Aliados de Márcio França são suspeitos de desvios na saúde
O Grupo de Atuação Especial e Repressão ao Crime Organizado (Gaeco) do Ministério Público de São Paulo investiga o ex-secretário adjunto da Saúde Antônio Rugolo Junior e o advogado Danilo Druzian Otto, responsável pela coordenadoria de gestão de contratos da pasta na gestão Márcio França (abril a dezembro de 2018), pré-candidato ao governo paulista pelo PSB. Eles são suspeitos de fraude em licitação e foram alvo de busca e apreensão em investigação sobre a organização criminosa liderada pelo médico Cleudson Garcia Montali, condenado a 200 anos de prisão por desvios de R$ 500 milhões de unidades de saúde em quatro Estados.
Segundo os investigadores, Otto teria contratado uma Organização Social ligada a Cleudson, a OSS Pacaembu, para gerir o Hospital Geral de Carapicuíba, mesmo após a área técnica da Secretaria de Saúde considerar o plano apresentado por ela insatisfatório por não atender às exigências do edital. Ainda de acordo com a investigação, o esquema agia da seguinte forma: assumia a administração de hospitais e desviava recursos por meio de despesas fictícias ou superfaturadas. Conforme a Promotoria, entre 2017 e 2019, o grupo recebeu repasses públicos de R$1,43 bilhão. Estimou ainda que outros R$ 500 milhões foram repassados em 2020. Parte desses recursos foi efetivamente usada para cobrir despesas existentes no hospitais e outra foi desviada.
O contrato de Carapicuíba envolvia despesas de R$ 10,5 milhões só em 2019. Foi na investigação sobre esse contrato que o Ministério Público requisitou pela primeira vez buscas na casa e no escritório de França, em novembro de 2020, alegando que ele seria integrante do “núcleo político” do esquema de desvios na Saúde. O juiz Renato de Andrade Siqueira, no entanto, negou as buscas contra França, mas autorizou a ação contra Rugolo e Otto.
França é citado por integrantes da organização de Cleudson em diálogos interceptados pela polícia. As conversas demonstrariam a proximidade do médico com o ex-governador. A polícia anexou ao inquérito fotos de França com os acusados, como indícios da ligação entre eles. O pessebista nega.
Apontado como homem de confiança de França, Otto foi nomeado na Secretaria de Saúde em abril de 2018. Antes, havia trabalhado, entre 2015 e 2017, como assessor do deputado estadual Caio França (PSB), filho do ex-governador. Também esteve lotado no gabinete de França, na Câmara dos Deputados, de 2013 a 2014, assim como participou de sua gestão na prefeitura de São Vicente (SP), entre 2009 e 2012.
Contrato
Em 2018, o hospital de Carapicuíba era gerido pela OSS São Camilo, em um contrato que terminaria em dezembro. Em 30 de julho daquele ano, a secretaria publicou uma resolução – sem passar por nenhuma consultoria jurídica da pasta – na qual convocava entidades privadas para a gestão do hospital. O prazo de manifestação de interesse era de apenas dez dias. Somente três entidades apresentaram propostas, entre elas a OSS Pacaembu, que não fez nenhuma visita técnica ao hospital.
O parecer feito pela área técnica da secretaria, de 13 de novembro de 2018, apontava que o plano da OSS Pacaembu não atendia às exigências do edital. Já a São Camilo teria apresentado proposta adequada, mas com valores maiores. A organização social aceitou diminuí-lo, mas o documento em que aceitava reduzir sua proposta não foi anexado ao processo.
No mesmo dia, Otto contratou a OSS Pacaembu. Para administrar o hospital, Cleudson chamou o administrador Fernando de Carvalho. Interceptações telefônicas feitas pela Polícia Civil apontam que Carvalho arrecadava dinheiro desviado para Cleudson. Foi Carvalho que contratou a médica Maria Paula Loureiro de Oliveira Pereira como diretora do hospital. Ela fechou uma delação premiada com o Ministério Público.
Os investigadores apontam ainda conflito de interesse na atuação de Rugolo na secretaria. Segundo os promotores, ele foi nomeado para o cargo na pasta mesmo sem se desligar da Fundação para o Desenvolvimento Médico e Hospitalar (Famesp), uma OS que já era contratada pelo governo.
‘Vão ter de tentar me derrotar na única maneira que aceito: no voto’
O ex-governador Mário França disse que a busca e apreensão contra ele foi “um ato político, nos primeiros dias de um ano eleitoral”. “Nem os cavalos de mármore do Palácio dos Bandeirantes acreditaram. Aliás, 30 dias depois, o próprio juiz responsável dos autos determinou a devolução imediata dos bens apreendidos, e eles me foram devidamente devolvidos.”
França defendeu a nomeação de Danilo Druzian Otto para a coordenadoria de gestão de contratos da Secretaria da Saúde. “Ele é um advogado que exerceu, junto com o doutor Augusto Zago, atual presidente da Fapesp, ex-reitor da USP, então secretário de Saúde do meu governo, uma função de confiança na Secretaria Saúde do Estado. Ambos são pessoas competentes e respeitadas.”
Ainda segundo o ex-governador, sua relação com Otto é de “confiança”. “Como tenho com o doutor Zago e todos que trabalharam comigo.” França afirmou que seu relacionamento com o ex-secretário adjunto da Saúde Antônio Rugolo Junior – também investigado – é semelhante. “Professor universitário, sério e competente. Grande profissional. Um dos maiores nomes da ciência e da pesquisa de São Paulo.”
França disse que baseou sua decisão de rever a punição de demissão do médico Cleudson Montali, então funcionário da pasta, transformando-a em suspensão de 30 dias, em parecer da Procuradoria do Estado, “que concluiu que a punição original estava equivocada, seguindo parecer de uma das maiores professoras jurídicas do Brasil, a professora Maria Silvia Zanella di Pietro”.
‘Intimidação’
Sobre Cleudson, França declarou que o conheceu apenas “como um médico e administrador de várias Santas Casas do interior”. E disse que tomou providências contra as acusações. “Tenho 40 anos de vida pública, não respondo a nenhum processo criminal e disputarei no voto o governo de São Paulo. Não há intimidação que me acovarde. Vão ter de tentar me derrotar na única maneira que aceito, no voto.”
O criminalista Antonio Claudio Mariz de Oliveira, que defende Rugolo, afirmou que, após diligência inicial, nada mais aconteceu. “O caso está parado. A acusação que pesa sobre ele é que ele ocupou a secretaria e não se desligou da fundação. Isso é um fato insignificante, não constitui crime.” A defesa de Otto não foi encontrada.