Bolsonaro conseguiu aumentar o apoio ao aborto no Brasil

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Foto: Pedro Ladeira/Folhapress

Enquanto o presidente da República Jair Bolsonaro (PL) chama de inadmissível o aborto feito em uma criança vítima de estupro e o governo federal tenta investigar os médicos que interromperam a gestação de maneira legal, a maior parte dos brasileiros tem opinião contrária: 83% da população apoia o direito ao aborto em casos de estupro —como aconteceu recentemente com essa menina de 11 anos, em Santa Catarina, e com outra da mesma idade, que teria sido estuprada pelo padrasto, no Rio de Janeiro.

Segundo pesquisa da ONG Católicas Pelo Direito de Decidir em parceria com o Instituto Ipsos divulgada com exclusividade a Universa, 67% dos brasileiros são favoráveis à interrupção da gestação em situações específicas —a pesquisa ouviu mil pessoas em todas as regiões do Brasil, entre março e abril deste ano, e tem margem de erro de 3%, com nível de confiança de 95%.

O estudo mostrou, ainda, que o número de brasileiros que defendem que o aborto deve ser legalizado em qualquer circunstância ultrapassa o de brasileiros que acreditam que a prática deve ser 100% proibida, inclusive nos casos já previstos em lei (19% e 14% respectivamente).

Embora os que defendam que o aborto deve ser totalmente legalizado representem menos de um quinto dos brasileiros, 85% acreditam que, se a prática deixar de ser criminalizada, “menos mulheres morreriam por abortos clandestinos” e quase 75% rejeitam que uma mulher seja presa por fazer um aborto.

Os números da “Pesquisa de Opinião sobre Religião, Aborto, Política e Sexualidade no Brasil” corroboram com outra pesquisa recente, feita pelos institutos Locomotiva e Patrícia Galvão, que também aponta que a maioria da população brasileira é favorável ao direito ao aborto.

Mas, afinal, se a maioria concorda que mulheres devem ter direito a interromper a gestação pelo menos nos três casos previstos em lei —em decorrência de estupro, quando oferece risco à vida da mulher ou em caso de anencefalia— por que esse tema ainda é considerado polêmico?

Para a pesquisadora Gisele Pereira, uma das responsáveis pelo estudo, há um “descompasso” entre o que as lideranças políticas acreditam que a população pensa e o que a população de fato pensa sobre aborto.

“É um equívoco muito grande continuar colocando a questão do aborto no lugar da polêmica, como se fosse um assunto tabu, intocável. Essa é uma estratégia política do conservadorismo, a quem interessa o controle dos corpos e das vidas das mulheres e pessoas que gestam”, fala.

A pesquisa das Católicas também considerou o papel da religião quando o assunto é a interrupção voluntária da gravidez —e mostrou que nem sempre é a fé que define a percepção dos brasileiros sobre o assunto.

Mais de oito em cada 10 católicos brasileiros acreditam que uma mulher que fez um aborto pode ser uma boa praticante de sua fé independentemente de ter interrompido a gestação.

Além disso, mais da metade dos brasileiros (51%) concorda que um profissional de saúde que tenha fé religiosa deve realizar um aborto, independentemente de suas crenças —hoje, a chamada objeção de consciência é utilizada por muitos profissionais da saúde como justificativa para não atender ocorrências de aborto em casos previstos em lei, explica a pesquisadora.

“Questões como o aborto e a sexualidade não encontram consenso entre pessoas que exercem alguma fé, principalmente entre católicos”, afirma Gisele Pereira. “No caso da Igreja Católica, os fiéis têm diferentes pensamentos sobre os direitos sexuais e reprodutivos; nem todos fazem coro ao discurso conservador cristão, proferido, por exemplo, pelo governo Bolsonaro e seus apoiadores.”

Uol