Viúva de Marcelo diz que atirador queria chacina

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Foto: Reprodução / TV Globo

A policial civil Pamela Suellen Silva, viúva do guarda municipal Marcelo Arruda, detalhou como foi o assassinato do marido, morto a tiros na noite de 9 de julho enquanto comemorava o aniversário de 50 anos com uma festa temática do PT em Foz do Iguaçu (PT).

Em depoimento gravado em vídeo obtido pelo UOL, ela relatou a confusão, que ocorreu quando o policial penal federal Jorge José da Rocha Guaranho manobrou o carro em frente à festa para provocar os convidados. “Ele disse: ‘Eu vou voltar. E eu vou acabar com todos vocês'”, relatou a viúva.

No depoimento, há ao menos uma contradição em relação às informações relatadas pela Polícia Civil do Paraná, que disse que Guaranho só mostrou a arma após o aniversariante jogar terra em seu veículo. Segundo a viúva, o policial penal mostrou a arma antes.

“De repente, chegou o carro [que parou em frente à festa]. Esse cara abaixa o vidro e fala: ‘PT lixo’, ‘Lula ladrão’, ‘Bolsonaro mito’. Então, o Marcelo fala: ‘Vai embora! Aqui é uma festa particular’. Aí, o cara saca a arma. E o Marcelo pega um punhado de terra e arremessa na lataria do veículo, de forma a desviar a atenção do alvo. Porque ele já estava mirando”, conta.

Apoiador do presidente Jair Bolsonaro (PL), Guaranho foi indiciado ontem por homicídio duplamente qualificado, por motivo torpe e por causar perigo a outras pessoas, com pena que pode variar de 12 a 30 anos de prisão. Contudo, a Polícia Civil do Paraná descartou crime de ódio por motivação política com base no relato da esposa do atirador bolsonarista.

Ela disse só ter percebido que o policial penal estava acompanhado quando a esposa, que estava com a filha de 3 meses no colo, abriu a porta traseira. “Eu não sabia que tinha outra pessoa dentro do carro. Alguém abre a porta traseira, e é uma mulher. Ela fala [para o marido]: ‘Para! Por favor, para!’. Nós continuamos insistindo para que ele abaixasse a arma”.

Após a saída de Guaranho, que fez ameaças antes de deixar o local, Pamela disse ter conversado com o caseiro e fechado o portão que dá acesso ao local da festa. “Eu disse: ‘O cara falou que vai voltar'”. Em seguida, Pamela disse que cogitou solicitar as imagens do circuito interno para verificar a placa do veículo e solicitar uma abordagem aos seus colegas policiais.

Pamela chegou a interromper a delegada Iane Cardoso, responsável pela condução do depoimento, demonstrando desconforto após ser questionada se houve divulgação do tema da festa em redes sociais. E, em seguida, se foram reproduzidas músicas alusivas ao PT.

“Doutora, me desculpa, mas eu não sei se isso tem alguma coisa a ver. Estávamos num clima de festa. Estávamos ouvindo música de tudo que é jeito”, disse. “Mas também não tem problema”, respondeu a delegada.

Gleisi Hoffmann, deputada federal pelo Paraná e presidente do PT, diz ter recebido relatos de que a delegada fez postagens contra o PT em 2016. “Petista quando não está mentindo está roubando ou cuspindo”, teria escrito. Outra postagem também atribuída à delegada contém as hashtags “#foralula” e “#forapt”. A delegada negou parcialidade.

A suposta parcialidade na investigação foi citada pelos representantes legais da família de Marcelo Arruda. “Preocupante o fato de que as investigações foram dirigidas por autoridade pública e manifestamente contrária ao partido da vítima. Esperamos que isso não macule as investigações”, observou o advogado Daniel Godoy.

Iane deixou o comando da investigação na segunda-feira (11), após as reclamações de Gleisi, mas continuou auxiliando o inquérito. No lugar dela ficou a delegada Camila Cecconello, que chefia a Divisão de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP). O depoimento ocorreu na terça-feira (12).

Pamela parece se esforçar para lembrar dos detalhes após o retorno de Guaranho ao local. Ela disse ter percebido a chegada do atirador quando ele parou em frente ao portão.

Nesse momento, disse só ter tido tempo de avisar aos convidados e pegar o seu distintivo no carro. “Eu falei: ‘cara, aqui é a polícia. Para, abaixa a arma’. Aí, ele desferiu dois disparos. Aí, eu me afastei. Lembro que eu estava na frente dele, a arma estava muito próxima. Pensei: ‘em qualquer bobeira, ele pode virar e me acertar'”.

Agi por instinto, não lembro o que eu fiz [no momento do tiroteio]. Lembro que houve os disparos, que o Marcelo disparou também. Lembro que houve muito tiro. Eu me abaixei e saí. De repente, quando os tiros cessaram, eu já vi o Marcelo no chão”Pamela Suellen Silva, viúva

Em seguida, disse ter socorrido o marido. “Ele falou: ‘chama o Siate [unidade do Corpo de Bombeiros no Paraná]. E daí, falou assim: ‘e a minha arma?’. [A arma] estava um pouco acima da cabeça dele, no chão. Aí, verifiquei que ele tinha levado um tiro na região do abdômen e um tiro na perna”.

Segundo ela, o guarda municipal ainda estava vivo quando foi levado ao hospital. “Ele chegou consciente [ao hospital], mas não conseguiram controlar a hemorragia”.

A esposa de Guaranho, que teve a sua identidade preservada pela reportagem, afirmou em seu depoimento que, ao sair do churrasco e ir em direção à festa, o policial penal colocou no som do carro uma música com os dizeres “o mito chegou, o Brasil acordou”.

“Ele não é fanático pelo Bolsonaro como o pessoal está dizendo e tudo mais. Ele estava ouvindo uma música que era ‘o mito chegou e o Brasil acordou’, que é uma música que tem aí que fala do mito, nem fala Bolsonaro nada”, disse.

Bolsonaro é costumeiramente chamado de “mito” por seus apoiadores desde 2018, quando foi eleito presidente da República.

Em certo ponto do depoimento, ela disse que o marido é “pró-Bolsonaro”. “Ele é de direita, mas nunca foi de ficar brigando, exaltado. Ele é pró-Bolsonaro, claro, mas é uma coisa saudável”.

Ao passar na frente do evento, a esposa do atirador afirma que o casal foi xingado por integrantes da festa, quando seu marido revidou dizendo “Bolsonaro mito”.

Nesta hora, os participantes da festa teriam ficado irritados e jogado pedras ou terra, segundo a depoente, contra o veículo. Ela diz que o material acertou seu bebê, que estava em seu colo. A esposa afirma ter tentado impedir o marido de voltar ao evento após deixá-los em casa.

Marcio Jacob Muller, conhecido de Guaranho, estava no churrasco com o atirador antes do crime e deu dois depoimentos. Ele contou que acessou as imagens da câmera de segurança que possibilitava visualizar a festa de Marcelo Arruda com temática do PT.

“Durante o churrasco na associação, eu estava próximo da churrasqueira junto com Guaranho, ele estava atrás de mim. Ele viu [o celular com a imagem da câmera]. Só pode ter visto”.

Muller afirmou que, após ter visto as imagens, Guaranho perguntou onde a festa estava acontecendo. “Vi que era uma festa temática. Até então, sabia que era uma festa de aniversário, mas não sabia que era temática”, completou.

Uol