Bolsonaro manterá discurso para desacreditar Justiça Eleitoral
Foto: Sergio Lima/AFP
Operadores experientes do Judiciário apostam que o discurso ambíguo de Jair Bolsonaro em relação ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE) não tem nada de gratuito e segue uma lógica bem pragmática.
Na segunda-feira (7), ao receber os ministros Edson Fachin e Alexandre de Moraes, que vão comandar o TSE, Bolsonaro disse que precisava haver “mais diálogo” entre eles.
Três dias depois, em sua live semanal, ele colocou mais uma vez em dúvida a segurança das urnas, dizendo que técnicos do Exército tinham encontrado vulnerabilidades nos equipamentos e sugerindo que a corte se recusava a dar explicações – o que há tempos estava previsto para esta segunda-feira (14), numa reunião da Comissão de Transparência das Eleições.
Na interpretação de ministros das cortes superiores com quem conversei nos últimos dias, o morde-e-assopra do presidente visa preservar algum canal de interlocução com a corte eleitoral e ao mesmo tempo manter viva a narrativa de fraudes, para poder alegar perseguição caso o tribunal tome alguma medida contra ele.
Isso porque Bolsonaro sabe que o TSE ainda tem um trunfo contra ele, uma espécie de “espada de Dâmocles” pendurada sobre sua cabeça. A expressão faz referência a uma história da mitologia grega e representa uma situação de risco iminente.
O risco, no caso de Bolsonaro, é o inquérito administrativo em curso na corregedoria-geral do tribunal a respeito da famosa live das urnas eletrônicas.
Na transmissão, em agosto passado, Bolsonaro divulgou dados de uma investigação sigilosa da Polícia Federal sobre a invasão de um hacker nos sistemas do TSE em 2018.
A apuração sobre as eleições de 2018 não chegou a nenhuma conclusão, mas o presidente da República não só colocou uma cópia digital em suas redes sociais como também sugeriu que houve fraude.
No inquérito concluído na semana passada sobre esse caso, a delegada da Polícia Federal Denisse Rios afirma que Bolsonaro cometeu um crime.
Mas, no entorno do presidente, a aposta é de que o procurador-geral da República, Augusto Aras, a quem cabe dar seu parecer, não vai dar denunciar Bolsonaro ao Supremo.
Só que o inquérito administrativo do TSE ainda não acabou. Nesse caso, a apuração busca averiguar se houve abuso de poder político e uso indevido dos meios de comunicação de Bolsonaro na live.
A apuração da corte eleitoral leva em conta os mesmos documentos do inquérito das fake news conduzido no Supremo, compartilhados pelo ministro Alexandre de Moraes.
Em tese, se o presidente for considerado culpado, a punição pode ser tornar o presidente da República inelegível – o que é altamente improvável, ainda mais a poucos meses das eleições.
Os ministros do TSE, porém, não têm nenhuma intenção de apressar a conclusão da investigação, e muito menos de aliviar a barra do presidente. Enquanto puderem, manterão a espada pendurada sobre Bolsonaro.
Ainda assim, interlocutores que fazem a ponte entre o presidente e o judiciário lembram que há um precedente perigoso: o do deputado federal Fernando Francischini (PSL-PR), que teve o mandato cassado no TSE por seis votos a um, em outubro passado. Francischini ficou inelegível.
O motivo também foi abuso de poder político e uso indevido dos meios de comunicação, pela divulgação de dados falsos sobre a vulnerabilidade das urnas eletrônicas em uma transmissão pela internet para centenas de milhares de pessoas.
Em seu voto, o ministro que vai relatar a investigação sobre Bolsonaro, Mauro Campbell, foi direto: “diante da Justiça Eleitoral, os candidatos detentores de cargo público se despem da quase totalidade de suas prerrogativas para a disputa da eleição, sob pena de violação da isonomia da disputa.”
Traduzindo: para o ministro que comanda o inquérito sobre Bolsonaro no TSE, estar no poder não impede o candidato de ser punido.
A espada está afiada, e Bolsonaro sabe disso.
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