Documentário sobre Olavo de Carvalho estreia com cinema vazio

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Foto: Reprodução

O Belas Artes, um dos mais tradicionais cinemas de São Paulo e point da esquerda cinéfila, voltou a exibir, na quinta-feira (27), o documentário sobre Olavo de Carvalho.

“O Jardim das Aflições” retornou à tela após a morte de Olavo na última segunda-feira (24) no estado da Virgínia (EUA). André Sturm, proprietário do cinema, atendeu ao pedido do diretor Josias Teófilo, com quem conversou diretamente.

O horário de exibição da “reestreia” não foi convidativo: apenas uma sessão, bem na hora do almoço (13h30). Alguém poderia dizer que, com o calor que tem feito na capital paulista, a verdadeira aflição estava do lado de fora das instalações refrigeradas do Belas Artes.

Apesar de ser um fenômeno na internet, autor de best-sellers e guru da extrema-direita brasileira — chegou até a indicar nomes de ministros a Jair Bolsonaro —, Olavo não foi sucesso de público. Dos 135 lugares da sala 3, apenas cerca de vinte estavam ocupados.

O público diminuto e silencioso manifestava-se timidamente, com interjeições e algumas risadas, quando Olavo fazia piadas ou o filme mostrava cenas familiares. O trecho em que o escritor mostra uma estante recheada de livros de autores de esquerda e diz “nenhum comunista leu tudo isso; se lesse, não seria comunista” foi o que mais suscitou reações na plateia.

Nada, portanto, de fãs ardorosos interagindo a cada cena. O único falatório durante a 1h20 de filme veio de duas senhoras que chegaram atrasadas e tiveram problemas com o degrau que, inexplicavelmente, separa o corredor das fileiras de poltronas no Belas Artes.

“O Jardim das Aflições” estreou em 2017 e enfrentou severa resistência à época. No Recife, terra de Josias Teófilo, a exibição do filme na UFPE (Universidade Federal de Pernambuco) terminou em pancadaria. Cineastas que fariam parte da 21ª edição do Cine PE pediram que suas obras fossem retiradas do festival, depois da inclusão de “O Jardim das Aflições”. A mostra chegou a ser adiada.

O filme recupera trechos do livro homônimo de Olavo, e aborda sua visão de mundo e sua suposta corrente filosófica. Quem for assisti-lo esperando pregação antivacina, teorias da conspiração sobre esquerdistas pedófilos e revelações como “o verdadeiro autor das músicas dos Beatles é o filósofo alemão Theodor Adorno” certamente ficará decepcionado. Não há quase nada a respeito da faceta tresloucada e virulenta de Olavo.

O recorte escolhido por Josias talvez explique reações ao filme como a de Ruth Leandro. Ela fala à reportagem de TAB com o tom emocionado de alguém visitado por uma revelação. “Adorei o filme. A sabedoria, o conhecimento que ele [Olavo] tem”, diz Ruth. “Confesso que tinha um pé atrás. Mas era ignorância. Com o falecimento dele, comecei a ler [textos de Olavo] e pretendo continuar a fazê-lo.”

Para surpresa geral, inclusive da reportagem, o próprio Josias Teófilo aguardava o público após a exibição do filme. No pequeno saguão do Belas Artes, ele é tietado por pessoas como Pedro Neto, 56, homem com a compleição física de um general anglo-saxão.

Médico, ele usa uma camiseta do movimento “Brasil Conservador”. “A ideia que ele trouxe para a sociedade brasileira, a percepção política e social, já aconteceu, já está aí mesmo com eventuais mudanças de governo”, diz ele. “Acompanhei a [campanha pelas] Diretas Já, o Fernando Henrique [Cardoso, ex-presidente] e todo esse espectro da social-democracia. Era o universo que eu conhecia quando o Olavo começou a falar sobre o Foro de São Paulo e ‘desmascarou’ esses caras.”

Neto diz que já votou em candidatos de esquerda e foi punk e anarquista. Considerava-se “um cara consciente sobre as coisas” porque lia a revista Veja e assistia aos jornais da Rede Globo. Percebeu que era tudo ilusão quando Olavo “desnudou a verdade”.

Sobre a postura negacionista de seu mestre, Neto tenta remediar, mas, em um primeiro momento, é impossível entender o argumento. Parece que o médico quer ser antivax, mas seu CRM não deixa. Saiu algo mais ou menos assim: “Vacinas… Tem tanta doença que tem as tradicionais, a da poliomielite, muitos eficazes, mas assim, desde a descoberta das vacinas, demoraram tanto tempo… Por exemplo, a prevenção da AIDS [sic] é camisinha, mas assim, as doenças de pobre, de africanos, a malária ou qualquer tipo de doença de periferia não tem efetividade”, diz o médico antes de, aí sim, deixar clara sua posição ao criticar a CoronaVac, mencionar o “tratamento precoce” e chamar o governador João Doria de “calça apertada”.

O cineasta Josias Teófilo é um homem magro, simpático, de fala e modos suaves, que aparenta ter menos que seus 34 anos de idade. Ao TAB, afirma que a influência da obra de Olavo de Carvalho tende a crescer. “Há um pico de interesse quando a pessoa morre, e os alunos de Olavo têm mais repercussão nas redes sociais do que ele tinha”, afirma Josias. “Pessoalmente, gostaria que aumentasse o interesse pelo legado cultural do Olavo, pelos autores que ele ajudou a resgatar.”

O cineasta acredita que uma eventual vitória de Lula nas próximas eleições só fará aumentar o interesse pelo escritor. “Quando nós [a direita] estávamos fora do poder, colocávamos cinco milhões de pessoas na rua. Ser oposição dá uma força muito grande.”

Josias demonstra que ainda está magoado pelos ataques que o mundo do cinema dirigiu a ele. Diz que, a não ser pelo Belas Artes, outros cinemas do circuito artístico e “progressista” não quiseram exibir “O Jardim das Aflições”.

“O filme deveria ter passado no Cinesesc e em outros cinemas. Não passou nem no circuito alternativo da minha cidade”, diz. “Fiz um trabalho muito importante. Quando forem pesquisar sobre Olavo, terão uma fonte primária [para consultar]. Isso deveria ser valorizado. Já tem gente escrevendo dissertações de mestrado sobre o filme.”

Josias diz que não se importa em ficar conhecido como “o cara que fez o filme do Olavo”. Aposta que, no futuro, a obra será tratada como um registro importante e que, tal qual Nelson Rodrigues, ele (Josias) ainda será um autor de direita reconhecido pela esquerda. Sobre as piadas sobre a morte de Olavo, ele diz que o próprio escritor riria. “Ele queria que escrevessem ‘fodam-se’ na lápide dele.”

Para André Sturm, os mais diversos matizes ideológicos estão representados na programação do Belas Artes. “Claro que isso não vale para um filme que, por exemplo, defenda que você deve sair na rua atirando nas pessoas”, afirma ao TAB. “[O Jardim das Aflições] É um bom filme para quem quer conhecer melhor o pensamento do Olavo de Carvalho, inclusive para criticá-lo. Mesmo que eu não goste, é um homem que teve uma importância inquestionável nos últimos anos.”

Uol  

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