Em baixa com jovens, Bolsonaro tenta atraí-los

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Foto: Clauber Cleber Caetano/Presidência da República

Súbito, o presidente Jair Bolsonaro avisa que a participação do advogado-geral da União ficará para uma próxima oportunidade e chama à mesa uma auxiliar pouco conhecida do brasileiro médio.

Até havia pautas mais quentes para o chefe do Executivo abordar na “live”, transmitida pelas redes sociais na última quinta-feira. Mas, a participação da titular da Secretaria Nacional da Juventude tornara-se prioritária: Bolsonaro precisa melhorar a sua imagem entre os jovens. Com urgência. A “live” tornava-se um laboratório para a construção do discurso que será apresentado durante a campanha eleitoral.

É um desafio considerável. Até fevereiro, a quantidade de eleitores com 16 a 24 anos aptos a votar chegava a 19,3 milhões. Um número que ainda pode aumentar.

Novo escândalo na pasta da Educação prejudica estratégia
Especialistas, contudo, ainda analisam se neste ano haverá uma queda do interesse dessa parcela da população nas eleições devido ao aumento da intolerância e da radicalização. E a Justiça Eleitoral trabalha para evitar que o engajamento do eleitorado jovem neste ano seja um fiasco. Num cenário de tamanho acirramento, qualquer voto pode fazer a diferença no cômputo final.

Foi nesse contexto que Emilly Coelho, a secretária nacional da Juventude do Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, ganhou uns minutos no “horário nobre” da agenda presidencial.

Um feito de dar inveja na Esplanada dos Ministérios.

Às vésperas de expirar o prazo de desincompatibilização, há uma disputa silenciosa por qualquer brecha na agenda de Bolsonaro. Com direito a momentos explícitos de tensão pré-eleitoral: teve ministro pré-candidato reclamando que o colega da Economia havia ganhado demasiado destaque na cobertura da imprensa de uma solenidade promovida no Palácio do Planalto. O queixoso esqueceu-se, porém, que a cerimônia em questão havia sido concebida justamente para lançar medidas voltadas a impulsionar a economia. Difícil tirar o protagonismo de Paulo Guedes num caso como esse.

No início da mesma noite, o alvo do ciúme seria a secretária da Juventude.

Pré-candidata a deputada federal pelo PRTB da Paraíba, Emilly Coelho e Bolsonaro foram direto ao ponto que aflige milhões: “O desemprego dos jovens não é novidade para ninguém. Nós temos o dobro do percentual de desemprego entre os jovens quando a gente analisa a média nacional. Os jovens estão com o dobro de desemprego, principalmente pela dificuldade de entrar no primeiro emprego”.

Neste caso, entretanto, a resposta não parece ser das mais animadoras para quem tem uma pilha de boletos para pagar: a aposta do governo é promover o “instituto da aprendizagem” como forma de incentivar o primeiro emprego.

Segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), a taxa de desemprego entre os cidadãos de 16 a 24 anos margeou os 23% no quarto trimestre do ano passado – uma queda significativa em relação ao mesmo período do ano anterior, mas ainda assim um percentual intolerável.

Na sequência, fez-se questão de lembrar a importância do Auxílio Emergencial e do Auxílio Brasil durante a pandemia. E, então, Bolsonaro e sua convidada partiram para outro tema que deverá ganhar destaque durante a campanha: a renegociação das dívidas contraídas com o Fundo de Financiamento ao Estudante do Ensino Superior (Fies). Nas contas de Bolsonaro, 2 milhões de jovens podem ser beneficiados. A medida foi uma resposta ao aumento do índice de inadimplência do Fies durante a crise sanitária, e pode tirar muitas famílias dos cadastros de devedores. Ciente do potencial impacto eleitoral dessa iniciativa, a oposição acusa o governo de copiar uma ideia apresentada antes pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

Mas esta será apenas umas das frentes da guerra pelo voto dos jovens a ser travada entre Bolsonaro e a esquerda. Uma outra envolverá diretamente o movimento estudantil, tradicionalmente mais identificado com o PT e outros partidos que estarão na coligação liderada por Lula.

Na mesma “live”, Bolsonaro e a secretária falaram sobre a ID Jovem, documento de identidade disponível para os jovens de baixa renda incluídos no cadastro único de programas sociais do governo. “No governo anterior, teve 110 mil emissões de ID Jovem. No governo Bolsonaro, tem 2,66 milhões de carteirinhas emitidas”, disse ela, segundo quem o programa dá direito a meia-entrada em cinemas, shows, eventos esportivos e, também, gratuidade em passagens interestaduais de ônibus. Não se esconde que o objetivo é “quebrar o monopólio” das entidades que sempre emitiram a carteira do estudante e atacar uma das principais fontes de receita dessas instituições.

Nas eleições de 2018, da qual saiu vitorioso, Bolsonaro conseguiu equilibrar o jogo e atraiu uma parte considerável do eleitorado jovem. Com o passar dos anos, contudo, as pesquisas de intenção de voto passaram a sinalizar que este deveria ser um ponto de atenção de sua campanha à reeleição.

A última do Datafolha, por exemplo, apontou que Lula (PT) tem 26 pontos de vantagem em relação a Bolsonaro (PL) no cenário que inclui o ex-juiz Sergio Moro (Podemos), o ex-ministro Ciro Gomes (PDT) e o governador de São Paulo, João Doria (PSDB). Mas essa distância cresce para 37 pontos entre os mais jovens (54% a 17%).

Mais: a rejeição a Bolsonaro atinge 67% entre os mais jovens. Sem essa estratificação, no total 60% dos entrevistados disseram que não votariam de jeito nenhum no atual residente do Palácio da Alvorada. A pesquisa foi realizada entre 13 e 16 de dezembro do ano passado, com 3.666 entrevistas em 191 municípios. A margem de erro máxima foi de 2 pontos percentuais, para mais ou para menos.

Novas pesquisas devem ser divulgadas em breve, as quais poderão mostrar se a estratégia do governo está começando a dar certo. Não há dúvida, contudo, que o recente escândalo envolvendo o Ministério da Educação não ajudará em nada o Palácio do Planalto a melhorar sua imagem entre os maiores interessados nas políticas da pasta comandada por Milton Ribeiro.

Valor Econômico