Alckmin é obrigado a evitar esquerda radical
Foto: Washington Alves/Reuters
Candidato a vice de Luiz Inácio Lula da Silva, o ex-governador Geraldo Alckmin (PSB) ganhou uma estrutura própria de campanha para tentar ‘virar’ votos para o PT no interior de São Paulo e ampliar diálogo com representantes de setores refratários ao ex-presidente: empresários e representantes do agronegócio e da saúde em Estados como Goiás, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul e Rio Grande do Sul.
Em paralelo, Alckmin, que tem evitado entrevistas a jornalistas, tem sido cauteloso na divulgação das agendas. Em conversas reservadas, aliados do ex-tucano admitem que setores da esquerda ainda resistem a Alckmin e temem que ele seja hostilizado. O primeiro sinal de alerta na campanha foi dado em junho, quando Alckmin foi vaiado em Natal (RN) durante ato de apoio a Lula diante de uma plateia formada por petistas e militantes de partidos aliados como o PSB, PCdoB e PSOL.
Alckmin não tem participado de agendas com os setores mais “radicais” da esquerda. O ex-governador não compareceu, por exemplo, a um ato de Lula na Universidade de São Paulo (USP) na semana passada. Nos bastidores, aliados do ex-governador admitem que temiam vaias, uma vez que o público era formado por militantes de partidos de esquerda do movimento estudantil, setores mais hostis à aliança. Os petistas, porém, negaram que esse tenha sido o motivo da ausência, apesar de o ex-governador ser considerado um rival do movimento estudantil.
No ato da USP, o candidato ao Senado, Márcio França (PSB), foi vaiado. A plateia reagiu com hostilidade em dois momentos. O primeiro ocorreu logo no início, quando os políticos convidados eram apresentados. A segunda vez foi durante a fala de Lula, no momento em que o petista cumprimentou França.
Alckmin também não participou do ato de início oficial da campanha de Lula, na última terça-feira, na porta de uma fábrica em São Bernardo do Campo. O público do evento era de operários.
No sábado, em comício no Vale do Anhangabaú, militantes ensaiaram uma vaia no início do discurso de Alckmin, mas o ex-governador contornou a situação terminando sua fala com a brincadeira da receita de “Lula com chuchu” em alusão à chapa que disputa à Presidência. Ao lado do ex-presidente, Alckmin foi aplaudido.
“A militância do PT não teve nenhum problema com Alckmin”, afirma o deputado Emídio Souza, coordenador do plano de governo de Fernando Haddad, candidato do PT ao governo de São Paulo. “O papel dele (Alckmin) na campanha é muito importante, especialmente em São Paulo. O ex-governador é um fiador importante tanto para o Lula quanto para o Haddad e ajuda a abrir portas. A importância se mede pelo simbolismo: ele é alguém que o País vê como moderado”, disse Emídio.
Alckmin passou a despachar semana passada no comitê da campanha presidencial no Pacaembu, bairro nobre de São Paulo, onde recebeu uma sala no mesmo andar da do ex-presidente, com quem se reúne regularmente para traçar estratégias de campanha. O ex-tucano conta agora com um time em sua retaguarda.
O núcleo político é formado por três aliados da velha guarda do PSDB, os ex-deputados Floriano Pesaro e Silvio Torres. Além deles, Alckmin conta com o apoio do sociólogo Fernando Guimarães, também egresso do PSDB e hoje no PSB, como os demais.
O candidato a vice ganhou o reforço de um assessor e agora tem em seu time dois ajudantes de ordens, um direito concedido a todos os ex-governadores.
Nesta semana, por exemplo, Alckmin vai participar em Brasília do Congresso Nacional das Santas Casas e Hospitais Filantrópicos. O setor majoritariamente apoiou Bolsonaro em 2018 como reação ao programa Mais Médicos, que trouxe médicos cubanos para o Brasil.
O comando da campanha fez um mapa com as regiões “azuis” onde Alckmin venceu Lula em 2006. O foco da estratégia, segundo interlocutores, é reduzir a resistência conservadora a Lula e reforçar a narrativa de que ele faz parte de uma frente ampla em defesa da democracia, da Constituição e das conquistas sociais. Alckmin tem lembrado nas conversas que ele e Lula foram deputados constituintes.
A narrativa é que a vida separou o PSDB e o PT, mas as circunstâncias, leia-se Bolsonaro, uniu antigos adversários. Um símbolo desse movimento será a participação do ex-chanceler Aloysio Nunes Ferreira no evento de lançamento da candidatura de Lula em São Paulo no sábado.
A campanha também integrou as agendas da ex-primeira-dama Lu Alckmin e da socióloga Rosângela da Silva, a Janja, mulher de Lula. A presença das duas em eventos e nas redes é uma tentativa de fazer um contraponto à primeira dama Michelle Bolsonaro, que terá um papel de destaque na campanha do marido.
“A aliança com o Alckmin não é só para ganhar eleições. É para governar o País. Lula construiu aliança com um vice com ampla experiência e que será utilizada a bem da reconstrução do País”, afirma um dos apoiadores da campanha e próximo a Lula, o advogado Marco Aurélio Carvalho.