Guedes é chamado de “sonegador” em audiência na Câmara
Foto: Washington Costa/ME/.
Em uma reunião tensa, que ameaçou abandonar após ter sido chamado de sonegador, o ministro da Economia, Paulo Guedes, prestou ontem esclarecimentos à Câmara sobre seus investimentos em uma offshore nas Ilhas Virgens Britânicas. Ele admitiu ter aberto a conta para manter o patrimônio na família após sua morte, em vez de entregar cerca de 50% ao governo dos Estados Unidos como imposto sobre herança. Mas negou “mil vezes” que haja conflito de interesses entre esse investimento e sua função no governo.
O ministro mostrou impaciência quando, ao responder ao segundo bloco de perguntas dos deputados, foi interrompido algumas vezes por manifestações fora do microfone.
Ao final de suas respostas a esse bloco, afirmou que as informações sobre seus investimentos foram todos abertas às “instâncias pertinentes”, mas que não os entregaria aos deputados. “Não pode ser assim”, disse. E fez uma analogia: “Tem uma coisa que se chama privacidade. Você pode ser perseguido por um vizinho. Você pode ser assaltado por um vizinho. Eu não posso chegar aqui agora e falar ‘Brasil, veja tudo que eu tenho, onde eu tenho’. Não pode ser assim”.
Em seguida, o ministro falou com o presidente da mesa, deputado Afonso Motta (PDT-RS), fora do microfone. Foi possível ouvi-lo dizer “quanto sonegou”, ao que o Motta respondeu: “não, não.” Minutos depois, quando o deputado Bira do Pindaré (PSB-MA) perguntou quanto Guedes havia deixado de pagar em impostos no Brasil, Motta afirmou: “o ministro queria se retirar porque não aceita a pecha de sonegador.”
Guedes informou aos deputados que criou “dezenas” de empresas e criou muitas oportunidades empresariais, o que justifica seu patrimônio. Contou ter sido fundador do BTG, hoje o maior banco de investimentos do país, do grupo Abril Educação, das faculdades Ibmec.
Quando decidiu integrar o governo, seguiu orientações de seus advogados por avaliar que o governo Bolsonaro seria alvo de muita pressão política, explicou. Vendeu todos os negócios sobre os quais tinha controle direto, “com grande prejuízo”. E os negócios no país que não estavam sob sua administração direta foram entregues a um “blind trust”, administrados por terceiros.
O investimento na offshore foi feito por razões sucessórias, disse. Daí porque sua mulher e sua filha figuram como diretoras da empresa no exterior. É para garantir que, após seu falecimento, elas permaneçam no comando dos recursos.
Segundo o ministro, a informação que elas participam da empresa no exterior é “uma obviedade”, por isso informou ao governo não haver conflito entre sua posição e os investimentos mantidos por ele ou por familiares. O dado consta de declarações entregues à Receita Federal e ao Banco Central, disse. Ao se referir a offshores, lançou mão de outra analogia. O ministro comparou a offshore a uma faca. “Pode matar ou descascar laranja”.
Guedes também respondeu ao deputado Elias Vaz (PSB-GO) não saber quanto tem em suas aplicações pessoais. Mas, acrescentou, a Receita e o BC sabem. Vaz é autor de uma representação protocolada no Ministério Público Federal pedindo apuração sobre a participação da mulher e da filha de Guedes na offshore.
Ao rebater outro ponto de crítica, os ganhos que suas aplicações no exterior teriam com a alta do dólar, o ministro frisou ser parte de um governo que lutou pela independência do BC e “despolitizou a moeda”.
Para demonstrar que não tentou manipular a cotação do dólar com medidas ou declarações, Guedes encomendou à sua equipe um levantamento sobre quantas vezes, desde o início do governo Bolsonaro, a moeda teria subido mais de 2% num só dia. Constatou-se que foram 27 vezes, todas elas motivadas por notícias sobre a covid-19 ou por fatos políticos: a saída do ex-ministro da Justiça Sergio Moro do governo ou a prisão do ex-presidente Michel Temer. Em nenhuma dessas ocasiões a motivação partiu do Ministério da Economia ou seus integrantes, afirmou.
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