TCU assiste de camarote licitação bolsonarista viciada

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Foto: Catarina Chaves/MEC

Com preços inflados, a licitação do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE) para a compra de quase 4 mil ônibus rurais escolares está marcada para a manhã desta terça-feira, 5, sob a mira do Tribunal de Contas da União (TCU).

O ministro Walton Alencar Rodrigues deve dar um despacho ainda nesta manhã, após o Ministério Público junto ao TCU solicitar a suspensão do pregão, pedido feito também por uma série de parlamentares.

Segundo fontes no TCU, Walton tenderia a determinar o embargo do resultado da concorrência até a análise do TCU sobre o processo. A área técnica entende que é necessário obter mais informações do FNDE.

Como o Estadão revelou, há risco de sobrepreço de até R$ 732 milhões na licitação, reconhecido pela área técnica do FNDE, pela Procuradoria Federal e pela Controladoria-Geral da União, mas isso não impediu que homens de confiança do ministro Ciro Nogueira e do presidente do PL, Valdemar Costa Neto, que comandam o fundo educacional, dessem sinal verde para a concorrência.

“O fato descrito é grave e envolve a possibilidade do desvio de assombrosa importância em dinheiro. Mais de R$ 730 milhões em prejuízo ao erário, que podem se converter além disso em prejuízo à democracia, a depender da destinação que esses recursos venham a ter, como, por exemplo, a composição do chamado ‘caixa 2 de campanha’”, escreveu o procurador Lucas Rocha Furtado na representação que protocolou ontem no Tribunal pedindo suspensão do pregão 2/2022 do FNDE.

Para a área técnica, a situação é grave, mas precisa de uma análise antes de decisão que impeça a realização do pregão. Por isso, a defesa foi por deixar a concorrência ser feita hoje, mas proibir temporariamente a homologação e o resultado até análise completa do TCU.

A Diretoria de Ações Educacionais do FNDE, comandada por Gharigam Amarante, um apadrinhado de Valdermar Costa Neto – presidente do PL, partido do presidente Jair Bolsonaro -, deu aval para a licitação em valores globais de R$ 2,045 bilhões, o que representa 55% a mais do que os valores considerados adequados por técnicos do FNDE, R$ 1,31 bilhão. O presidente do órgão é Marcelo Ponte, que antes de ser nomeado em 2020 para o cargo era chefe de gabinete no Senado do atual ministro da Casa Civil, Ciro Nogueira.

Como o Estadão mostrou, Ciro Nogueira se reuniu com Marcelo Ponte, no Palácio do Planalto, duas vezes antes da liberação do pregão, enquanto o procedimento esteve suspenso diante do risco de sobrepreço apontado pelas áreas técnicas terem apontado.

Em viagem ao Rio, nesta segunda-feira, Jair Bolsonaro tentou minimizar o caso, mas acabou admitindo que havia risco de sobrepreço, como revelou o Estadão. “Estão agora me acusando de ter armado a corrupção com compra superfaturada de ônibus, mas nem a licitação foi feita ainda. E quem descobriu fomos nós. Temos gente trabalhando em cada ministério com lupa no contrato. Por isso, não tem corrupção”, afirmou.

No documento em que pede a suspensão da compra dos ônibus escolares com preço inflado, o Ministério Público de Contas lembrou o recente escândalo de corrupção envolvendo pastores lobistas no Ministério da Educação, que, segundo prefeitos, teriam pedido propina, conforme revelou o Estadão.

“Se já não bastasse o escândalo do favorecimento, por afinidades políticas e pessoais, de lideranças religiosas que levou à demissão do ex-ministro Milton Ribeiro, o setor de educação do governo federal é agora novamente atingido por suspeitas de descalabros administrativos, se não também morais”, comentou o procurador Lucas Furtado.

O senador Alessandro Vieira (PSDB-SE), os deputados federais Tabata Amaral (PSB-SP) e Felipe Rigoni (União Brasil-ES) também solicitaram ao Tribunal de Contas da União (a suspensão, liminarmente, da licitação para a compra de ônibus escolares pelo FNDE, com valores suspeitos de superfaturamento, conforme revelou o Estadão.

Ao pedir a suspensão da licitação, o trio de parlamentares alerta para o “perigo em se permitir que recursos públicos sejam desviados ou utilizados em favor de agentes privados”. E pede que sejam determinadas ao presidente do FNDE, Marcelo Lopes da Ponte, e ao diretor Garigham Amarantes Pinto, as sanções cabíveis, “assim como a todos os envolvidos no caso”.

O senador Randolfe Rodrigues (REDE-AP) também pediu medidas para a anulação do pregão. “Ainda que haja possível redução dos preços estimados durante o transcorrer da fase de propostas e lances do Pregão Eletrônico, a estimativa viciada de valores a serem despendidos com a contratação em epígrafe já configura notória ilegalidade, pois o órgão público em questão admite pagar valores muito acima daqueles praticados no mercado”, afirmou. “A gravidade dos fatos e o montante dos valores envolvidos não tornam menos repugnante a forma como a presente contratação está sendo conduzida pelo FNDE”, disse.

O deputado Kim Kataguiri, do União Brasil-SP, também anunciou que entraria com pedido de suspensão do edital.

No sábado, o deputado Ivan Valente (PSOL-SP) havia protocolado pedidos no Ministério Público Federal do Distrito Federal e no Ministério Público junto ao Tribunal de Contas da União para suspender a licitação e abrir um procedimento para apurar a responsabilidade do presidente do FNDE, Marcelo Ponte, e do diretor da entidade, Garigham Amarante, no caso.

Estadão