Moro sinaliza apoio a Bolsonaro

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Foto: Reprodução

“Jamais entraria para a política”, disse o então juiz Sergio Moro em 2016, no auge da Operação Lava-Jato. Nesta semana, após alguns meses de indecisão, uma troca de partido e algumas derrotas no Judiciário, ele anunciou a pré-candidatura ao Senado pelo União Brasil no Paraná, seu estado natal. O discurso de combate à corrupção e o trabalho durante a Lava-Jato agora dão o norte a suas propostas de campanha.

Em entrevista a VEJA, o ex-ministro da Justiça afirmou que uma eventual vitória do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) nas eleições seria uma tragédia e que, se eleito, gostaria de ser uma liderança de oposição a um eventual governo petista no Senado.

Moro também disse que não está havendo investigação ativa das suspeitas de corrupção no governo do presidente Jair Bolsonaro (PL), como no caso das supostas irregularidades na distribuição de verbas no Ministério da Educação. O ex-juiz, no entanto, evita fazer críticas diretas ao chefe do Executivo, de quem um dia foi aliado. Questionado sobre os ataques de Bolsonaro ao sistema eleitoral e às instituições, afirmou que críticas às instituições são possíveis, mas é necessário uma postura “mais construtiva”.

Leia a entrevista abaixo:

O senhor volta ao Paraná depois de ter o domicílio eleitoral negado em São Paulo. Não será um desafio conquistar a confiança do eleitorado paranaense depois disso? Não, porque essa confiança nunca foi quebrada. Na verdade, meu primeiro objetivo era conseguir a legenda presidencial. Não faria diferença concorrer por São Paulo ou pelo Paraná. E depois, para atender ao pedido do partido, eu aceitei esse projeto político em São Paulo. Mas, tendo havido a decisão do TRE de São Paulo, mantido o meu domicílio eleitoral no Paraná, a gente optou por não recorrer. Para mim é ótimo voltar e ter essa oportunidade de concorrer pelo meu estado, onde eu nasci, onde eu cresci, de onde eu pude fazer o trabalho mais relevante da minha carreira, que foi a Lava-Jato. A gente escreveu uma página da história do Brasil a partir daqui do Paraná. É claro que isso sem nenhum demérito de São Paulo, estado em relação ao qual tenho um grande apreço, mas fiquei radiante por permanecer no Paraná.

O senhor enfrenta uma grande rejeição dos dois polos que protagonizam a atual eleição, os bolsonaristas e os apoiadores de Lula.Como contornar isso? Bom, eu estou percorrendo o Paraná, e o que a gente vê é que as pessoas querem solução para os problemas reais da vida delas. Então hoje há um incômodo muito grande com a inflação, que está comendo o poder aquisitivo das pessoas, e uma preocupação em relação ao futuro. A gente tem um cenário econômico que vai ser desafiador e, se forem adotadas políticas econômicas erradas aqui no Brasil, a situação tende a piorar. Nesse cenário a gente precisa ter, independentemente de quem seja o presidente, um Congresso forte, com lideranças fortes, com vozes poderosas. E, pelo que construí na minha carreira pública, tanto na Lava-Jato como no Ministério da Justiça, acredito que eu posso ser uma dessas vozes. Inclusive, a depender de qual seja o resultado das eleições, devo me colocar claramente na oposição. Pretendo ser uma liderança de oposição no Senado.

Como o senhor vê essa atual composição do Senado? Sem qualquer espécie de mérito em relação a senadores individualmente, o protagonismo parece estar muito mais na Câmara dos Deputados do que no Senado. Claro que o Senado tradicionalmente é uma Câmara revisora, mas ele pode ter também uma dinâmica própria e mais iniciativa. E eu pretendo ser uma voz independente. Por exemplo, no próximo ano a gente tem duas vagas no Supremo Tribunal Federal. Os nomes são indicados pelo presidente e passam pela aprovação do Senado. O Senado historicamente sempre carregou as nomeações do presidente da República. Tem uma exceção e foi durante o governo Floriano Peixoto. Então, no próximo ano, precisamos ter vozes ali no Senado que não tenham medo de eventualmente dizer não a uma indicação do presidente.

Então o senhor acha que o Senado errou ao aprovar a indicação de algum ministro? Estou falando disso historicamente. Então, na história, o Senado não tem tido um papel ativo em realizar um crivo sobre essas escolhas, e no ano que vem ele vai ter duas oportunidades para exercer esse papel.

