Como Bolsonaro criou e matou a polêmica do voto impresso
Foto: Rafaela Felicciano/Metrópoles
O presidente Jair Bolsonaro (sem partido) passou boa parte do ano inflamando sua militância a questionar o sistema eleitoral brasileiro, a ponto de alguns de seus apoiadores terem ido parar na cadeia ou estarem enfrentando processos por ameaçar as instituições.
Apesar das pressões e ameaças, porém, a pauta do voto impresso acabou naufragando no Congresso e, após insistir inúmeras vezes que não aceitaria uma eleição “não auditável” em 2022, o chefe do Executivo federal e pré-candidato à reeleição está, aparentemente, disposto a entrar no ano eleitoral sem colocar em dúvida a segurança das urnas eletrônicas.
Essa mudança de comportamento deixa “órfãos” apoiadores que investiram tempo e dinheiro numa pauta que parecia inegociável, mas que desapareceu do discurso presidencial num esforço para esfriar uma crise institucional com o Judiciário que alcançou o ápice nas manifestações bolsonaristas de 7 de setembro.
Um levantamento feito pelo Google, a principal plataforma de buscas da internet, a pedido do Metrópoles indica o enorme poder que o discurso presidencial sobre o tema teve no debate público. Segundo a empresa, a pergunta “o que é o voto impresso?” foi a quarta mais buscada no tema política no Brasil nos últimos seis meses, ficando atrás apenas de dúvidas que englobam um único assunto: “como tirar título de eleitor?”; “como fazer título de eleitor?” e “onde tirar título de eleitor?”.
Ainda segundo a empresa de buscas, entre janeiro e novembro deste ano as consultas por “voto impresso” e “voto auditável” cresceram 3.230% em comparação a todo o ano de 2020.
Quando o presidente levou milhares de pessoas às ruas de Brasília e São Paulo para pressionar o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e o Supremo Tribunal Federal (STF) no feriado da Independência, porém, o interesse popular no tema já estava em declínio.
O pico das buscas por “voto impresso” e “urna eletrônica” ocorreu em agosto deste ano, quando o voto impresso estava sendo debatido na Câmara dos Deputados.
O dia de maior interesse no assunto foi 10 de agosto de 2021, data em que os deputados rejeitaram a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que tornava obrigatória a impressão do voto.
Segundo o Google, agosto de 2021 foi o mês em ano não eleitoral com maior nível de interesse dos internautas por urna eletrônica no Brasil desde 2004.
Os questionamento de Bolsonaro em relação ao sistema eleitoral brasileiro estão presentes desde a última eleição, mas se intensificaram a partir do final do ano passado. Em novembro de 2020, em uma de suas conversas com apoiadores no cercadinho do Palácio da Alvorada, Bolsonaro voltou a colocar em dúvida o processo eleitoral brasileiro.
Aos apoiadores, o chefe do Executivo federal disse que não confiava nas urnas eletrônicas e que havia sido “roubado demais” nas eleições presidenciais de 2018, mesmo tendo sido eleito com 57 milhões de votos.
“Eu não confio no sistema eleitoral. Fui roubado demais. Ninguém reclamou quando foi votar no 13 [número do PT] e teve problema, mas reclamou muita gente quando foi votar no 17 [número de filiação do PSL]”, discursou, ecoando boatos que circulavam em grupos bolsonaristas de WhatsApp e nunca foram comprovados.
Às vésperas do Natal de 2020, Bolsonaro subiu o tom e começou a dizer que “sem voto impresso, pode esquecer eleição“, indicando a tendência para os meses seguintes.
A mobilização com acusações e suspeitas sem provas ou fundamentos chegou ao ponto crítico no final de julho deste ano, às vésperas da votação da PEC na Câmara, quando Bolsonaro chamou aliados e jornalistas ao Palácio da Alvorada anunciando que provaria fraudes nas urnas desde 2014, quando, segundo ele, o tucano Aécio Neves teria vencido a eleição, e não a petista Dilma Rousseff. Como essas provas não existem, o evento foi um fracasso do ponto de vista político, mas ajudou a manter a militância inflamada.
A derrota no Congresso não colocou um ponto final no assunto e o presidente coordenou para o 7 de Setembro a última grande mobilização de rua de sua militância.
O tom golpista dos atos, porém, acendeu alertas tanto no Supremo quanto no Congresso e Bolsonaro compreendeu que seu mandato estaria em risco caso não baixasse o tom – o que fez dois dias após o feriado, em uma carta na qual sinalizava uma trégua com seus antagonistas nos outros Poderes e começava a sepultar o voto impresso, deixando atônitos seus apoiadores mais radicais.
O ponto de mudança veio ainda em setembro, quando o presidente do TSE, ministro Luís Roberto Barroso, criou a Comissão de Transparência das Eleições (CTE) e o Observatório da Transparência das Eleições (OTE) com o objetivo de “ampliar a transparência e a segurança de todas as etapas de preparação e realização das eleições”.
Além de especialistas, a comissão é formada por representantes do Congresso Nacional, do Tribunal de Contas da União (TCU), da Polícia Federal e até das Forças Armadas, o que foi a senha para o presidente da República desmobilizar seu discurso incendiário.
“Tenho tranquilidade, porque o voto eletrônico vai ser confiável ano que vem”, disse Bolsonaro no último dia 5 de novembro, em radical mudança de discurso.
“Passamos a acreditar no voto eletrônico. É assunto encerrado”, acrescentou, deixando pouca margem para seus militantes reclamarem.
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