Barrar calote nos Precatórios é quase impossível
Foto: REUTERS/Adriano Machado
A oposição à PEC dos Precatórios busca um feito praticamente inédito no atual período constitucional do país: apenas uma proposta de mudança na Carta Magna foi rejeitada pelos deputados em segundo turno, depois de aprovada em primeira votação.
Está prevista para terça-feira (9) a deliberação definitiva da PEC dos Precatórios na Câmara, apoiada por 312 deputados na madrugada de quinta-feira (4) – o mínimo para aprovação é de 308 votos, e o texto também precisa passar por duas votações no Senado.
Pelo sistema de busca de atividade legislativa da Câmara, a PEC 395/2014 é a única com registro de aprovação em primeiro turno e rejeição na rodada seguinte.
O tema era controverso, mas a reviravolta ocorreu em um contexto atípico: um intervalo de 17 meses entre as votações, a abertura de um processo de impeachment e a cassação tanto da presidente da República quanto do presidente da Câmara no período. E, a exemplo dos precatórios, também era tema discutido no Judiciário.
A proposta de 2014 queria permitir que universidades públicas oferecessem cursos pagos de pós-graduação lato sensu, como especializações, restringindo a gratuidade do ensino público à educação básica e aos cursos de graduação, mestrado e doutorado.
Na justificativa, o então deputado paranaense Alex Canziani (ex-PTB, hoje no PSD) alegava que a cobrança gerava uma receita importante para as instituições e que o público atendido geralmente era de profissionais vinculados a grandes empresas.
Além disso, tentava-se pacificar o tema, já que ações judiciais questionavam a constitucionalidade da cobrança por esses cursos nas instituições públicas.
O primeiro turno da PEC ocorreu em outubro de 2015, no segundo mandato de Dilma Rousseff e sob a presidência de Eduardo Cunha na Câmara, já com ambiente tenso entre PT e o então PMDB.
Foram 318 votos favoráveis e 129 contrários à proposta, com quórum de 452 parlamentares. O governo e a bancada petista liberaram os deputados, enquanto apenas PSOL, Rede e PC do B orientaram pelo não. Quase todos os demais partidos encaminharam voto favorável.
Dois meses depois, porém, Cunha deu início ao processo de impeachment de Dilma, aprovado pelo plenário da Casa em abril de 2016.
Em setembro daquele ano, foi o presidente da Casa quem acabou cassado, um mês depois da petista e dois após ser substituído por Rodrigo Maia no comando da Câmara.
Mesmo com o impeachment em andamento, houve uma tentativa de seguir com a discussão da PEC 395 entre fevereiro e março de 2016, mas o debate foi adiado inicialmente por cinco sessões. Apenas um ano depois, em março de 2017, a proposta voltou à pauta do plenário.
O segundo turno teve início de fato no dia 29 daquele mês. Críticos da PEC viam na proposta o início da “privatização do ensino público”, o que era negado pelos defensores da medida.
Ajudou a aumentar a polêmica na Câmara uma declaração da então secretária-executiva do Ministério da Educação, Maria Helena Guimarães de Castro, interpretada pela oposição como defesa da cobrança de mensalidades em cursos regulares de universidades e institutos federais.
“Uma PEC para flexibilizar o princípio de que educação pública tem de ser gratuita na mesma semana da fala da secretária-executiva do MEC, que dá a entender que a graduação pode passar por cobrança. Onde a gente vai parar?”, discursou o então líder do PSOL, Glauber Braga (RJ), como registrou a Agência Câmara na época.
“As universidades públicas, ao longo de todos esses anos, têm se utilizado desses recursos para melhorar a graduação. Esses recursos significam melhores laboratórios, ar-condicionado na sala de aula, melhores estruturas para as universidades”, rebateu Canziani.
A orientação das bancadas foi praticamente a mesma, mas desta vez o novo governo, de Michel Temer (MDB), encampou a aprovação do texto.
Com um quórum levemente inferior ao do primeiro turno, 446 deputados, veio a surpresa: faltaram 4 votos para a PEC seguir para o Senado. Com o placar de 304 a 139, a proposta foi rejeitada e encaminhada ao arquivo.
Não seria, no entanto, o último capítulo dessa questão. Menos de um mês depois, em 26 de abril, o Supremo Tribunal Federal decidiu por 9 votos a 1 que a cobrança por cursos lato sensu em universidades públicas é constitucional.
“A garantia constitucional da gratuidade de ensino não obsta a cobrança, por universidades públicas, de mensalidades em cursos de especialização”, diz a tese de repercussão geral aprovada pela Corte, em ação movida pela Universidade Federal de Goiás.
A PEC dos Precatórios, já alvo de ações no STF, também pode ter a votação afetada pela liminar da ministra Rosa Weber que suspendeu a execução das emendas do chamado orçamento secreto.
Elas são apontadas pela oposição como instrumento de cooptação de apoio à proposta, o que é negado por seus defensores. A liminar está pautada para discussão dos ministros pelo plenário virtual na mesma terça-feira em que o governo espera aprovar a PEC.
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