Militares terão que assinar compromisso de não dar golpe
Foto: Fernando Frazão/Agência Brasil
A ausência do ministro da Defesa, Paulo Sérgio Oliveira, na convenção que lançou a candidatura à reeleição do presidente Jair Bolsonaro demonstrou os limites do achincalhe da farda. Começou ontem a XV Conferência de Ministros de Defesa das Américas para a qual é aguardado o general Lloyd Austin, secretário de Defesa dos Estados Unidos. Não apenas o comandante-em-chefe de Austin, o presidente Joe Biden, já deixou clara a visão americana sobre o golpismo bolsonarista, como ele e os demais ministros da Defesa presentes, incluindo Paulo Sérgio Oliveira, assinarão, na quinta-feira, uma declaração que, entre outros temas, deve reiterar a Carta da Organização dos Estados Americanos (OEA), assim como a Carta Democrática Interamericana.
A primeira atesta que “a democracia representativa é condição indispensável para a estabilidade, a paz e o desenvolvimento da região” e a segunda, “a celebração de eleições periódicas, livres, justas e baseadas no sufrágio universal e secreto como expressão da soberania do povo”. Ambos os compromissos constaram da declaração da última conferência do gênero que aconteceu em Santiago, em 2020, quando o Brasil foi representado pelo primeiro ministro da Defesa de Bolsonaro, o general Fernando Azevedo e Silva. O documento deve ir na direção inversa àquela que o próprio general tem sinalizado em pronunciamentos recentes em que desafia a condução do processo de votação pelo Tribunal Superior Eleitoral.
A ausência do general da convenção de domingo evitou que o mesmo signatário deste documento respaldasse mais um apelo golpista de Bolsonaro. Depois de um longo e tradicional discurso, Bolsonaro radicalizou no fim com novos ataques ao Supremo e uma convocação provocadora para que seus apoiadores saiam às ruas “pela última vez” no 7 de setembro. Como ainda não há voto pela internet ou pelo correio no Brasil, pressupõe-se que seus eleitores precisem sair de casa no dia 2 de outubro. Só não o farão se seu candidato desistir antes dessa data ou, numa hipótese cada vez mais improvável, se for bem sucedido no propósito de adiar a eleição.
Na mesma semana em que o ministro da Defesa assinará o “compromisso democrático”, alguns dos maiores banqueiros e empresários do país, como Roberto Setubal, Pedro Moreira Salles, Candido Bracher, Walter Schalka, Fábio Barbosa e Pedro Passos, farão o mesmo. A carta a ser divulgada nesta terça-feira é uma resposta ao encontro de Bolsonaro com representantes diplomáticos estrangeiros.
Os dois documentos dão, à provocação bolsonarista, o incontornável sentido de blefe. E dispensa as considerações do Centrão, sempre sob anonimato, de que suas lideranças ficaram muito contrariadas com o tom belicista do presidente. Presentes na convenção, fardados de bolsonaristas, o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), e do ministro da Casa Civil, Ciro Nogueira, só têm a ganhar com as ameaças do presidente porque se credenciam como mediadores da radicalização.
Embaçado o golpismo, Bolsonaro é obrigado a encarar a eleição. As pesquisas Xp/Ipespe e BTG/FSB divulgadas ontem, demonstram que o aumento do Auxílio Brasil e a redução do combustível são reconhecidas como de iniciativa de seu governo mas ainda não lhe trazem votos.
Sem respaldo militar para seu golpismo e com benesses ainda por provar valia eleitoral, restou ao presidente apelar àquele que se mostrou seu principal ativo eleitoral, a primeira-dama. Apesar do discurso pastoral, Michelle Bolsonaro falou para não convertidos na convenção do domingo. Ao contrário do seu candidato, a primeira-dama não suscita ódios. A única referência à raiva é um chiste, a menção ao marido que a acorda quando começa a assistir “Praça é Nossa” na cama – “Ele é sem noção com celular”. É aí que Michelle convoca o eleitor a seguir seus passos. Ela perdoa porque o marido “tem um coração puro e limpo”. É que lhe resta para reduzir a rejeição, hoje num patamar (60%) proibitivo à sua reeleição.