Nos EUA, Fux minimiza messianismo de André Mendonça

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Foto: Rosinei Coutinho/SCO/STF

Luiz Fux, presidente do Supremo Tribunal Federal, disse nesta quinta (9) que a corte age de modo alinhado ao julgar questões de direitos humanos, como a união homoafetiva, e defendeu que os juízes precisam deixar de lado seus valores pessoais ao analisar os processos.

“Os juízes podem ter as suas opções, podem ser casados, ter filhas, netos. O juiz não pode levar para o julgado os seus valores que não são valores constitucionais. O estado é laico. Você pode acreditar no que você quiser, mas eu sou juiz da Constituição”, disse o ministro, durante uma palestra na Universidade de Columbia, em Nova York, nesta quinta (9).

A declaração foi feita durante uma explanação, sem que Fux fosse questionado sobre o tema, dias após André Mendonça ter sua indicação confirmada para o STF. Ele é evangélico, e críticos afirmam que o novo membro poderá usar seu poder para defender temas de interesse dos fiéis. Fux não citou o nome de Mendonça em sua fala.

O magistrado começou sua apresentação dizendo que o Brasil é uma referência internacional em direitos humanos e que o Supremo costuma votar de forma unânime questões relacionadas ao tema, como no caso da união homoafetiva, aprovada em 2011 por 11 votos a zero.

O ministro também falou sobre a democracia brasileira. Disse ter certeza de que as eleições de 2022 serão realizadas sob normalidade, pois o STF age de modo a proteger a democracia e, ao mesmo tempo, não vê interessados em dar um golpe.

“A democracia brasileira, ela é muito solida. Não há a menor chance de que a democracia brasileira sofra qualquer risco nas eleições vindouras. Absolutamente nenhum risco. Há o que denominamos de vigilância suprema. Ou seja, o STF, assim como ocorreu alhures, manterá hígida a democracia brasileira”, afirmou.

“Na qualidade de chefe de Poder, já tive oportunidade de conversar com supostas pessoas que seriam ameaças à democracia. As forças militares, os generais, não tem o menor interesse em romper com a democracia. Eles não querem isso”, afirmou.

“Quem ganhar a eleição vai assumir, e em um estado de absoluta normalidade, porque o Judiciário respeita essa separação de poderes, mas resguarda com muita consciência e muita coesão a democracia brasileira”, prosseguiu.

O ministro enalteceu a atuação do Supremo, e fez críticas à classe política.

“Há uma desfuncionalidade com relação a uma suposta invasão de poderes, mas que na verdade não é. A Justiça só se manifesta quando é provocada. O juiz da Suprema Corte não sai procurando problemas. Há o que se chama de judicialização da politica. São os próprios políticos que perdem as suas votações na arena própria, que é o Parlamento, e recorrem ao Judiciário. O que é uma grande anomalia, porque perdeu lá, deveria se contentar. Isso faz parte do jogo democrático”, afirmou.

Fux foi questionado pelo professor de direito Kendall Thomas, da Universidade de Columbia e que dividiu com ele a mesa no evento, sobre duas práticas da Justiça brasileira que ele considera como estranhas do ponto de vista americano: as conversas informais de juízes com líderes políticos e o pedido de vista, que definiu como uma ferramenta informal, usada para adiar o resultado de processos, às vezes por décadas.

O professor classificou a prática como uma espécie de “jeitinho” brasileiro que coloca em risco o funcionamento do sistema como um todo. “Justiça adiada é justiça negada”, afirmou.

Thomas também questionou sobre as denúncias de conversas privadas entre o ex-juiz Sérgio Moro e procuradores que cuidavam de casos sob sua análise, sem conhecimento dos réus. “O juiz deveria ser imparcial e tomar decisões de forma objetiva”, pontuou.

“De um ponto de vista americano, estes são movimentos que vemos como um risco auto-imposto à separação de poderes e à aplicação da lei”, comentou o professor.

Fux considerou as observações de Thomas como pertinentes, mas disse que o uso do pedido de vista serve como alternativa para que a corte adie sentenças para as quais a sociedade ainda não está preparada para receber.

E que nos EUA, a Suprema Corte age de modo similar ao simplesmente não aceitar casos que não queira avaliar no momento, algo previsto na lei americana, enquanto o STF brasileiro precisa dar resposta a todos os processos que recebe.

O ministro também defendeu a atuação de Moro e disse considerar que as ações do ex-juiz na Operação Lava Jato foram lícitas. “Tenho uma profunda administração pelo ministro, pelo juiz Sergio Moro. Ele seguiu todas as regras”, afirmou.

Fux viajou aos Estados Unidos nesta semana para eventos em Washington e em Nova York. Na capital americana, ele participou de um encontro com a OEA (Organização dos Estados Americanos) e CIDH (Comissão Interamericana de Direitos Humanos), para atualizar o plano de cooperação em proteção aos direitos humanos.

Na terça (7), o ministro teria um encontro com Luís Almagro, secretário-geral da OEA, mas a reunião foi cancelada porque uma pessoa próxima a Almagro foi diagnosticada com Covid.

Nesta sexta (10), Fux participa de um evento sobre o Dia dos Direitos Humanos pela manhã, na sede da ONU em Nova York. De tarde, terá uma reunião com o secretário-geral da entidade, Antônio Guterres.

Folha de S. Paulo

 

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