Fundador do MBL lança livro para ensinar “liberais” a debater
Foto: Sergio Lima
Para o bem e para o mal, o debate político há muito deixou de ser exclusividade do ambiente acadêmico e dos meios de comunicação.
A popularização do tema invadiu a mesa de bar, ainda que no sentido metafórico. É a essa realidade que se destina um novo livro que pretende ser uma espécie de guia prático para discussões políticas do dia a dia.
Seu autor é o deputado federal Kim Kataguiri (DEM-SP), uma das principais lideranças do MBL (Movimento Brasil Livre). O título mostra logo de cara a que se propõe: “Manual de Debate Político: Como Vencer Discussões Políticas na Mesa do Bar” (Edições 70).
São 40 capítulos curtos, cada um tratando de um tema, em que Kataguiri, um liberal hoje na oposição ao governo, oferece argumentos para contraditar o discurso da esquerda ou da direita bolsonarista.
Para isso, recorre a frases diretas e muitas vezes simplificadoras para temas complexos, com uma linguagem que usa humor e algum sarcasmo eventual.
“As pessoas já não discordam umas das outras, elas simplesmente torcem para estar certas”, afirma o autor logo na introdução, justificando a decisão de escrever o livro.
“Apenas quebraremos esse ciclo de oportunismo, cegueira e turbulência política quando as pessoas tiverem uma noção básica dos conceitos mais elementares e do funcionamento das políticas públicas mais comuns”, completa.
Os tópicos escolhidos vão dos mais tradicionais, como o papel do Estado na economia, até os que costumam gerar longos fios nas redes sociais, caso de discussões sobre racismo estrutural e políticas identitárias, chamadas por ele de “novo fetiche da esquerda”. “Uma pessoa não deve ser julgada pelo seu mérito ou por suas ações, mas por sua sexualidade, cor da pele, origem etc.”, escreve.
Não faltam trechos que ensinam como criticar com propriedade praticamente tudo que se refira ao presidente Jair Bolsonaro, que, para ele, é a antítese do conservadorismo.
“O que Bolsonaro sempre defendeu, e continua defendendo, é uma ruptura institucional, um golpe, uma revolução. Ser revolucionário é o contrário de ser conservador”, diz o livro.
Kataguiri também adiciona um ou outro item mais inusitado para ilustrar sua visão liberal de mundo, como as razões que levam profissionais de futebol feminino a ganharem muito menos do que jogadores homens.
E não economiza artilharia contra alguns dos inimigos mais notórios da direita, como Che Guevara, Foro de São Paulo, John Maynard Keynes, Josef Stálin, Guilherme Boulos e, claro, Luiz Inácio Lula da Silva. Todos têm a distinção de merecerem capítulos exclusivos.
O autor preocupa-se em delimitar ideologicamente o terreno da direita, hoje formado por duas esferas que mantêm alguns pontos de contato: conservadorismo e liberalismo.
Os conservadores, diz o parlamentar, querem mudanças graduais, no que pode ser definido como um grande pacto entre as gerações.
“O conservador acredita que mudanças não são apenas desejáveis, mas necessárias. Ocorre que essas mudanças precisam acontecer dentro das regras das instituições, não por meio de revoluções sangrentas”, diz ele.
Já os liberais têm foco maior na redução da intrusão do Estado a vida do indivíduo. “Nós, os liberais, queremos um Estado bem menor, para pagarmos muito menos impostos. E queremos usar o dinheiro que nos sobra para escolher nossos serviços”, prega Kataguiri.
Mais do que isso, afirma o autor, o Estado é incapaz de acabar com a pobreza, porque não consegue e não quer. “O Estado é uma máquina burocrática gigante, comandada por pessoas cujo maior propósito, em regra, é se perpetuar na própria máquina e ter cada vez mais poder”, resume.
Movimento surgido em 2014 basicamente como uma ação entre amigos pós-adolescentes, o MBL cresceu rapidamente e teve papel relevante nas manifestações pelo impeachment da então presidente Dilma Rousseff (PT). Kim Kataguiri foi, desde o início, uma de suas lideranças mais visíveis, e acabou capitalizando essa projeção para uma bem-sucedida carreira política.
Com um estilo barulhento nas redes sociais e muitas vezes agressivo contra opositores, o grupo passou a chamar a atenção e a despertar a rejeição da esquerda. Em 2018, apoiou Bolsonaro no segundo turno, mas logo rompeu com ele.
Desde então, o MBL tem procurado se mostrar mais moderado, e chegou a fazer um mea culpa público sobre seu papel na polarização do debate público.
Mais recentemente, o movimento tem defendido uma saída de centro para a Presidência em 2022, e não esconde a simpatia pela candidatura do ex-juiz Sergio Moro, que deve se filiar ao Podemos em breve.
O credo defendido pelo movimento ainda é um ser estranho no arcabouço político brasileiro, tradicionalmente dominado pelos pensamentos socialista, social-democrata e conservador, com apenas alguns espasmos de liberalismo.
No livro, Kataguiri procura oferecer uma resposta liberal pronta para cada tema que se apresente. As escolhas seguem uma lógica clara, de estarem na ordem do dia –e, portanto, mais propensas a aparecerem na tal mesa do bar.
Um exemplo são as cotas raciais. Ao torpedeá-las, o livro não se limita a criticar o mérito desse mecanismo, que começou sendo usado em universidades e hoje é praticamente universal. O autor se preocupa também com um tema derivado, o “lugar de fala”.
“Você pode e deve discutir as cotas, seja você branco, negro, pardo, amarelo, azul, vermelho, listrado ou verde com bolinhas. Você é um cidadão e tem todo o direito de participar ativamente da vida política”, afirma.
Em alguns momentos, os pontos de vista liberal e bolsonarista se confundem, como na defesa da posse de armas, que, para Kataguiri, é um direito individual. “Armas matam da mesma forma que carros atropelam e facas esfaqueiam. Vamos proibir carros e facas?”, argumenta.
Já no debate sobre drogas, o contraste com as posições conservadoras é mais nítido. Kataguiri defende a descriminalização, com o argumento de que a proibição estimula o crime organizado.
“Não tenho dúvidas de que Al Capone cometeria crimes caso a bebida fosse legal nos EUA de sua época, mas sem dúvidas, sem o império que ele construiu com o dinheiro do tráfico, não passaria de um trombadinha”, compara.
No fim, o livro pode ser lido como uma grande defesa dos ideais da direita, ou ao menos da parte dela com a qual o autor concorda.
Afinal, argumenta Kataguiri, ser de direita é antes de tudo desfazer preconceitos alimentados hoje em dia sobretudo pelo presidente.
“A imprensa reproduz [o que diz Bolsonaro], transformando conservadorismo em sinônimo de defesa do golpe militar, fiscalização de órgãos genitais alheios e regulamentação da masturbação. Tudo isso criou uma imagem caricata do conservadorismo, um espantalho horrendo, como se o conservador fosse um carola, um fiscal de fiofó”, lamenta.
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No alvorecer de 2017, o blogueiro Eduardo Guimarães foi alvo de operação da Polícia Federal não por ter cometido qualquer tipo de crime, mas por ter feito jornalismo publicando neste Blog matéria sobre a 24a fase da Operação Lava Jato, que focava no ex-presidente Lula.
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