Moro faz fono contra voz de pato

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Foto: Reprodução/ Uol

A saliva é o combustível da política. Durou cinco horas o almoço em que Sergio Moro comunicou à cúpula do Podemos a intenção de concorrer à presidência pelo partido.

Os participantes do encontro começaram a trocar impressões sobre o Brasil e o panorama eleitoral às 10h de 25 de setembro, um sábado. Só se levantaram da mesa no meio da tarde, às 15h.

Durante tanta queima de combustível político, o ex-juiz falou o que a claque queria ouvir, mas fez um pedido. Queria que aguardassem até final de outubro para confirmar a decisão, porque precisava acertar sua situação com seu empregador, a consultoria americana Alvarez & Marsal.

O almoço ocorreu na casa do senador Oriovisto Guimarães (Podemos-PR), em Curitiba. O encontro contou também com a presidente do partido, a deputada federal Renata Abreu (SP), e os senadores Álvaro Dias e Flávio Arns, ambos do Podemos do Paraná.

O compromisso de Moro em ser candidato virou atitude em 2 de novembro. Nessa data, ele anunciou no Twitter o ato de filiação com a mensagem: “juntos, podemos construir um Brasil justo”.

Na mesma semana, Deltan Dallagnol, procurador do MPF (Ministério Público Federal) ligado à Operação Lava Jato, pediu afastamento do cargo e quer entrar para a política, segundo o Congresso em Foco.

Buscando aliados
Na época do almoço em Curitiba, o ex-ministro da Justiça morava em Washington e visitava o Brasil em viagens com duração de uma semana a dez dias, nas quais articulava, na maciota, suas pretensões eleitorais. Depois de garantir um partido para concorrer, Moro procurou aliados potenciais.

Flávio Arns conta que foram dezenas de contatos com parlamentares, partidos, movimentos sociais e economistas. Uma das pessoas procuradas por Moro foi o deputado federal Júnior Bozzella, vice-presidente do PSL.

“Sabendo que sou simpático à pauta, ele agradeceu pelos meus posicionamentos em defesa da Lava Jato. Também fez questão que eu passasse os telefones de outros parlamentares para ele entrar em contato.”

Um dos procurados por Moro foi o deputado federal Julian Lemos (PSL-PB). O relato da conversa feita ao TAB é repetição do que Moro disse a Bozzella: agradecimentos pela defesa dos valores da Lava Jato e de Moro, os rumos políticos do Brasil e questionamentos sobre apoio, em caso de lançar-se candidato ao Planalto.

O ex-juiz era discreto, nunca se comprometia publicamente em entrar para a política, mas estava empenhado na articulação. Teve outros compromissos políticos antes de voltar a Washington. Amigo de longa de data de Adelaide Oliveira, uma das lideranças do MBL (Movimento Brasil Livre), Moro se reuniu com o grupo.

O encontro vazou e da forma errada. A versão que circulou na imprensa dava conta que a conversa era entre Moro e o deputado federal Kim Kataguiri (DEM-SP), integrante do MBL, que sequer participou. De todo modo, era unanimidade na cúpula do movimento que Moro iria tentar a presidência.

Depois de falar com aliados em potencial, o ex-juiz jantou com outros nomes que pretendem se lançar candidatos da terceira via. A reunião ocorreu na casa de um empresário de São Paulo em 29 de setembro e durou três horas.

Além de Moro, participaram o governador de São Paulo, João Doria (PSDB), e o ex-ministro da Saúde Luiz Henrique Mandetta (DEM). Moro não concordou com Doria, que sugeriu que ele tentasse o Senado. O jantar teve outro fato marcante para a terceira via.

O governador de São Paulo sempre declarou que seria candidato a presidente de qualquer jeito. Essa postura foi criticada na reunião. Doria foi lembrado de um pacto feito pelos integrantes da terceira via: todos os partidos vão tentar viabilizar seus indicados e, mais à frente, o pré-candidato mais bem posicionado nas pesquisas vai concorrer pelo grupo. A resposta virá das pesquisas de intenção de voto, até abril de 2022.

“A proposta é de união, lá por abril ou maio. Concorre aquele que tiver maior intenção de voto. Os demais desistem e apoiam o mais bem posicionado. Aposto que vai ser Moro”, declarou o senador Oriovisto Guimarães.

Para reforçar o entendimento de que as pesquisas vão determinar o nome da terceira via, ventilou-se o exemplo de Ciro Gomes (PDT), excluído do encontro por declarar que sairá de qualquer jeito. Pela postura, Ciro está fora das negociações e inviabilizou alianças com MDB, PSDB e União Brasil — siglas com capilaridade, tempo de TV e fundo eleitoral.

Segundo informações obtidas pelo TAB, essa cobrança explica a entrevista de Doria à revista Veja na semana seguinte ao jantar com Moro e Mandetta. Nela, o governador de São Paulo não descartou apoiar outro nome da terceira via.

