Auxilio Brasil deixa de fora os mais pobres

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Foto: KEVIN DAVID/ESTADÃO CONTEÚDO

Seis meses após sua criação, o programa Auxílio Brasil deixou de fora da lista de beneficiários de março ao menos 2 milhões de famílias em extrema pobreza. Segundo o Cadastro Único, do governo federal, das 17.820.667 famílias registradas como extremamente pobres no país em março, 1.995.898 não receberam o benefício. Os números de abril ainda não estão disponíveis.

Os dados foram obtidos pela coluna no sistema Cecad (Consulta, Seleção e Extração de Informações do CadÚnico), do Ministério da Cidadania, que coordena o programa. Famílias em extrema pobreza são aquelas com renda per capita (por pessoa) de até R$ 105 por mês. O número de famílias nesse estrato social à espera do benefício teve crescimento de 15% em março, em relação a fevereiro, quando eram 1.735.253 na miséria sem auxílio. Das famílias fora da lista de beneficiários, mais de 85% estão nas regiões Norte, Nordeste ou Sudeste do país.

Familias fora do auxilio Brasil -  -

O CadÚnico, como também é conhecido o Cadastro Único, é o banco de dados utilizado pelo governo para saber a renda e incluir ou retirar famílias em programas sociais, como o Auxílio Brasil.

O programa substituiu o Bolsa Família, criado em 2003. Segundo a lei aprovada no Congresso e sancionada pelo presidente Jair Bolsonaro em 30 de dezembro de 2021, o Auxílio Brasil deve atender:

Famílias em situação de extrema pobreza;

Famílias em situação de pobreza (renda per capita entre R$ 105,01 e R$ 210) que possuam gestantes, nutrizes ou pessoas com idade até 21 anos que tiverem concluído a educação básica ou estejam matriculadas.

Ou seja, no caso das famílias em extrema pobreza, todas deveriam estar incluídas no programa, mas 11% delas estão fora.

Não há obrigação legal de incluir todas as famílias, já que, entre os vetos presidenciais ao projeto aprovado no Congresso, estava o do artigo que obrigava o programa a ter “dotação orçamentária suficiente” para atender todos os possíveis beneficiários.

A justificativa para o veto foi que “a proposição contraria o interesse público, pois a vinculação de atendimento de todas as famílias elegíveis acarretaria em ampliação das despesas”.

Já entre famílias em situação de pobreza, ainda de acordo com o Cecad, havia 1.210.277 delas fora do benefício em março. No caso, o sistema não especifica quantas dessas famílias são elegíveis e teriam direito ao benefício.

Ao todo, no CadÚnico, havia em março:

17.820.667 famílias em extrema pobreza;

3.034.988 famílias em situação de pobreza; 6.597.543 famílias de baixa renda (R$ 210,01 até meio salário mínimo);

6.791.223 famílias acima de meio salário mínimo;

Total: 34.244.421 famílias

No mês de março, o governo pagou 18 milhões de benefícios do auxílio. Neste mês, o pagamento —que está em andamento— inclui 18,1 milhões de famílias, ou seja, não houve alta capaz de absorver o público que precisava do auxílio em março.

Desde fevereiro, o número de benefícios pagos está praticamente congelado.

Em março, o UOL encontrou famílias em situação de extrema pobreza sem receber o auxílio em uma favela de Maceió. Elas contaram que, ou se inscreveram no CadÚnico após o fim do Auxílio Emergencial, ou tiveram os benefícios cortados.

Desde outubro, quando o Auxílio Emergencial acabou, o número de famílias em situação de extrema pobreza cadastradas no CadÚnico saltou em 2,6 milhões de famílias.

Parte desse aumento, porém, pode ser explicado porque, no mesmo período, houve um aumento na faixa de renda classificada como extrema pobreza (que antes era de até R$ 89 por mês), o que mudou muitas famílias de status nos grupos estabelecidos.

O governo ampliou, desde dezembro, o valor pago às famílias, com uma complementação extraordinária, criada via MP (Medida Provisória). Com isso, o pagamento mínimo ficou em R$ 400. No último dia 4, o Senado aprovou o valor mínimo em definitivo.

Para pagar o valor ao conjunto de famílias necessitadas, o governo vai precisar fazer um ajuste no orçamento e tirar verbas de outras áreas, segundo analistas consultados pelo UOL.

A coluna fez contato com o Ministério da Cidadania, questionando se havia previsão para incluir as famílias em extrema miséria, mas não houve retorno.

Em entrevista ao UOL na última segunda-feira, o ex-ministro da Cidadania João Roma foi questionado sobre o número de famílias fora do auxílio e disse que o número de pedidos alterna mês a mês.

“As famílias são incluídas automaticamente, basta estarem nas condicionantes. Nós conseguimos zerar, mas é uma fila dinâmica. Tem gente que se cadastrou em fevereiro e em março já recebeu”, disse.

Sobre o aumento de pessoas em situação de extrema pobreza, ele afirma que a pandemia foi a maior vilã da economia. “O que ocorre é que passamos pela maior crise após a Segunda Guerra Mundial, e o mundo inteiro está amargando essas consequências, inclusive com processos inflacionários e alguns países com desabastecimento.”

Ele ainda disse que uma das vantagens do Auxílio Brasil, em comparação ao Bolsa Família, é que o programa não avalia apenas a renda de cada pessoa, “mas sim, a condição social dessas famílias”.

“Conseguimos avançar [em número de beneficiários]. O que estamos abordando é interligando programas sociais para que a gente possa, com a questão do mérito, propiciar às famílias consigam superar a situação de pobreza. Para isso precisamos usar várias políticas públicas”, explica.

Uol