Datafolha mostra que Bolsonaro não tem como se reeleger

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Foto: Ricardo Stuckert e Isac Nóbrega/PR

Levantamentos feitos por diferentes institutos de pesquisa são unânimes em apontar o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) à frente do presidente Jair Bolsonaro (PL) na disputa pelo Planalto. Em média, Lula aparece com uma vantagem de cerca de seis pontos percentuais à frente de Bolsonaro nas pesquisas presenciais em relação às realizadas por telefone.

Mas a diferença entre os dois varia a depender da sondagem. Uma das explicações para isso é justamente o modo como as pesquisas são feitas —por telefone ou presencialmente—, segundo especialistas ouvidos pelo UOL.

Sondagens divulgadas neste mês mostram as diferenças nos resultados obtidos. Para além da data em que foram realizadas —algo que também pode interferir nos números—, a forma de acessar as pessoas que participarão de uma pesquisa tem impacto nos resultados.

Pesquisa Genial/Quaest, divulgada no dia 6 e feita face a face, mostrou que Lula tem 45% das intenções de voto contra 31% de Bolsonaro, uma distância de 14 pontos percentuais. Já a pesquisa Datafolha de ontem (28), também feita de forma presencial, apontou Lula 18 pontos percentuais à frente de Bolsonaro (47% a 29%).

Pesquisa Exame/Ideia divulgada no último dia 21, realizada por telefone, apontou o petista com 44% e o atual presidente com 33%, 11 pontos percentuais de distância. Já o levantamento XP/Ipespe, publicado na última segunda-feira (25) e também feito por telefone, apontou o petista com 44% e Bolsonaro com 35%, diferença de 9 pontos percentuais.

Não há, no entanto, um consenso entre especialistas sobre a melhor forma de realizar uma abordagem. “Dependendo da região [do Brasil] que está sendo analisada, uma é melhor que a outra. Ou seja, a resposta não é tão clara”, diz Neale Ahmed El-Dash, doutor em estatística e criador do site Polling Data.

Institutos que fazem as sondagens presencialmente argumentam que haveria alguma limitação de representatividade nas pesquisas feitas por telefone. A representatividade da amostra é formada a partir do que se sabe sobre o eleitorado, de acordo com dados públicos do TSE (Tribunal Superior Eleitoral) e do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) sobre renda, gênero e idade, por exemplo.

Embora oito em cada dez brasileiros tenham um aparelho celular para uso pessoal, segundo dados divulgados em 2020 pelo IBGE, nem todos querem ou podem atender uma ligação. A população de menor renda não tem a mesma disponibilidade que a de maior renda para falar ao telefone durante o período de trabalho, por exemplo.

Considero que toda forma de abordagem inclui desafios, mas a abordagem presencial atinge segmentos do eleitorado que são mais difíceis de alcançar por telefone. É fato que a maioria dos brasileiros possui telefone celular, mas a disponibilidade para atender as ligações não é a mesma em todas as classes sociais Luciana Chong, diretora do Datafolha

Marcelo Souza, diretor do Instituto MDA Pesquisa, diz acreditar que a pesquisa presencial é o padrão ouro e também avalia que ela consegue representar melhor a população brasileira.

Ele diz observar uma taxa de não resposta elevada nas pesquisas por telefone, ou seja, é necessário fazer várias ligações para conseguir uma entrevista válida. “Isso por si só já causa um viés que a gente chama de viés de seleção. Como consequência, quem atende e responde por telefone, em geral, são pessoas mais engajadas. E, pelo que a gente percebe, o eleitorado do Bolsonaro parece mais engajado”, diz.

“A gente costuma dizer que um eleitor dele não perde a chance de responder uma pesquisa por telefone. Isso pode prejudicar eleitores menos engajados que hoje estão na terceira via, por exemplo”, analisa.

O diretor ainda cita a diferença de cobertura de sinal e de incidência de telefones para a população de baixa renda que vive em regiões do interior do Norte e do Nordeste. “São públicos menos associados ao Bolsonaro. Isso pode justificar um pouco esses percentuais mais altos do Bolsonaro nas pesquisas por telefone”, explica.

