Bolsonaro busca grupos de interesse para compensar baixa nas pesquisas

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Foto: Valdenio Vieira/PR

Após uma série de acenos a forças de segurança pública ao longo do ano, o presidente Jair Bolsonaro assegurou nesta terça-feira um reajuste de R$ 1,9 bilhão a policiais federais no ano que vem, o que deve ser usado como bandeira eleitoral na campanha à reeleição. Em outra frente, em uma iniciativa liderada por deputados aliados, a Câmara aprovou no início do mês regime de urgência para o projeto que cria a Lei Orgânica das Polícias Militares. A proposta, que dá mais autonomia para a corporação, deve ir a plenário após o recesso do Congresso, em março, início do ano eleitoral, abrindo o caminho para outra plataforma a ser usada em 2022 pelo titular do Palácio do Planalto e bolsonaristas. A PM é um dos pilares da base do presidente.

Na semana passada, Bolsonaro sancionou projeto que cria o Dia do Policial Legislativo, a ser celebrado em 23 de junho. No dia anterior, havia editado uma Medida Provisória (MP) que permite o custeio de despesas com saúde de servidores da Polícia Federal por meio do Fundo para Aparelhamento e Operacionalização das Atividades-fim da Polícia Federal (Funapol).

As medidas são acenos para manter a fidelidade de uma parte relevante do grupo de apoio a Bolsonaro, que enfrenta queda de popularidade — 60% dizem que não votariam nele de jeito nenhum, e 53% avaliam o governo como ruim ou péssimo, o maior patamar da série histórica, segundo o Datafolha. O apoio ao presidente entre os policiais, principalmente os militares, é forte a ponto de, nas manifestações convocadas por Bolsonaro para o Sete de Setembro, governadores temerem que membros da corporação pudessem aderir aos atos, que tinham bandeiras antidemocráticas, como o fechamento do Supremo Tribunal Federal (STF) e do Congresso.

Na noite desta terça-feira, o Congresso aprovou o projeto do Orçamento de 2022 com um reajuste de R$ 1,9 bilhão a policiais federais no ano que vem. A decisão ocorre um dia após o relator-geral, deputado Hugo Leal (PSD-RJ), ter sido procurado por Bolsonaro para viabilizar o aumento. Para isso, o relator cortou recursos das emendas parlamentares de bancadas estaduais não impositivas, ou seja, não obrigatórias.

O governo quer conceder aumento para integrantes da Polícia Federal, da Polícia Rodoviária Federal e do Departamento Penitenciário Nacional (Depen) e de carreiras do Ministério da Justiça.

A aliados, Hugo Leal relatou que ficou em uma “saia- justa”. Ele e alguns parlamentares consideram que conceder o reajuste apenas aos policiais pode causar um efeito negativo diante de outras categorias que possuem demandas semelhantes, intensificando a pressão.

Em outro esforço para agradar sua base, o projeto que cria a Lei Orgânica das Polícias Militares foi desidratado para viabilizar sua votação, o que deve ocorrer no início do próximo ano. Os dois pontos mais polêmicos foram retirados do texto, mas a proposta ainda tem itens que são questionados por especialistas. O relator da proposta é o deputado Capitão Augusto (PL-SP), líder da bancada da bala e aliado de Bolsonaro.

O projeto, que foi apresentado há duas décadas, ficou engavetado até o início deste ano e foi bastante criticado por prever que a escolha dos comandantes-gerais da PM e dos Bombeiros fosse feita por meio de uma lista tríplice indicada pelos próprios oficiais. Além disso, também determinava que quem assumisse o cargo teria um mandato de dois anos. Hoje, os governadores podem destituir os comandantes sem justificativas. Esses dois pontos, porém, foram retirados da pauta.

— O intuito era evitar o uso político do cargo. A intenção era preservar a instituição para ela atuar na sua finalidade mesmo, independentemente de política. No entanto, como deu essa repercussão errônea, de forma negativa, que a intenção seria retirar o poder dos governadores, eu achei melhor retirar, e isso não consta mais no meu relatório — diz Augusto.

Segundo o deputado, mesmo com o regime de urgência aprovado, a ideia é que a proposta só seja levada ao plenário no ano que vem para que tenha tempo de se reunir com os líderes de cada partido e consiga consensos para o texto. Levar a proposta para 2022 também pode diminuir as resistências em torno do tema, já que opositores do projeto podem não querer se indispor com eleitores policiais em um ano de disputa eleitoral.

Embora tenha retirado de pauta os itens mais criticados do projeto, há ainda pontos questionados por especialistas. Um deles é o que prevê que as funções exercidas por policiais militares e bombeiros sejam consideradas “atividades jurídicas e típicas de Estado”. A redação abre brecha para que a categoria tenha os salários atrelados ao teto dos ministros do STF, e não mais ao do governador de estado.

— Quando se fala “carreira jurídica”, são as únicas carreiras que não estão submetidas ao teto dos salários dos governadores. Seriam os promotores, os defensores e o juízes. Portanto, você pegaria mais de 30 mil oficiais que existem no Brasil e aumentaria o teto salarial, que em média é de R$ 25 mil dos governadores, para os R$ 37 mil do Supremo — diz o diretor do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, Renato Sérgio de Lima.

Capitão Augusto, por sua vez, afirma que a intenção do projeto não é mexer nos salários da categoria, o que, segundo ele, seria inconstitucional. De acordo com o deputado, o objetivo da proposta é assegurar mais garantias e estabilidade aos policiais e bombeiros.

Para o presidente do Conselho Nacional de Secretários de Estado da Administração (Consad), Fabrício Marques, o texto é uma sinalização preocupante para os estados:

— Abre caminho para que as categorias policiais pressionem fortemente para equiparar os seus salários com os do Judiciário. Isso seria fatal para as finanças dos estados — diz Marques, que ressalta que a folha de pagamento dos agentes de segurança pública já costuma ser maior do que as demais categorias.

Segundo Marques, o conselho ainda está elaborando um parecer final sobre o projeto de lei. Porém, já antecipa que, em sua visão, é ruim para a questão federativa ter parte de seus servidores com salários equiparados a uma outra instância.

Também é alvo de crítica a obrigação de os governadores apresentarem uma justificativa para exonerar os comandantes-gerais da corporação — o que não é necessário segundo a legislação atual — e a criação de novas patentes para oficiais, aproximando a PM da estrutura das Forças Armadas.

Hoje, o posto mais alto na corporação é o de coronel. Caso a proposta seja aprovada, serão criadas as patentes de tenente-general, major-general e brigadeiro-general para policiais militares. Segundo o relator, os novos cargos teriam mais a função de garantir prestígio à corporação do que efeito prático. Já em relação à exoneração, Augusto afirma que a ideia é impedir que um governador possa trocar o comandante-geral com objetivos políticos e em um curto espaço de tempo.

O Globo

 

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