MP do PR mostra omissões da polícia sobre petista assassinado

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Foto: Reprodução

A Justiça do Paraná deu prazo de dez dias para que Jorge José da Rocha Guaranho responda pelo assassinato do guarda municipal Marcelo Arruda, morto a tiros na noite de 9 de julho quando comemorava o aniversário com uma festa temática do PT em Foz do Iguaçu (PR). Em entrevista ao UOL, o promotor Tiago Lisboa Mendonça detalhou os próximos passos da investigação e reafirmou ver motivação política no crime.

O Ministério Público aguarda por cinco laudos complementares e diz monitorar o inquérito que apura se há relação entre o caso e o suicídio de um diretor da associação onde a vítima comemorou o aniversário. O atirador foi denunciado na quarta-feira (20) por homicídio duplamente qualificado por motivo fútil e perigo comum, com pena que pode variar de 12 a 30 anos de prisão.

Baleado após abrir fogo contra a vítima, que revidou, o policial penal federal Jorge Guaranho teve alta há três dias da UTI do Hospital Ministro Cavalcanti e está consciente. Agora, o MP aguarda pela sua recuperação para que ele responda pelo crime.

“Recebemos a informação de que o quadro de saúde dele é estável. Vamos esperar pela alta médica de Guaranho para que ele seja interrogado. A defesa dele já tem prazo para apresentar resposta à acusação”, disse Mendonça.

O promotor lembra que ainda que há um inquérito paralelo conduzido pela Polícia Civil do Paraná para apurar a influência dos chutes dados por ao menos três participantes da festa na cabeça de Guaranho após o tiroteio.

A Promotoria aguarda a conclusão de uma série de laudos periciais complementares, que estão sendo elaborados pelo Instituto de Criminalística e serão encaminhados à Polícia Civil do Paraná, que ouviu outras duas testemunhas e solicitou imagens do entorno do local do crime. Esse conteúdo foi acrescentado ao inquérito policial na noite de quarta, mesmo após o oferecimento da denúncia.

“Só depois [da avaliação desse conteúdo], vamos nos pronunciar no processo, para ver se é o caso de fazer algum tipo de aditamento na denúncia ou não”, afirmou o promotor.

Confira abaixo os laudos pendentes, que devem ser concluídos em um prazo de 15 dias:

confronto balístico,

gravador de vídeo para leitura labial dos envolvidos,

análise do aparelho celular do investigado,

de veículo automotor,

local de morte.

O promotor reafirmou ver motivação política no assassinato. Contudo, diferencia o caso de um crime político, previsto na Lei de Segurança Nacional —revogada no ano passado— por representar um atentado contra o Estado Democrático de Direito.

O crime que denunciamos foi de homicídio duplamente qualificado por motivação política em decorrência dessa divergência político-partidária. Isso caracteriza o motivo fútil por ser desproporcional e banal. A gente não pode fechar os olhos para essa motivação que consta expressamente na denúncia.”Tiago Lisboa Mendonça, Ministério Público do Paraná

O entendimento do MP diverge da conclusão do inquérito elaborado pela Polícia Civil do Paraná. Na semana passada, a delegada Camila Cecconello indiciou Guaranho por homicídio qualificado por motivo tope e por causar risco a outras pessoas.

“Nosso entendimento é que [o homicídio por motivo torpe] tem, de certa forma, essa conotação de alguma vantagem no campo econômico. Já o motivo fútil é flagrantemente desproporcional”, comparou, durante a coletiva de imprensa para apresentar a denúncia.

A Polícia Civil argumentou que descartou crime de ódio com motivação política com base no relato da esposa do atirador. As lacunas deixadas pela conclusão do inquérito apenas cinco dias após o crime desencadearam críticas, sobretudo dos representantes legais da família de Marcelo Arruda.

O Ministério Público do Paraná diz também monitorar a investigação da Polícia Civil envolvendo o suicídio de Claudinei Coco Esquarcini, 44, que morreu neste domingo (17) em Medianeira, a 50 km de Foz.

Diretor da associação onde ocorreu a festa, ele é apontado no inquérito do assassinato de Arruda como o encarregado pela instalação do sistema de câmeras de vigilância no local do crime. O celular dele foi apreendido pela Polícia Civil e encaminhado ao Instituto de Criminalística.

“A perícia no aparelho telefônico é fundamental para ver se, de alguma forma, ele vinha sendo pressionado após a morte de Arruda. Ligações recebidas, feitas e conversas no celular estão sendo analisadas. A ideia é intensificar a atuação do MP nesse inquérito para ver se tem algum vínculo com o caso”, disse o promotor.

Mendonça diz ver com preocupação possíveis desdobramentos do caso, sobretudo em relação a testemunhas indicadas pelo próprio Ministério Público na denúncia.

É importante que seja resguardada a integridade física e psicológica dessas pessoas. São testemunhas que entendemos ser relevantes, que ainda serão ouvidas em audiência judicial e no plenário do júri. É um caso grave, que acaba gerando debates que não se limitam apenas a questões jurídicas.”Tiago Lisboa Mendonça, Ministério Público

Segundo o promotor, há episódios de ameaça. Ele entende, porém, que há uma limitação da ação da Promotoria em relação a esses casos.

“Há relatos de testemunhas que dizem estar sendo pressionadas e ameaçadas. Estamos atentos a essas questões, mas precisamos trabalhar dentro do cenário de atuação do Ministério Público”.

Em perfis nas redes sociais, o policial penal Jorge Guaranho se define como “conservador, cristão”, faz postagens homofóbicas e diz ser a favor da política armamentista defendida pelo presidente Jair Bolsonaro (PL).

Com um histórico ligado a episódios violentos, se envolveu em duas confusões em apenas 16 meses. Em junho de 2018, acabou sendo algemado e levado a uma delegacia no Rio de Janeiro acusado de insultar policiais militares em uma abordagem.

Em outubro do ano seguinte, se desentendeu com seguranças de uma festa na cidade de Capanema (PR), a 118 km do seu local de trabalho, na penitenciária federal de Catanduvas (PR). Como os envolvidos não quiseram denunciá-lo, foi feito apenas um registro interno pela PM sobre o caso. Procurada, a defesa de Guaranho disse não haver condenação dele em nenhum desses episódios.

O promotor, entretanto, afirma que esses episódios farão parte do processo.

Todas essas questões vão ser levadas em consideração. Isso vai demonstrar a personalidade e a conduta social de Guaranho. É importante que isso fique bem claro para quem vai julgar, que são os jurados”Tiago Lisboa Mendonça, Ministério Público

O Depen (Departamento Penitenciário Nacional) esclareceu que Guaranho chegou a responder a uma sindicância interna por causa do episódio no Rio de Janeiro. Mas a apuração foi arquivada porque o episódio foi considerado “ato da vida privada” do servidor. “Caso seja constatado que o Depen, de alguma forma, se omitiu, o conteúdo será encaminhado para a esfera competente, que é o Ministério Público Federal”, complementa Mendonça.

Uol