Hoje, Moro é o nome da terceira via mais bem posicionado na última pesquisa Ipespe, com 8% das intenções de voto. É o dobro dos demais pré-candidatos desse campo político, mas percentual muito abaixo dos 41% de Lula (PT) e dos 25% do presidente Jair Bolsonaro (sem partido). O resultado indica que a terceira via precisa de união para ter alguma chance.

“Se tiver três, quatro candidatos [pela terceira via], pode escrever que vai ser Lula e Bolsonaro no segundo turno. Cada um deles tem apoiadores radicais em torno de 20%, 25%. Todos sabem que [a terceira via] não pode fragmentar”, afirmou Mandetta ao TAB.

Moro já está treinando com fonoaudiólogo e recebe dicas de políticos próximos sobre o que vestir, palavras a evitar e gestos que não pode fazer. Ele é considerado “muito cru” para as fontes ouvidas por TAB, mas humilde em ouvir conselhos e colocá-los em prática.

A postura de Moro não reduz a preocupação de quem busca preparar um produto político. A justificativa é que a carreira de magistrado exige alguém imparcial, controlado e frio. Candidatura presidencial requer oratória cativante, posicionamento e carisma. A capacidade de Moro de desenvolver este lado showman é uma incógnita.

Outra dúvida é como Moro vai se comportar quando ficar nervoso. Um aspirante ao Planalto não pode travar ou demonstrar fraqueza em debates com adversários ou entrevistas espinhosas. Além disso, sua nêmesis estará na corrida. A presença de Moro deve deslocar o eixo do debate para o legado lavajatista, revisto nos últimos anos.

Para Arthur do Val (Patriota-SP), a eleição terá protagonistas muito definidos. “Moro tem histórico ilibado. Lula já foi preso e Bolsonaro cada vez mais mostra que seu passado o condena demais. É nítido que, quando perder a cadeira da presidência da República, vai ser investigado e mais coisas vão aparecer.”

A preparação sobre temas abordados em campanhas presidenciais também gera apreensão. O ex-ministro da Justiça estuda para recuperar terreno em economia e sociologia. Educação, saúde, habitação e meio ambiente são outros assuntos a melhorar.

Há ainda temas identitários como racismo, questões LGBTQIA+ e feminismo, em que a opinião de Moro não é sequer conhecida. A preparação vista como ideal é saber de antemão as posições e propostas do ex-juiz, identificar argumentos contrários e preparar seu discurso para rebater as críticas. Não existe certeza de que haverá tempo hábil para esse trabalho.

Jair Bolsonaro visitou Maringá, cidade natal de Sérgio Moro, em 1º de outubro. Acostumado a ser recebido em cidades do interior com faixas e cartazes de apoio, dessa vez o presidente foi recepcionado por um outdoor provocador: uma foto imensa de Moro e a mensagem de que ele é “a esperança do Brasil”. A alfinetada foi bancada por um grupo de médicos e capitaneada por Fábio Aguayo.

Ele é empresário, presidente de entidades patronais do setor de bares e restaurantes no Paraná e entusiasta de Moro, liderando 12 grupos de WhatsApp com apoiadores do ex-juiz. A lista inclui os médicos que financiaram o outdoor em Maringá. Aguayo conta que tem planos de espalhar outdoors pelo Brasil e aguarda um parecer de especialistas para não infringir a legislação e fazer propaganda eleitoral antecipada.

O empresário conta que mantinha contato com Moro enquanto o ex-juiz morava em Washington com a esposa, Rosângela, e com a cachorrinha da família, a yorkshire Ginger. Lá, o homem que já foi descrito como “workaholic incorrigível” encontrava tempo para montar móveis, viajar por Nova York e fazer caminhadas.

Além de passear e conversar com Aguayo, Moro discutia o Brasil num grupo de WhatsApp composto por Mandetta, o ex-ministro-chefe da Secretaria de Governo de Bolsonaro, o general Carlos Alberto dos Santos Cruz, e o empresário e fundador do partido Novo, João Amoêdo.

A definição sobre o rumo eleitoral permite a Moro destravar outros projetos, como o lançamento de um livro. A obra, que pode servir como uma apresentação de suas ideias para o Brasil, sairia em março, teve seu lançamento adiado três vezes e deve sair 2 de dezembro. O título? “Contra o Sistema da Corrupção”.

Outro compromisso agendado pelo ex-juiz é participar do congresso do MBL em São Paulo, em 20 de novembro. Na ocasião, ele vai entrevistar o comediante Danilo Gentili.

A agenda secreta de novembro tem a cara de Moro: articulação política mais ou menos discreta, gastando muita saliva.

Uol

 

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No alvorecer de 2017, o blogueiro Eduardo Guimarães foi alvo de operação da Polícia Federal não por ter cometido qualquer tipo de crime, mas por ter feito jornalismo publicando neste Blog matéria sobre a 24a fase da Operação Lava Jato, que focava no ex-presidente Lula.

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