Simples e autêntico, vestido de noiva de Janja homenageia cultura nacional

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Não é só o “vestido da Janja”. Riscado, desenhado e confeccionado pelas bordadeiras do semiárido do Seridó, a peça famosa com a noiva de Lula foi criada à base de pontos rústico, cheio, meio matiz, grilhão, arroz, haste e diversos tipos de rechilieu, como quebra-espinho, casa de abelha e palhinha. Também usada técnica de sombreado.

O tecido escolhido pela socióloga foi o organza de seda.

E tudo feito à mão, de forma artesanal, na velha máquina de costura, a “Singer da vovó”. Mas que costura traços que o maquinário industrial não alcança.

Na foto acima (da esquerda para direita) estão as bordadeiras, com partes do vestido da noiva. Em pé: Alcilene Medeiros, Acileide Cavalcante, Aline dos Santos e Djeane Santos; e, sentadas, Valdineide Alves dos Santos e Iranilda Batista.

A encomenda de Janja foi feita em janeiro e mobilizou essa equipe de seis bordadeiras de Timbaúba dos Batistas, uma cidade de 2.500 habitantes distante 300 quilômetros de Natal (RN). Fica na região do semiárido do Seridó, colada em Caicó, a maior da localidade.

O contato de Janja foi com a estilista Helô Rocha, do Rio Grande do Norte e que conhece e trabalha com as bordadeiras há alguns anos. Ela produz peças personalizadas e tem seu ateliê em São Paulo, onde vive. As duas foram apresentadas pela amiga comum Bela Gil.

O resultado de cada etapa da criação e confecção era submetido a Janja, que escolheu o tema “Luar do sertão”, uma sugestão da também estilista Camila Pedrosa, que trabalha com Helô.

“Janja nos contou sobre a ligação dos noivos com a lua cheia, que era muito simbólica para o casal. Juntando o bordado do sertão, o presidente Lula sendo do sertão, minha sócia Camila sugeriu de fazermos o Luar do Sertão como tema pro bordado de vestido. A Janja amou a ideia e virou a identidade visual da celebração”, disse Helô Rocha.

“Luar do Sertão” é o nome também da canção sertaneja composta por João Pernambuco (melodia) e Catulo da Paixão Cearense (letra). E reverberada numa gravação de Luiz Gonzaga, entre tantas.

Voltando para o sertão, o riscado ficou por conta da bordadeira Valdineide Dantas dos Santos, a “Patinha”, uma craque do desenho. Elas traçaram as fases da lua, o céu estrelado, a fauna e a flora do Nordeste e a coroa de frade, que é aquele cacto da caatinga, arredondado e pequeno.

“A gente vive basicamente disso daqui. Somos artesãs. Cada vestido de noiva que a gente faz, ah menino, vai ficar show esse vestido”, conta Valdineide.

Janja, mulher de Lula

Após o desenho aprovado pela noiva, as peças são bordadas. É a técnica que chamam de “rechilieu”, que é cobrir o desenho feito à mão sobre o tecido, com o bordado da máquina das artesãs, as bordadeiras.

A confecção do vestido de Janja levou quatro meses para ser concluída. Foram muitas etapas e muitos detalhes. Dois meses e meio só a etapa de bordar.

“Pensamos num modelagem relativamente simples, que valorizasse a Janja e que fosse confortável. Ela pediu para ter mangas. A partir daí, fizemos uma primeira base num tecido de algodão e provamos nela uns 10 dias depois da primeira conversa. Fizemos umas duas provas nessa base, em São Paulo. Depois de acertada a modelagem, cortamos o vestido na organza de seda e mandamos para Timbaúba riscar e bordar em cima de cada pedaço da modelagem”, detalha Helô.

Quando as peças deixaram o Seridó e voltaram para a capital paulista, foram feitas duas provas com Janja para finalizar. Depois, o vestido foi para o bordador de pedrarias finalizar com pontos de luz.

“O vestido é em organza de seda, a base do corset é bordada e pespontada, um tipo de matelassê delicado, e a saia em arcos formando nesgas, que é uma característica forte do nosso trabalho”, diz a estilista.

Mas e o preço desse vestido? Salmira Torres, que é secretária de Cultura, Esportes, Lazer, Turismo e Desenvolvimento Econômico de Timbaúba dos Batistas, e que ajudou a coordenar o trabalho da confecção da peça de Janja, dá alguma dica.

“Saiu muita coisa na imprensa, mas menos de R$ 200 mil não sai, não”, disse Salmira.

As estilistas Helô e Camila nada cobraram de Janja. A parte delas foi como presente. Mas a noiva pagou o custo do vestido, a mão de obra e os tecidos.

Salmira conta que o trabalho das bordadeiras passa de geração para geração na cidade. Ela relata que Timbaúba chegou a ter 800 bordadeiras. Ou seja, um terço dos habitantes trabalhava com esse ofício. Acredita que hoje passe de 300, mas não garante que chegue ao contingente antigo.

“Foi um trabalho que se aperfeiçoou com o tempo. As bordadeiras trabalham em casa e conseguem conciliar com as suas tarefas pessoais”, disse.

O prefeito Ivanildo Filho, do PL, diz que o artesanato, em especial o trabalho das bordadeiras, é a principal atividade econômica da cidade. Ele, que está no seu terceiro mandato como prefeito, conta com orgulho que conseguiu, junto ao estado, reduzir de 17% para 1% a alíquota de ICMS para os lojistas que comprassem esses produtos.

O trabalho do artesanato gera renda entre um e dois salários mínimos para as artesãs.

Janja não foi a única “famosa” a vestir as peças das bordadeiras. Na relação, tem Bruna Marquezine, Isis Valverde (também vestido de noiva), Tatá Werneck, Sabrina Sato e Sasha Meneghel.

Como acessar a Casa das Bordadeiras e comprar

No seu Instagram, a Casa das Bordadeiras anuncia seus produtos e passa os contatos para os interessados em fazer um vestido de noiva ou adquirir peças de cama, mesa e banho.

Na propaganda, a cidade se apresenta como a “Capital Mundial do Bordado em Cama, Mesa, Banho, Recém nascidos, Redes e em geral”.

Ainda oferecem toalhas de banho, pano de prato, almofadas, jogo americano e kit de banheiro. Além dos vestidos de noiva.

O endereço é instagram.com/casadasbordadeiras/

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