Brasil aparece em posição vexatória no ranking de liberdade de imprensa
O “caos da informação” e a desinformação alimentam as tensões internacionais e as divisões na sociedade, alerta a organização Repórteres Sem Fronteiras (RSF) na edição 2022 do seu ranking mundial da liberdade de imprensa.
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No total, 73% dos 180 países avaliados a cada ano pela ONG são caracterizados por situações consideradas “muito graves”, “difíceis” ou “problemáticas” no que diz respeito à liberdade dos jornalistas ao desempenhar seu trabalho.
A proporção é idêntica à do ano passado, mas o número de países onde a situação é “muito grave” passou de 21 para um recorde de 28, incluindo quatro da América Latina — Cuba, Nicarágua, Honduras e Venezuela — ao lado de nações como Rússia, Coreia do Norte, Irã ou Síria.
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De acordo com o relatório, “a desconfiança na imprensa, alimentada pela retórica antimídia e pela banalização dos discursos estigmatizantes dos políticos ganhou mais espaço”, especialmente em Brasil (110º), Cuba (173º), Venezuela (159º), Nicarágua (160º) e El Salvador (112º).
Entre os países com situação “problemática” estão Brasil, Equador (68º) e Chile (82º). No ranking do ano passado, o Brasil havia ficado na 111ª posição entre os 180 países analisados.
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O relatório da RSF deste ano indica que “o trabalho da imprensa brasileira tornou-se especialmente complexo desde que Jair Bolsonaro assumiu o poder, em 2018. O presidente ataca regularmente a imprensa, mobilizando exércitos de apoiadores nas redes sociais. Trata-se de uma estratégia bem coordenada de ataques com o objetivo de desacreditar a mídia, apresentada como inimiga do Estado”.
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Na América Latina, em geral, a RSF lamenta que os jornalistas trabalhem em um ambiente “cada vez mais venenoso e tóxico”.”A criação de um arsenal midiático em alguns regimes autoritários priva os cidadãos de seu direito à informação e contribui para um aumento das tensões internacionais que podem levar às piores guerras”, afirma o secretário-geral da RSF, Christophe Deloire, no relatório.
“Os ataques públicos, cada vez mais visíveis e virulentos, minam a profissão e incentivam processos judiciais abusivos, campanhas de difamação e intimidação — especialmente contra as mulheres — e assédio on-line a jornalistas críticos”, completa a organização.
A Noruega mantém a liderança da liberdade de imprensa pelo sexto ano consecutivo, seguida por Dinamarca e Suécia. Os últimos países na lista são China, Mianmar, Turcomenistão, Irã, Eritreia e Coreia do Norte.
Assédio on-line
A Nicarágua, sob o governo de Daniel Ortega, registrou a queda mais expressiva da região (-39 postos), indicou a RSF, que também considera “preocupante” a situação em El Salvador com a “guinada autoritária” do presidente Nayib Bukele.
A ONG também considera “difícil” a situação da liberdade de imprensa em El Salvador, Guatemala (124º), Bolívia (126º) e México (127º).
Com pelo menos sete jornalistas assassinados em 2021, o México permanece como o país mais violento do mundo para a imprensa e ocupa a posição 179 de 180 na classificação de segurança.
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Sobre a Rússia, que ficou em 155º lugar, a RSF aponta que a invasão da Ucrânia foi preparada por uma “guerra de propaganda”.
Apenas oito países — incluindo Portugal e Costa Rica — apresentam uma “boa situação”, contra 12, em 2021, que obtiveram essa classificação.
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A RSF destaca uma “polarização de dois níveis”, entre países e dentro destes, estimulada pelo “aumento da força dos circuitos de desinformação” nas sociedades democráticas e pelo “controle dos meios de comunicação nos regimes autoritários.
A China (175º) “utiliza seu arsenal legislativo para confinar sua população e isolá-la do resto do mundo, especialmente em Hong Kong”, que registrou forte queda na lista de liberdade de imprensa, ao passar do 80º para o 148º lugar na classificação, ao aplicar uma lei “draconiana” de segurança para silenciar os meios de comunicação críticos e deter os jornalistas.
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— É a queda mais expressiva do ano, mas é totalmente merecida pelos constantes ataques à liberdade de imprensa e o lento desaparecimento do Estado de Direito em Hong Kong — declarou à AFP Cedric Alviani, diretor da RSF para o Leste da Ásia.
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A RSF explica que as sociedades democráticas estão divididas devido à ascensão dos meios de opinião “baseados no modelo da Fox News”, o canal preferido dos conservadores nos Estados Unidos, e a “ampliação dos circuitos de desinformação, amplificados pela forma como funcionam as redes sociais “.
A RSF utilizou um novo método para elaborar a classificação, com base em cinco indicadores (contexto político, marco legislativo, contexto econômico, contexto sociocultural e segurança).
Globo