Investigações contra filhos põem Bolsonaro em pé-de-guerra

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Foto: Cristiano Mariz/O Globo

O cerco sobre os filhos do presidente, especialmente sobre o vereador Carlos Bolsonaro (PSC-RJ) às vésperas das manifestações do Sete de Setembro, pode precipitar uma radicalização ainda maior do presidente da República.

Uma das lideranças políticas mais experientes do país faz a seguinte avaliação: se uma reação de incitação à violência, como Jair Bolsonaro fez ontem (“Se você quiser paz, se prepare para a guerra”) levar a um quebra-quebra desenfreado no dia 7, o presidente vai pro tudo ou nada. “Ele vai para matar ou morrer”, resume. “Ou ele acelera o golpe ou o Congresso, o impeachment. O país não pode conviver com quebra-quebra”.

A precipitação de uma saída mata-ou-morre permanece com dois obstáculos ancestrais: a incerteza sobre a parceria de Bolsonaro num golpe, visto que o Exército não está disposto a nele embarcar, e a indisposição do Congresso a uma solução que coloque o vice-presidente Hamilton Mourão no poder.

Há ainda um terceiro obstáculo a um emparedamento do presidente Jair Bolsonaro: os embates entre Câmara e Senado. Um deles, ocorrido na noite da quarta-feira, resultou numa derrota maiúscula não apenas do governo mas também do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL). Foi a rejeição, por 47 votos a 27, no Senado, da Medida Provisória 1045, que promovia uma reforma trabalhista com supressão de direitos e garantias.

O que joga mais combustível no incendiário presidente da República é que a máquina de más notícias para seu governo e para seus filhos não está vindo do Supremo Tribunal Federal, Corte para a qual dirige seus vitupérios e provocações. Ao contrário. O Supremo adiou o julgamento sobre o foro do senador Flavio Bolsonaro e o próprio Alexandre de Moraes segurou uma conta bilionária imputada à Petrobras pelo Tribunal Superior do Trabalho em decisão favorável aos sindicatos de petroleiros.

Também estava em curso, sob a batuta de Moraes, uma operação para desbaratar a “Abin” particular dos filhos do presidente, gerenciada por Carlos Bolsonaro, mas quem resolveu atiçar o fogo na véspera do Sete de Setembro foi o sistema judiciário do Rio.

Os petardos vieram do Rio de Janeiro e se dirigiram ao vereador Carlos Bolsonaro, sobre quem, ao contrário do irmão mais velho, não há dúvidas em relação ao foro de julgamento.

Depois de o Tribunal de Justiça ter autorizado a quebra do sigilo do vereador Carlos Bolsonaro, documentos obtidos pela Globonews mostraram as transações que fundamentam a acusação da existência de funcionários fantasmas no seu gabinete na Câmara de Vereadores do Rio, suspeita ainda mais grave do que o esquema de “rachadinhas” do gabinete do irmão Flávio.

A suspeita é de que uma parte desses funcionários participava do desvio de recursos para o parlamentar e outra parte, para a ex-mulher de Bolsonaro, Ana Cristina Valle, mãe de Jair Renan, quarto filho do presidente.

A CPI da Pandemia também se juntou ao cerco visto que a quebra de sigilo de um lobista da Precisa Medicamentos, Marconny Albernaz de Faria, mostrou-lhe como o consultor de Jair Renan na abertura de sua empresa de eventos, a Bolsonaro Jr, segundo a “Folha de S. Paulo”. A exemplo de Carlos Bolsonaro, Jair Renan não tem foro privilegiado.

Não é a única suspeita levantada pela CPI que atinge os filhos do presidente. Já apareceu lobista de vacina não aprovada nem pela Anvisa nem pela agência sanitária americana revelando contatos mantidos com o senador Flavio Bolsonaro, que já havia atuado para que a Precisa recebesse financiamento do BNDES.

O envolvimento dos filhos é mediado por uma intensa triangulação de advogados. Aquele que conseguiu uma decisão do ministro Nunes Marques para adiar o depoimento do motoboy Ivanildo Gonçalves à CPI, Alan Guedes de Ornelas, foi advogado de Fabrício Queiroz, ex-chefe de gabinete de Flávio.

O motoboy é investigado por saques no valor de R$ 4,7 milhões de contas relacionadas à empresa de logística prestadora de serviços para o Ministério da Saúde e por supostos pagamentos de boleto em benefício do ex-diretor de Logística da Pasta, Roberto Dias.

Uma outra advogada do senador, Karina Kufa, apresentou os representantes da Precisa aos lobistas da Covaxin, que tentaram desviar R$ 1,6 milhão do Ministério da Saúde. Para não falar do onipresente Frederick Wasseff, que ganhou, com Jair Renan, mais uma conta para seu escritório.

Nenhum desses advogados, porém, será capaz de proteger o presidente da República e sua família se, mantido o Estado democrático de direito, uma violência desmedida dos atos do dia 7 despertar a reação do Supremo e do Congresso. Uma reação que pode ser amparada por parte do eleitorado bolsonarista que ainda se mantém fiel ao presidente.

Renato Meirelles, diretor do Instituto Locomotiva e um dos maiores conhecedores de classes C e D do país, garante que se a noção de “ordem constitucional” é muito vaga para a percepção popular, o benefício privado de filhos do presidente em detrimento do interesse público não o é.

Valor Econômico  

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