PSB quer que PT desista de candidatura de Haddad

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Foto: Edilson Danta/agência o globo – 16/10/2020

Ex-governador de São Paulo e pré-candidato ao cargo em 2022, Márcio França (PSB) afirma que não será empecilho para uma aliança nacional entre o seu partido e o PT, que deverá disputar a Presidência com o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Mas deixa claro que o PT precisa ceder.

Dias atrás, o presidente do PSB, Carlos Siqueira, esteve com Lula. Transmitiu ao petista o interesse de ter, em troca de um acordo nacional, apoio do PT a França.

O ex-governador reforça que o PT precisará abrir mão de certas disputas regionais. “Lula é experiente. Sabe que não dá para disputar numa Olimpíada as medalhas de ouro, prata e bronze ao mesmo tempo”, resume. Ele lembra que em 2006 conseguiu inviabilizar uma aliança nacional entre os dois partidos, apesar de Lula ser favorito. E adverte que a eleição do próximo ano tende a ser muito mais equilibrada do que as pesquisas anteveem no momento.

A seguir, os principais trechos da entrevista:

Valor: Carlos Siqueira, presidente do PSB, levou a Lula que São Paulo é prioritário para o partido e teria indicado que gostaria de ter o apoio do PT ao seu nome. Foi isso mesmo?

Márcio França: O PSB tem no Brasil duas grandes forças internas: Pernambuco e São Paulo. É natural que o presidente nacional do partido fale dos dois principais polos nossos. Soube que eles falaram sobre isso, avançaram sobre a situação do [Marcelo] Freixo, no Rio, e Espírito Santo. Mas o presidente nacional fez a tarefa dele. Expressou que qualquer conversa vai passar por São Paulo e Pernambuco. Internamente, na divisão de delegados, somos assim: 30% é de Pernambuco, 30% de São Paulo e 40% são todos os outros Estados. E o Lula também fez o papel dele. Respondeu “ah, sim, tudo bem”, disse que também vai conversar.

Valor: E a situação do senhor?

França: Eu sou pré-candidato a governador de São Paulo, que foi a função que eu disputei da última vez. Foi uma eleição muito apertada. Meu adversário foi o João Doria, eu tive mais de 10 milhões de votos. Como eu acho que pelo menos um percentual qualquer que votou no Doria não votaria mais nele, é natural que eu me coloque como candidato.

Valor: Acredita mesmo que o PT possa abrir mão de candidatura própria para apoiar o senhor?

França: Não sei do PT. A conversa foi com Lula. Acho que Lula é um homem experiente. Ele sabe que não dá para disputar numa Olimpíada as medalhas de ouro, prata e bronze ao mesmo tempo. Ele vai ter de escolher uma para disputar. Naturalmente, se forem priorizar a eleição presidencial, vão ter que abrir mão de coisas de outros níveis.

Valor: O PT nunca deixou de ter candidato próprio em São Paulo.

França: A eleição brasileira será uma eleição perigosa. As últimas três no mundo, EUA, Alemanha e Peru, foram eleições de 50 vírgula alguma coisa a 49 vírgula algo. Não tem tido moleza ultimamente. Não há nenhuma possibilidade, pelo menos aparente, de uma eleição 70% a 30% no Brasil. É claro que o PT está fazendo seus cálculos. Mesmo a pessoa com 90% fica por conta de buscar os outros 10%. No caso do Lula, ele tem 40%, 40% e alguma coisa. Então a pessoa fica em busca de alcançar 50% mais um. É possível que eles abram mão? É uma decisão que eles precisam tomar.

Valor: Já conversou diretamente com petistas a respeito disso?

França: Já, várias vezes. Conversei com o [Fernando] Haddad, conversei com o próprio Lula. Sempre digo, com a vivência de 40 anos de vida pública, que se puder não correr riscos, eu prefiro não correr. Ninguém imaginava uma eleição como a do Bolsonaro quatro anos atrás. E aconteceu. Então a questão é: quem dá sorte ao azar pode colher azar. Eles têm noção disso. Especialmente o Lula. Ele sabe que, embora seja hoje um favorito, será uma eleição apertada.

Valor: Quando o senhor conversou com Lula?

França: Foi há um mês, um mês e meio. Estive com ele aqui em São Paulo. Conversamos sobre diversos assuntos, mas falamos também sobre política, é claro. Não nesses termos da conversa [de Lula] com Carlos Siqueira. Ele [Siqueira] é dirigente, a tarefa dele é diferente. Ele tem de representar os interesses do partido nacionalmente. Então, naturalmente, ele foi mais objetivo.

