As mordomias da mãe de Ciro Nogueira
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A senadora Eliane Nogueira (PP-PI), mãe do ministro-chefe da Casa Civil, Ciro Nogueira (PP-PI), passou a usar sua cota parlamentar para alugar carro de luxo de empresa cujo dono é réu em ação de improbidade administrativa.
A parlamentar desembolsou, em dezembro de 2021 e janeiro de 2022, R$ 15 mil mensais para ter à sua disposição um Toyota SW4. Ela chegou a ter, em um mesmo mês, quatro carros pagos com verba pública, incluindo um Nissan Sentra cedido pelo Senado Federal. Desde outubro, Eliane não gasta com combustível de aeronave. Naquele mês, o jornal Folha de S. Paulo revelou que o abastecimento do jatinho era feito em locais de agenda do filho.
O valor usado por Eliane Nogueira para alugar o Toyota é o mais caro entre todos os senadores que gastam com aluguel de automóvel, segundo dados de dezembro.
O dinheiro vai para a locadora de veículos Luauto Rent a Car LTDA, que tem como sócio-administrador o empresário Antônio Luis Ramos de Resende Júnior.
Também conhecido como Júnior da Luauto, o empresário é réu em ação que tramita na Justiça do Piauí. Ele foi denunciado ao lado do ex-prefeito de Teresina (PI) Firmino Filho pelo Ministério Público do Piauí (MPPI), em 2016, devido a suposto superfaturamento de, no mínimo, R$ 1,4 milhão em um processo de desapropriação de terras em Teresina, capital do estado.
Firmino morreu em abril do ano passado. Ele tinha o apoio de Ciro Nogueira para ser candidato a governador do Piauí, neste ano, pelo Partido Progressista (PP). A filha do ex-prefeito, a deputada estadual Lucy Soares (PP-PI), segue estritamente aliada à família Nogueira.
Os Nogueiras possuem ainda uma outra ligação com Júnior da Luauto. Ciro foi sócio de Humberto Costa e Castro, que administra a Parking Tower Estacionamentos ao lado de Resende Júnior. O quadro societário foi apurado por meio da Receita Federal e da Junta Comercial do Piauí.
Os pagamentos à Luauto podem ser comprovados nas notas apresentadas por Eliane Nogueira em sua prestação de contas. O Metrópoles fez um levantamento dos outros automóveis alugados no Senado e verificou se tratar do maior valor de cota parlamentar destinado para aluguel de carros.
O senador Telmário Mota (Pros-RR) alugava uma caminhonete por R$ 18 mil ao mês, mas o desembolso foi cortado em julho, após reportagem do Metrópoles.
Já o Toyota SW4, que custa mais de R$ 300 mil no mercado, faz parte de uma lista de carros vinculados a Eliane Nogueira. Além dos R$ 15 mil, a senadora destina R$ 3,6 mil mensais para o aluguel de um Honda Civic. Em agosto, outubro e dezembro do ano passado, a congressista também chegou a alugar um Renegade Longitude por quase R$ 3 mil.
Ao Metrópoles o Senado confirmou ainda que a Eliane Nogueira usa o carro oficial fornecido pela Casa, um Sentra, no âmbito de um contrato de R$ 3,9 milhões.
Ela não precisa pagar por nenhum desses carros. Dessa maneira, só em dezembro do ano passado, a mãe de Ciro Nogueira teve à sua disposição quatro carros pagos com dinheiro público – sem contar os dois veículos, um Toyota RAV4, no valor de R$ 101,9 mil, e um Jipe Pajero, de R$ 50,4 mil, que declarou ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE), em 2018, serem de sua propriedade.
Eliane Nogueira foi procurada para se explicar. Na quarta-feira (2/3), a assessoria da senadora afirmou que ela tinha “agenda de reuniões no Piauí”. No dia seguinte, a reportagem retomou o contato, mas não foi respondida. O espaço segue aberto.
Gasto não é ilegal
O dinheiro gasto com o aluguel de carros faz parte da cota parlamentar, valor mensal destinado a custear os gastos vinculados à atividade de mandato.
A verba pode ser gasta com passagens aéreas, telefonia, serviços postais, manutenção de escritório e aluguel de carros, por exemplo.
Júnior da Luauto
De acordo com a denúncia do Ministério Público do Piauí (MPPI), o processo suspeito de desapropriação de uma gleba de terras com área de 20 hectares (o equivalente a 20 campos de futebol) no bairro Angelim, em Teresina, ocorreu em outubro de 2014.
O terreno pertencia à empresa Luauto Factoring Fomento Mercantil, de Resende Júnior. Na ocasião, foi celebrado um termo de ajuste no qual a Prefeitura de Teresina pagou R$ 6,75 milhões à companhia. O valor pago a título de indenização foi superestimado em ao menos R$ 1,4 milhão, configurando, assim, dano ao erário público, segundo o MPPI. O Metrópoles teve acesso à íntegra do processo, que corre no Tribunal de Justiça do estado.
“Firmino da Silveira Soares Filho, embora tenha praticado ato lícito – termo de ajuste –, por inobservância do dever de cuidado objetivo ocorreu em dois momentos: a) ao não levar em conta que, tendo em vista a urbanização foi fruto de intervenção do poder público, através do município (pavimentação), do Estado (água) e da União (energia), pode-se concluir que o real valor do imóvel há de fundamentar-se a partir dos lotes em urbanização que, segundo o laudo de avaliação, possuem o valor médio de R$ 3.918,74, possuindo um campo de arbítrio que varia de R$ 3.330,92 a R$ 4.506,55”, relata o MP.
“Levando em consideração tais informações, o valor do imóvel deveria ter sido fixado entre R$ 2.165.098,00 e R$ 2.929.257,00”, prossegue o parquet.
Júnior da Luauto teria sido beneficiado ao menos duas vezes no suposto esquema. Primeiro, por não ter pago a contribuição de melhoria ao ter o imóvel valorizado por obras públicas; segundo, pela indenização por desapropriação ter sido fixada em valor decorrente da avaliação de lotes total ou parcialmente urbanizados.
Em agosto do ano passado, o julgamento do mérito do processo foi extinto em relação a Firmino Filho, devido à morte do ex-prefeito de Teresina. O empresário Júnior da Luauto segue como réu no processo. Ele foi procurado nessa sexta-feira (4/3), mas não se manifestou.