Bolsonaro reconhece que perderá para Lula

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Fotos: Ricardo Stuckert e Alan Santos/PR

Pesquisadores que estudam o bolsonarismo avaliam que a insistência de Jair Bolsonaro pelo confronto com Judiciário, a campanha de difamação contra o sistema eleitoral e a convocatória para manifestações no 7 de setembro são reflexos de uma avaliação derrotista do presidente.

Em segundo nas pesquisas e com taxa de rejeição acima de 50%, Bolsonaro, pela lógica eleitoral, deveria estar sinalizando a eleitores moderados que não têm simpatia pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, mas relutam em apoiá-lo. Ao optar pela radicalização, porém, ele parece indicar que desistiu de ampliar sua base e aposta só na fidelização dos adeptos incondicionais.

No domingo, na convenção do PL que confirmou sua candidatura à reeleição, Bolsonaro voltou a atacar os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) ao dizer que “esses poucos surdos de capa preta têm que entender o que é a voz do povo”. Clamou por “eleições limpas” e, em mensagem ambígua, convocou para que “todo mundo no 7 de setembro vá às ruas pela última vez”.

As manifestações ocorreram poucos dias após Bolsonaro ter chamado embaixadores no Palácio do Alvorada para fazer ataques nominais a ministros do STF, levantar suspeitas sobre a urna eletrônica e repetir, sem apresentar provas, que houve fraudes nas eleições de 2014 e 2018.

“Quando a pandemia começou a arrefecer, muita gente ficou com a impressão que Bolsonaro iria moderar. Agora ele discursa em tons até mais graves do que fazia em 2018. Esse caminho tem limites do ponto de vista do potencial eleitoral. Quanto mais radical ele se apresenta, mais ele aliena a parcela do eleitorado que deveria estar preocupado em conquistar”, diz o cientista político Guilherme Casarões.

“Ele não irá admitir, mas acho que já percebeu intimamente que pode perder a eleição. Então a estratégia mais interessante passa a ser garantir a fidelização da base que já possui”, completa.

O objetivo, na avaliação de casarões, seria promover algum tipo de bagunça no momento da eleição para então tentar tirar proveito disso. “Se conseguir postergar o processo eleitoral, ele tem um ganho. Também pode ensaiar um autogolpe. E mesmo dando tudo errado, pode ter vantagens. Ele teme ir preso. Não é um cenário descartável. Então ao demonstrar que há uma parcela grande do povo ao seu lado, terá condições melhores de negociar a própria anistia.”

Autor do recém-lançado “Democracia na periferia capitalista”, o cientista político Luis Felipe Miguel faz avaliação parecida.

“Não há dúvida de que Bolsonaro está criando as condições para contestar os resultados da eleição. O que há no horizonte é a perspectiva de derrota eleitoral. A questão, portanto, não é se ele vai contestar o resultado, mas como. Poderá ter mais ou menos empenho nisso. Vai ficar só na retórica? Ou vai ter uma tentativa efetiva de virada de mesa?”

Para Miguel, o discurso do presidente não é o de quem está prestes a entrar numa campanha para angariar votos. “É discurso de quem está se preparando para o confronto”, diz. “Ele acena para essa base, que ele formou e armou, com a ideia de uma batalha épica. Então mesmo perdendo a eleição, consegue manter acesa a chama do bolsonarismo. É um recurso de intimidação, ele poderá continuar jogando com um certo sentimento de ameaça no ar. É importante notar que isso funciona para ele. Porque as respostas das instituições a Bolsonaro nunca foram a altura da gravidade das coisas que ele faz.”

O cientista político José Álvaro Moisés afirma que não conhece precedente de nada parecido na história do Brasil. Segundo ele, Bolsonaro dá sinais de que está consciente da derrota desde a reunião com embaixadores.

A convocação de atos no 7 de setembro “pela última vez” pode sinalizar intenção golpista ou resignação. O pesquisador avalia que a segunda opção é a mais provável: “Ele sabe que não será mais presidente em 2023. Então arma um cenário de resistência às decisões democráticas”.

Valor Econômico