Ribeiro foi alertado sobre corrupção no MEC

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Foto: Igo Estrela/Metrópoles

O relatório da Controladoria-Geral da União (CGU) sobre supostas irregularidades na gestão de Milton Ribeiro à frente do Ministério da Educação (MEC) revela que assessores do ex-ministro pediram demissão após o então chefe da pasta decidir manter os pastores Arilton Moura e Gilmar Santos envolvidos em atividades do gabinete.

Segundo informações do documento ao qual a CNN teve acesso, funcionários de Ribeiro fizeram um “desabafo” sobre a “insistência” dele em manter o vínculo com Santos e Moura após vários alertas de que a proximidade com os reverendos poderia representar “um perigo” para a atuação do ministro e do MEC.

Apesar das supostas recomendações, a apuração do relatório, publicado em 23 de maio, aponta que Ribeiro teria decidido por manter a proximidade com os pastores.

O relatório da CGU foi usado como base para a execução da Operação Acesso Pago, que investiga o ex-ministro da Educação Milton Ribeiro e reverendos Arilton Moura e Gilmar Santos, acusados de integrarem esquema de corrupção no MEC.

Albério Júnio Rodrigues de Lima, então assessor do gabinete de Ribeiro, é um dos funcionários do MEC que prestou depoimento. Segundo o relato ao órgão, ele seria o responsável por atender os pastores no gabinete desde que assumiu o cargo, no final de 2020.

“Desde então, passou a alertar o ministro quanto ao comportamento ‘estranho’ da dupla e a frequência inusual e desarrazoada com que compareciam àquela repartição pública”, afirma o documento da CGU. De acordo com que Lima disse à investigação, Arilton “vivia” no ministério e chegava a dificultar o trabalho dos servidores da pasta.

Ele afirmou que “nenhuma outra pessoa ou autoridade esteve naquelas dependências com a frequência do pastor Arilton”.

O relato foi confirmado por outros funcionários, entre eles Marcelo Mendonça, chefe da assessoria para assuntos parlamentares, e Mychelle Rodrigues de Souza Braga, chefe da assessoria de agenda do gabinete do ministro.

Mychelle relatou, ainda, que Ribeiro concedeu aos pastores a prerrogativa de atuarem de modo semelhante aos parlamentares, solicitando agendas do ministro com prefeitos em diversas localidades do país. Segundo os então assessores, a atuação dos reverendos como porta-vozes do MEC era endossada pelo ministro.

O documento refuta, ainda, a veracidade de uma declaração concedida por Ribeiro em março, à CNN. Na ocasião, o ex-ministro afirmou ter sido orientado pela própria CGU a seguir recebendo os pastores para que eles não desconfiassem de uma investigação em curso aberta pelo órgão.

Apesar de Ribeiro defender que interrompeu o contato com os reverendos, um depósito suspeito de 60 mil em nome de Arilton Moura na conta do ex-titular pode ser um indício contrário.

A venda do veículo que envolveu uma transação de R$ 60 mil entre Myrian Pinheiro Ribeiro, esposa do ex-ministro, e a filha do pastor Victoria Camacy Bartolomeu, foi citada como uma das provas do relacionamento entre Ribeiro e Arilton. A movimentação financeira também foi determinante para os pedidos de quebra de sigilo bancário dos envolvidos na operação da Polícia Federal.

“Infere-se, portanto, que após a denúncia formalizada em agosto de 2021, não houve qualquer alteração efetiva no relacionamento de Milton Ribeiro com o pastor Arilton Moura”, diz o documento.

Segundo o órgão, “não houve qualquer preocupação por parte do ministro com a imagem do MEC na manutenção (e, de certo modo, intensificação) dessa proximidade com a dupla de reverendos”.

O relatório destaca um caso específico, quando o MEC recebeu uma ligação de uma pessoa para falar com um “assessor chamado Arilton Moura”. O contato seria referente à promessa de construção de uma escola em uma região do Entorno do Distrito Federal.

Após o episódio, os assessores chegaram a sugerir que o ministro “restringisse o acesso dessa pessoa ao MEC ou até mesmo deixasse de recebê-la”.

Questionados sobre quais foram as medidas adotadas por Ribeiro após o alerta, todos disseram que, em princípio, o pastor Arilton deixou de comparecer ao gabinete. Contudo, pouco tempo depois, passou a ser recebido em casa pelo ministro. Cerca de dois meses após o ocorrido, os reverendos estavam de volta ao MEC.

Albério Júnio Rodrigues de Lima e Juliana Gonçalves Melo, também assessora do gabinete do ministro à época, disseram à CGU que o fato contribuiu para formalizassem um pedido de demissão.

O caso, que ocorreu em maio de 2021, também foi levado à Assessoria Especial de Controle Externo da pasta, que sugeriu que o ministro suspendesse “toda e qualquer” interlocução com o pastor Arilton. Também foi recomendada a avaliação da exoneração de pessoas do MEC que estivessem ocupando funções que tenham sido indicadas pelo pastor.

A orientação dizia respeito a Luciano de Freitas Musse, gerente de projeto na secretaria-executiva da pasta, indicado por Arilton, que permaneceu no cargo até que o esquema do “gabinete paralelo” se tornasse público. O relatório diz que a nomeação de Musse “corrobora as evidências” da “capacidade de influência dos pastores na pasta durante a gestão de Milton Ribeiro”.

