Jair Bolsonaro decidiu cancelar o contrato. Primeiro, houve uma suspensão, por determinação do corregedor-geral da União. Depois, o negócio foi cancelado de vez.

Procurada, a defesa de Francisco Maximiano, comandada pelos advogados Ticiano Figueiredo e Pedro Ivo Velloso, afirma em nota que todas as contas das empresas do grupo foram auditadas e aprovadas.

Segundo ela, a título de exemplo, só a Precisa Medicamento emitiu mais de 400 mil notas fiscais referentes às vendas dos últimos anos, “muito antes da pandemia, seja para clientes privados ou públicos, em diversos estados do país”.

“Em relação a Alexandre Romano, trata-se de uma delação mentirosa em um inquérito que se arrasta há mais de seis anos, sem quaisquer indícios de irregularidades. Francisco Maximiano não foi indiciado muito menos denunciado pelas autoridades em razão das acusações infundadas”, dizem os advogados na nota.

Segundo a defesa, “todas as operações financeiras realizadas pelo grupo foram legais e seguiram todos os critérios de integridade e compliance, com serviços prestados e comprovados”.

Folha de S. Paulo

 

 

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