O senhor disse ontem que precisamos de gente forte no Senado e que não se venda por emenda ou cargo. Isso logo depois da divulgação de uma reportagem em que o senador Marcos do Val (Podemos-ES) disse ter recebido 50 milhões de reais do orçamento secreto, entre outras sobre esse tema. Foi um recado? Não foi uma referência específica ao senador Marcos do Val. O que existe, no entanto, é uma prática ativa. Vemos muita gente que é eleita com uma bandeira no Legislativo e, uma vez no poder, muda de posição muito facilmente. Às vezes, o que existe é fisiologia, destinação de verbas, então esse tipo de prática é inaceitável. Tem muita gente boa na política, mas falta um projeto nacional, e a política às vezes acaba se rendendo a esse fisiologismo, a essa troca de emendas. Quero deixar claro que entendo que essa prática do orçamento secreto é reprovável. Toda utilização de recursos públicos deve ser feita com absoluta transparência. Também entendo que a parcela do orçamento que está sendo direcionada para esse orçamento secreto é exagerada, acaba interferindo na capacidade do governo federal de definir prioridades nos seus investimentos.

“Tem muita gente boa na política, mas falta um projeto nacional, e a política às vezes acaba se rendendo a esse fisiologismo, a essa troca de emendas. Quero deixar claro que entendo que essa prática do orçamento secreto é reprovável.”

O senhor vê abertura para um eventual apoio do governador Ratinho Jr. (PSD) no Paraná? É uma decisão partidária, temos de esperar o momento certo para essa definição. O União Brasil não tem nenhum antagonismo em relação ao governador, e eu também tenho uma relação cordial com ele, mas ainda é cedo para definir se vamos fazer parte da coligação.

E uma possível aliança com o PSDB pode virar realidade? Tivemos uma conversa recente com o César Silvestri Filho (pré-candidato do PSDB ao governo), com quem também tenho uma relação cordial. Faz parte das conversações políticas do período eleitoral, não tem nada definido. Tanto de um lado quanto de outro é uma questão ainda aberta.

O ex-governador Beto Richa (PSDB), que foi réu na Lava-Jato, disse em entrevista que o senhor não tem nenhuma restrição ao nome dele. Isso é verdade? Eu não falei com o ex-governador Beto Richa, falei com o César Silvestri. As conversas com o Silvestri foram relacionadas mais à possibilidade de fazer uma aliança, apenas no campo da possibilidade.

Mas o senhor teria alguma restrição ao nome dele? A conversa se faz com o César Silvestri e o PSDB, então é muito cedo para comentar o relacionamento com outros personagens da política.

Nos últimos dias houve alguns episódios de violência política, incluindo a morte do tesoureiro do PT Marcelo Arruda, no Paraná, e a bomba lançada em um evento do mesmo partido. O senhor acredita que os discursos do presidente Bolsonaro incentivam essa violência? Eu repudio qualquer forma de violência, em especial a política ou eleitoral. Não creio que nenhum candidato justifique qualquer ato de violência contra qualquer pessoa ou entre eleitores. Essas divergências políticas têm de ser resolvidas no debate ou nas urnas. Seria positivo se todos os candidatos, inclusive os que lideram a corrida presidencial, moderassem o discurso para tentar acalmar os ânimos e repudiar de maneira clara qualquer episódio de violência. Nesse aspecto, ambos estão faltando.

Como o senhor avalia as últimas suspeitas de corrupção no governo Bolsonaro, como no MEC? O que a gente verifica é que houve um enfraquecimento do combate à corrupção nos últimos anos, foi até a causa da minha saída do Ministério da Justiça. A corrupção não desapareceu, evidentemente o Brasil não se tornou um país integro do dia para a noite, e a Lava-Jato revela que a gente pode, sim, combater a corrupção, pode, sim, diminuir a impunidade, mas que essa luta tem de ser permanente. Então o que a gente precisa é mudar o quadro legislativo e também prestigiar a autonomia das instituições de controle. O que não está havendo evidentemente é investigação efetiva e consequências. Agora a responsabilidade por isso não recai tão somente no Poder Executivo, recai também no Legislativo e no Judiciário.

O que pensa sobre os ataques de Bolsonaro ao sistema eleitoral e ao STF? Sou uma pessoa institucional. Tenho críticas severas ao STF, principalmente por decisões que enfraqueceram o combate à corrupção, como o fim da execução da condenação em segunda instância e a anulação da condenação de pessoas por corrupção. Sempre fui uma pessoa construtiva. Alguém que ingressa no mundo da política tem por objetivo levantar suas bandeiras de levar essas propostas para o Congresso Nacional, ser uma voz ativa nessa luta, então essas críticas sempre são possíveis em relação a todas as instituições, entretanto seria relevante uma postura mais construtiva em relação a esses temas.

“Tenho circulado pelo Paraná e tenho sido muito bem recebido, e o pão que me é oferecido pelas pessoas é muito saboroso. Mas acho que ele (Lula) deveria se preocupar mais com a campanha dele.”

Em um evento neste fim de semana, Lula disse que o senhor está comendo o pão que o diabo amassou, enquanto ele está numa boa. O que o senhor responderia? Tenho circulado pelo Paraná e tenho sido muito bem recebido, e o pão que me é oferecido pelas pessoas é muito saboroso. Mas acho que ele deveria se preocupar mais com a campanha dele. De todo modo, caso aconteça de ele ser eleito – o que acredito que seria uma tragédia para o país –, vou ficar muito feliz de ser oposição ao governo dele como uma liderança no Senado.

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