Antonio Lavareda, presidente do Conselho Científico do Ipespe, defende que as desvantagens apontadas para as pesquisas telefônicas não procedem e ressalta que Estados Unidos e países da Europa não realizam mais pesquisas presenciais.

Há também diferença nos valores para se fazer uma pesquisa. Enquanto a do Ipespe divulgada na segunda passada custou R$ 84 mil e entrevistou 2 mil pessoas, o valor do levantamento Datafolha, que foi divulgado ontem com amostra prevista de 2.556 entrevistas, foi de cerca de R$ 473,8 mil.

Mas, segundo Lavareda, há vantagens que vão além do custo, como o alcance a moradores de áreas perigosas, como comunidades dominadas pelo crime organizado, ou de condomínios de luxo, que quase não circulam a pé pelas ruas.

“O argumento é de que nem todos os brasileiros têm telefone celular. O número de telefones já é maior que o da população. Em quantas residências um entrevistador de um instituto de pesquisa não tem acesso? Toda classe média que mora verticalizada hoje nas grandes cidades. Segurança, infelizmente, é uma questão importante no Brasil. Fica fora todo mundo que mora em apartamento”, afirma.

Sobre as pesquisas realizadas em ponto de fluxo, ele diz que grande parte das pessoas anda de carro pelas cidades e, portanto, não são entrevistadas.

Chong rebate o argumento de que as pesquisas presenciais são impactadas pelas dificuldades de acesso a determinados extratos da da população. “No Datafolha, as pesquisas são realizadas em pontos de fluxo”, disse. “Dessa forma, conseguimos entrevistar as pessoas que circulam por ali, e é possível acessar as classes mais altas e moradores de comunidades”, diz.

Já Souza argumenta que os locais que entrevistadores não conseguem acessar são “áreas com percentual muito pequeno em relação à totalidade do eleitorado”.

“Em relação a condomínios de luxo, classes mais elevadas, o pesquisador vai para rua com cotas de renda. Ele vai ter que encontrar alguém de renda mais alta. Pega uma pessoa saindo do prédio, indo no comércio, e aí a gente permite essa abordagem sem ser domiciliar. A gente consegue contornar esse problema fazendo uma busca ativa dessas pessoas de renda mais alta”, explica.

Outro aspecto que deve ser considerado nas pesquisas é o questionário. Na pesquisa presencial, é apresentado um cartão circular com os nomes dos candidatos, para garantir uma exposição de todos sem interferências para captar o voto. Na telefônica, o entrevistador lê os nomes dos candidatos em ordem definida pelo computador.

“A abordagem pessoal permite a apresentação do cartão circular com os nomes dos candidatos e outras ferramentas só possíveis na abordagem presencial”, diz Chong.

Já Lavareda diz que há dificuldades em ler o cartão em formato de pizza, principalmente entre aqueles com baixo nível educacional ou que têm alguma deficiência visual. “Além disso, temos cerca de 7% de eleitores analfabetos. O disco é um argumento totalmente fake”, critica.

Outra hipótese, segundo ele, para as diferenças nos resultados das pesquisas é a de que as pesquisas telefônicas captem mais eleitores bolsonaristas que não se sentiriam confortáveis em expressar seu voto em público.

“Não é [um voto] exatamente envergonhado, as pessoas rejeitam as pesquisas, o presidente fala mal o tempo todo das pesquisas. Como é que um bolsonarista vai se sentir à vontade para dar uma entrevista? Ele é abordado na rua por um entrevistador e tem que responder em voz alta que vai votar no Bolsonaro. Esse eleitor pode esconder o voto dele”, diz.

Segundo ele, avaliações de “ruim” e “péssimo” aparecem mais nas pesquisas telefônicas que nas presenciais. “As pessoas provavelmente se sentem mais à vontade [por telefone] de enunciar um juízo mais contundentemente crítico”.

Uol