Eternamente à direita, Ives Gandra apoia indulto de Bolsonaro
O indulto dado pelo presidente Jair Bolsonaro (PL) ao deputado Daniel Silveira (PTB-RJ) não possui nenhuma irregularidade e anula não apenas a prisão, como também cancela a multa e a inelegibilidade do parlamentar, penas aplicadas na condenação feita pelo STF (Supremo Tribunal Federal).
Essa é a avaliação do advogado Ives Gandra Martins, 87. Segundo ele, está na Constituição brasileira que o perdão é competência exclusiva do presidente.
“Ninguém pode contestar. Ele pode consultar outras pessoas para tomar a decisão, mas ele não é obrigado a consultar. É um poder absoluto que ele tem”, diz o advogado.
Gandra afirma que não existe nenhuma limitação prevista em lei, ou seja, o presidente pode dar o benefício a qualquer momento do ano. Para ele, “qualquer restrição que venha a ser dada ao direito de dar indulto é limitar o que a Constituição não limitou”.
O advogado relativiza o fato de o deputado Daniel Silveira ser um apoiador de Bolsonaro. Além de dizer que não existe nenhuma previsão legal sobre isso, o advogado cita o caso do ex-presidente Michel Temer (MDB), que deu indulto para condenados pela Lava Jato.
Existe alguma base jurídica para questionar o decreto do presidente Bolsonaro que deu indulto ao deputado Daniel Silveira? Do ponto de vista de direito constitucional não deveria caber nada. Segundo o artigo 84, inciso 12 [da Constituição], é competência exclusiva do presidente da República perdoar.
O indulto vem de uma tradição dos códigos mais antigos da humanidade. [Pôncio] Pilatos deu um indulto a pedido do povo para o Barrabás. Todos os monarcas tiveram isso. Nos EUA ainda existe até o segundo anterior à pena de morte ser indultado pelo presidente.
Na Constituição brasileira, está como competência exclusiva do presidente. Ninguém pode contestar. Ele pode consultar outras pessoas para tomar a decisão, mas ele não é obrigado a consultar. É um poder absoluto que ele tem.
Do ponto de vista do direito constitucional eu não vejo como. Do ponto de vista da realidade, qualquer pessoa, qualquer entidade pode entrar com qualquer motivo junto a Suprema Corte. Cabe ao Supremo decidir se mantém a jurisprudência anterior ou encontrar variantes para não aceitar [o indulto].
Se o Supremo encontrar variantes, que eu não sei quais seriam, para tentar derrubar [o indulto], a tensão entre os poderes irá continuar. A tensão vai atingir o processo eleitoral, e o Supremo terá que cada vez mais ser uma espécie de interventor.
Existe alguma restrição para a concessão do indulto? Ele pode ocorrer em qualquer período do ano? A Constituição não impõe nenhum limite. Não há necessidade de ser coletivo, pode ser individual. Não há necessidade de ser no Natal, pode ser em qualquer período. Não há necessidade do trânsito em julgado.
Não pode ter abuso de poder, tem que ser impessoal, atender à moralidade pública etc. Nada disso está na Constituição. Até porque todo condenado atingiu a moralidade pública com o crime que praticou.
O indulto é perdoar alguém que praticou um crime.
O indulto anula a inelegibilidade? Se eu perdoo a pena maior, automaticamente estou perdoando as penas menores. No caso do deputado Daniel Silveira, indultado em relação à pena maior que é a perda de liberdade, todas as demais deveriam cair.
E o fato de o indulto ter sido usado para perdoar um aliado declarado do próprio presidente, isso poderia se transformar em um argumento jurídico para anular o decreto? Eu acho que não. O presidente [Michel] Temer, ao dar a concessão do indulto para [condenados na] Lava Jato, estava dando o perdão para muitos amigos também, naquele momento. Alguns eram vinculados ao MDB [partido do ex-presidente Temer]. Temer foi presidente do partido, esteve no Congresso, na Vice-Presidência. Conhecia eles.
Mas isso não está na Constituição, “pode dar indulto, menos para amigos”. A Constituição apenas diz pode dar indulto. Sem nenhuma limitação. Não dizendo para quem, qual finalidade ou se pode beneficiar amigos.
Qualquer restrição que venha a ser dada ao direito de dar indulto é limitar o que a Constituição não limitou.
Qual sua visão sobre a decisão do STF que condenou o deputado Daniel Silveira? Eu desde o início contestei. O artigo 53 da Constituição declara que o parlamentar é inviolável por quaisquer palavras. Quaisquer não admite exceção.
É evidente que o deputado Daniel Silveira feriu o decoro parlamentar. O que ele disse, evidentemente, não era digno para nenhum parlamentar. Eu acho que ele deveria ser punido por falta de decoro parlamentar, mas o foro de competência não era o Supremo, era a Câmara dos Deputados.
Há uma comissão de ética dentro dos parlamentos para condenar. Um deputado não é [apenas] um deputado. Ele é um representante de 10, 50, 100 mil eleitores.
Eu tenho uma divergência, não sou acompanhado por grande parte dos juristas, mas entendo que quando foi revogada a Lei de Segurança, a revogação dela implicaria na eliminação da pena, aquele crime deixou de existir e a aplicação de uma nova lei não pode ser retroativa.
Na minha opinião, ele não poderia ser punido porque a lei anterior foi revogada e a nova não poderia ser retroativa. Não é uma posição pacífica, mas é a que eu sempre defendi. Tenho consciência que muitos pensam diferente desta minha interpretação.
Folha