Programa Nacional de Imunizações está acéfalo há seis meses

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Foto: Rafaela Felicciano/Metrópoles

Pouco mais de seis meses após a enfermeira Francieli Fantinato deixar o cargo de coordenadora do Programa Nacional de Imunizações (PNI), o Ministério da Saúde ainda não definiu um nome para ocupar o posto.

Desde 2015, o país enfrenta uma redução significativa nas porcentagens de cobertura vacinal de diversos imunizantes infantis, imprescindíveis para evitar a disseminação de doenças já eliminadas, como o sarampo e a poliomielite.

A falta de um especialista à frente do programa pode causar consequências negativas para as campanhas de vacinação no Brasil, e piorar ainda mais os números de imunização no pais, avaliam especialistas ouvidos pelo Metrópoles

Ligado ao Departamento de Imunização e Doenças Transmissíveis, da Secretaria de Vigilância em Saúde, o programa é responsável por definir os calendários nacionais de vacinação considerando a situação epidemiológica, com orientações específicas para crianças, adultos, gestantes, idosos e povos indígenas. A ação sempre teve reconhecimento internacional pela excelência nas campanhas nacionais que realiza.

Apesar de apresentarem queda na cobertura vacinal desde 2015, as principais vacinas infantis oferecidas pelo Sistema Único de Saúde (SUS) tiveram resultados ainda piores durante a pandemia de Covid-19.

Dados do Datasus, rede de indicadores do Ministério da Saúde, mostram que nenhuma vacina do calendário infantil teve cobertura maior que 90% — o número esperado pelo governo no planejamento das campanhas — durante os anos de 2020 e 2021.

A situação é semelhante nos índices de vacinação contra a influenza. Em 2021, a campanha teve baixos níveis de adesão. No início da ação, as doses eram oferecidas apenas para o público-alvo, formado por idosos, crianças, profissionais da saúde, gestantes, indígenas e trabalhadores de determinadas categorias profissionais.

No entanto, com a baixa procura pelo imunizante nas Unidades Básicas de Saúde (UBS), o Ministério da Saúde prorrogou duas vezes a ação e ampliou a vacinação para toda a população acima dos 6 meses. De acordo com a plataforma LocalizaSUS, ainda assim, a cobertura vacinal da campanha de 2021 terminou em 71,2%.

Ao Metrópoles, a médica Mônica Levi, diretora da Sociedade Brasileira de Imunizações (SBIm), avaliou a situação do Programa Nacional de Imunizações (PNI) como um “retrocesso”. A pesquisadora pontua que todo o reconhecimento mundial conquistado pelo governo brasileiro desde 1973, ano em que o PNI foi criado, está em jogo.

“O Brasil teve, com organização, empenho e trabalho, conquistas inquestionáveis. A gente conseguiu altas coberturas vacinais, eliminação de uma série de doenças, como sarampo, febre amarela, tétano neonatal”, pontua.

Com a falta de um nome à frente do cargo, a diretora da SBIm afirma que as campanhas de 2022 podem ficar comprometidas, especialmente no momento de retomada de atividades presenciais, como as aulas infantis.

“Esse é o grande temor que a gente tem. Crianças e adolescentes são muito importantes na cadeia de transmissão de doenças. Voltando sem altas coberturas vacinais, temos risco de surtos de disseminação de doenças que, teoricamente, eram para estar controladas”, explica.

A escolha de um nome para ocupar o cargo é uma incógnita desde o dia 7 de julho, quando a enfermeira Francieli Fantinato, que atuava na função, decidiu deixar o posto. O pedido veio na véspera do depoimento da profissional à Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Covid, no Senado Federal.

Em outubro, o caso ganhou um novo desdobramento. O pediatra Ricardo Gurgel, que havia sido nomeado para ocupar o cargo, informou que não assumiria a vaga. Ele relata que foi ao Ministério da Saúde em 28 de outubro e soube, por um representante da Secretaria de Vigilância em Saúde (SVS), que não tomaria posse.

Ao Metrópoles, o médico, que é membro do Departamento Científico de Imunizações da Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP), disse acreditar que não foi empossado por “acreditar nas vacinas”.

“Não foi me dada a posse, talvez porque eu defendo realmente as vacinas, acredito que elas funcionam e as defenderia em qualquer circunstância”, pontuou.

Gurgel afirma que, após receber a informação de que não tomaria posse, não foi procurado nenhuma vez por membros do Ministério da Saúde. O pediatra acredita que profissionais que defendem a vacinação temem ocupar o cargo e serem descredibilizados por integrantes do governo.

“Você acha que alguém vai querer assumir o cargo em um governo desses? Acho difícil. O governo não está preocupado, senão teria feito alguma coisa. Acho que terão muita dificuldade em encontrar alguém que possa fazer algo pelo PNI”, avaliou.

Ao Metrópoles, Ricardo Gurgel afirmou que será difícil ter o resgate das coberturas vacinais durante o ano de 2022 sem um chefe na liderança do PNI. Ele argumentou que a equipe técnica do programa faz um bom trabalho, mas que é necessário ter uma liderança para traçar estratégias.

“A principal atuação em saúde que salva vidas no mundo é a vacinação. A participação de um coordenador faz com que as politicas possam ser implementadas, novas estratégias sejam montadas e pensadas para que as coberturas voltem ao nível ideal”, explica.

“O PNI continua funcionando porque tem uma equipe muito boa de funcionários, de pessoas que acreditam naquilo que estão fazendo e fazem as coisas direito, têm tradição. Não tem uma liderança, e só funciona porque eles trabalham por si, a estrutura existe por si. Mas acho que não vai haver resgate de cobertura vacinal durante esse ano de 2022 de jeito nenhum”, lamenta.

O que diz o Ministério da Saúde?
A pasta enviou uma nota ao Metrópoles afirmando que as ações do PNI “seguem sendo realizadas normalmente”, mesmo sem chefe do programa. Leia a íntegra:

“O Ministério da Saúde informa que a servidora Greice Ikeda atua como coordenadora-geral do Programa Nacional de Imunizações (PNI), conforme publicado no Diário Oficial da União. As ações que dizem respeito ao PNI seguem sendo realizadas normalmente. O programa conta com 20 vacinas, cuja proteção se inicia ainda nos recém-nascidos, podendo estender-se por toda a vida.

A Pasta ressalta que a imunização de rotina, incluindo a de Influenza, é mantida ativa, e a orientação é para que a população procure os postos de saúde para atualizar a caderneta de vacinação.

Com o objetivo de esclarecer a população quanto à importância de se proteger contra a gripe, o ministério realizou campanhas de comunicação, com a veiculação de peças publicitárias em televisão, rádio, internet e mídia exterior, totalizando um investimento de R$ 18,2 milhões.”

Metrópoles

 

 

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