No depoimento à CGU, o então secretário-executivo e agora ministro Victor Godoy Veiga disse que, apesar da nomeação de Musse, a real intenção de Milton Ribeiro era de acomodar o próprio pastor Arilton no MEC. Sem vagas no gabinete, o então secretário-executivo teria disponibilizado um cargo nível DAS 3 para a finalidade.

O pastor, no entanto, teria se mostrado insatisfeito com o salário referente ao cargo, algo em torno de R$ 5.685,55 segundo a tabela de remuneração do governo. A pedido do ministro, foi iniciado em 17 de novembro de 2020 um processo para que Arilton passasse a trabalhar no MEC. A Casa Civil, no entanto, barrou a nomeação.

No dia 7 de abril de 2021, por determinação do ministro, Luciano de Freitas Musse foi nomeado para o cargo de gerente de projeto, na Secretaria-Executiva do MEC, com salário maior: R$ 10.373,30. A CGU relata que ele nunca desempenhou a função, e foi enviado à Assessoria Especial de Controle Externo.

Pouco tempo depois, no entanto, Victor Godoy relatou que o desempenho do indicado de Arilton não era satisfatório na área de controle interno e o colocou à disposição do ministro para desempenhar outra função. Ele foi exonerado em março, quando Godoy assumiu a pasta.

Em nota enviada ao Metrópoles, a defesa de Milton Ribeiro afirma que “quando o ministro tomou conhecimento de denúncias envolvendo terceiros, com quem encontrou pouquíssimas vezes, imediatamente comunicou o fato à CGU, requisitando pronta investigação e acionamento da Procuradoria da República”.

Também assinala que “o próprio parecer da CGU é uniforme neste sentido não indicando qualquer ação e ou omissão do ministro”. Sobre a venda do automóvel, “apenas o depósito de valor que se refere à venda do veículo, como documentado, implementando que no inquérito policial não há uma única testemunha e ou elemento indicando que o ex-ministro atuado para beneficiar algum município cidade ou mesmo a alguém que tenha se beneficiado”.

O ex-ministro Milton Ribeiro foi preso em 22 de junho sob a acusação de tráfico de influência no ministério que ele chefiava. Na ocasião, também acabaram detidos os pastores Gilmar Santos e Arilton Moura – ambos acusados de integrarem organização criminosa para destravar, por meio de propina, demandas estaduais e municipais do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE).

No curso das investigações, a PF e o MPF interceptaram esta conversa de Milton Ribeiro e a filha. O teor do diálogo levou os procuradores a pedirem envio de parte da investigação ao Supremo, conforme revelou o colunista Rodrigo Rangel, do Metrópoles, nesta sexta, por envolver autoridade – Bolsonaro – com direito a foro privilegiado.

Leia a nota da defesa de Milton Ribeiro na íntegra:

A defesa do Ex-Ministro Milton Ribeiro REAFIRMA que seu cliente não cometeu qualquer ilicitude, independentemente da esfera de apuração. O Ministro Milton Ribeiro sempre pautou sua vida, privada e pública, pela ética, honestidade e retidão e jamais cometeu qualquer desvio e ou infração penal dentro e ou fora do exercício do cargo público que ocupou.

Como se explicou, a referência feita nos áudios é comumente utilizada para enaltecer a pessoa que ajuda a organizar eventos visando fomentar a educação e os projetos, contudo, isso não se significa que exerceu ou exercia qualquer cargo oficial e ou oficioso junto ao Ministério, ou teria algum tipo de facilidade ou prioridade.

Quem conhece um pouco o funcionamento do Ministério da Educação sabe que o Ministro e nem ninguém tinha e ou tem poder para favorecer pessoas, cidades ou Estados porque há todo um procedimento formal que regula o andamento e avaliação dos benefícios pretendidos. Inclusive, aperfeiçoado na gestão exercida pelo Ministro Milton Ribeiro. Grife-se que há a absoluta necessidade de atendimento aos critérios estabelecidos e o preenchimento dos requisitos para a obtenção de deferimento do pretendido.

Ressalte-se que quando o Ministro tomou conhecimento de denúncias envolvendo terceiros, com quem encontrou pouquíssimas vezes, imediatamente comunicou o fato à CGU, requisitando pronta investigação e acionamento da Procuradoria da República.

Aliás, o próprio parecer da CGU é uniforme neste sentido não indicando qualquer ação e ou omissão do Ministro, apenas o depósito de valor que se refere à venda do veículo, como documentado, implementando que no Inquérito Policial não há uma única testemunha e ou elemento indicando que o Ex-Ministro atuado para beneficiar algum Município, cidade ou mesmo a alguém que tenha se beneficiado.

A defesa, ainda, ressalta que juntará nos autos do Inquérito todos os documentos evidenciando a lisura da venda do mencionado veículo.

E, ainda, aguardará o desfecho das investigações e sua condução, sem abusos ou arbitrariedades, esperando o seu arquivamento, que se dará pelo reconhecimento da inexistência de justa causa para guindá-lo à condição de suspeito.

Metrópoles