Valor: O PSB já apoiou Lula em eleições passadas. Dirigentes do partido têm afinidade.

França: Várias pessoas nossas apoiarão o Lula em qualquer circunstância. O problema é que eu deduzo que o PT pensa em ter o PSB aliado oficialmente. Pouca gente lembra, mas anos atrás, na reeleição do Lula [2006] ele era favorito. Nós tivemos um embate no PSB. Na época havia aquela obrigatoriedade de vinculação partidária [verticalização]. Eu me posicionei contrário à coligação [com o PT]. O Eduardo [Campos] se posicionou favoravelmente. Nós ganhamos dentro do partido e não tivemos coligação. Essa coisa internamente varia muito de acordo com cada Estado.

Valor: Como deveria ser a posição do PSB no plano nacional?

França: O ideal seria o PSB ter candidato próprio à Presidência. Esse era o sonho do Eduardo, o nosso sonho. Acho que é a posição do João Campos [prefeito do Recife], o líder mais importante do nosso partido. Agora, nem sempre tem as condições para isso. Não se pode atrapalhar a vida de todo mundo internamente.

Valor: E quem seria o nome do PSB para disputar a Presidência da República nesse plano ideal?

França: Flávio Dino é um nome. Foi eleito governador [do Maranhão] duas vezes. Dos parlamentares com quem eu convivi em Brasília, fui líder dele, era o mais preparado. É um nome de respeito. [Marcelo] Freixo é muito popular hoje. Nesse mundo jovem, internet, Rio. Nós não testamos nenhum nome ainda [em pesquisas]. O próprio governador de Pernambuco [Paulo Câmara] está completando o segundo mandato. É jovem, técnico do Tribunal de Contas. Se a Tábata [Amaral, deputada] tivesse idade, ela também poderia ser. É que ela não tem 35 anos.

Valor: Não viabilizando as condições para o plano ideal de ter candidato próprio, como o PSB deveria ficar no plano nacional?

França: Se houver as condições para que a gente tenha uma posição com o Lula, eu não seria empecilho para isso. Evidentemente, tem de avaliar se para o nosso partido isso é importante. Se for atrapalhar mais do que ajudar, não vale a pena. E aí quem vai dizer quais são essas condições é o PT. Se o PT entender que a prioridade é a eleição presidencial, vão ter de entender que isso significa abrir mão de posições no Brasil.

Valor: O senhor vinha negociando com o ex-governador Geraldo Alckmin em São Paulo. Colocou que ele poderia escolher entre ser cabeça de chapa com o senhor de vice ou o contrário. Mantém essa conversa?

França: Nós somos amigos, super próximos. Vou torcer para que ele possa sair do PSDB e, ato contínuo, se filiar a um partido que possa ter uma candidatura. Eu apostaria que nós estaremos juntos na próxima eleição. Em qual posição? Aí depende um pouco das circunstâncias. Tenho com ele 100% de confiança, acho que a recíproca é verdadeira.

Valor: Há chance ainda de Alckmin ir para o PSB?

França: Ah, sim. Se ele quiser estar aqui, será uma honra para mim. Já convidei várias vezes. Ele está trabalhando com outras hipóteses. Porque, claro, está calculando somar mais alguns partidos. E ele tem o tempo dele, isso tem de ser respeitado. É um homem muito experiente, foi duas vezes candidato a presidente. No meu entendimento, é o único nome nacional que ainda pode tomar uma decisão surpreendente e definir o jogo brasileiro.

Valor: Mas o quê? Imagina ser possível uma grande composição que combine do PT ao Alckmin?

França: Para mim isso seria muito bacana. Uma vez o [ex-governador de São Paulo Mário] Covas fez um movimento assim com a Marta [Suplicy, ex-prefeita]. Tem uma certa hora que a divisão deixa de ser evangélico versus católico. Passa a ser entre quem é cristão e quem não é.

Valor: No plano nacional, Lula e Bolsonaro seguem com grande vantagem sobre os demais. Vê chance de mudança desse quadro?

França: Se alguém me dissesse um ano antes de 2018 que o Bolsonaro iria ganhar como ganhou, eu não teria acreditado. Acho que a decisão do Alckmin ainda é algo que pesará nesse quadro nacional. Todos nós esperamos que a gente tenha alternativas. Ciro Gomes é um nome preparado. Se o PSB fecha acordo com Ciro, ele passa a ter o tamanho do PT, em tempo de TV, e pode entrar para o jogo.

Valor Econômico

 

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