Lula explica nova política de preços do petróleo
Foto: Maria Isabel Oliveira/Agência O Globo
O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, candidato do PT ao Palácio do Planalto, tem enviado emissários para tentar acalmar o mercado e adiantar linhas gerais de qual política pretende adotar na gestão da Petrobras em um eventual novo governo. Gestores de fundos de investimentos e de instituições financeiras relataram preocupação com a formação de preços dos combustíveis e a interrupção da venda de ativos da estatal, considerados importantes para recuperar a saúde financeira e a capacidade de investimento da empresa, que registrou prejuízos bilionários após ser alvo de casos de corrupção durante governos petistas.
Crítico da atual política de preços da estatal, que atrela o valor cobrando no país a parâmetros internacionais, Lula pediu ao senador Jean Paul Prates (PT-RN), ligado ao setor de óleo e gás, para se reunir com gestores dos principais bancos e fundos de investimentos do Brasil, a maioria deles representantes de acionistas da Petrobras, que querem saber o rumo da empresa caso o ex-presidente vença a eleição.
Já ocorreram cinco encontros no Rio e em São Paulo e outros dois estão agendados para as próximas semanas. O último, na segunda-feira, reuniu na capital paulista 20 representantes de gestoras de fundos, entre as quais Itaú High Alfa, Genoa, Bradesco, Vinland, AZ Quest, Asset 1, Ibiuna e RPS.
O senador tem levado aos empresários propostas que o PT tem pensado para a política nacional de preços de combustíveis, o que afetaria não só a Petrobras. A principal delas é a extinção da política do chamado “preço de paridade de importação (PPI)”, que alinha os preços da Petrobras ao mercado internacional. Essa política, criada na gestão de Michel Temer, é criticada sob o argumento de que foi responsável pelas recentes altas da gasolina e do diesel. Na gestão de Dilma Rousseff, quando os preços foram represados artificialmente, a estatal registrou prejuízos.
Paul defende a adoção de um valor de referência a partir de uma fórmula que leve em conta índices setoriais e econômicos do mercado internacional e do mercado brasileiro. Participantes do encontro, contudo, leram a proposta como uma espécie de tabelamento de preços, inclusive porque valeria para outras empresas do setor.
Lula é um crítico recorrente também do outra política atual adotada pela estatal, como as vendas de ativos para focar em extração de óleo e gás, além dos preços da companhia.
Gestores que participaram dos encontros criticam, reservadamente, a proposta, pois entendem que ela pode levar prejuízos à estatal e também interferir nos preços de outras empresas. Uma segunda crítica é quanto à paralisação da venda de ativos da estatal, como refinarias. Esses dois itens foram os mais reprovados pelos gestores.
Outra ideia abordada nas conversas é a elevação da capacidade de refino no Brasil, a partir da ampliação da capacidade de produção de refinarias já construídas ou da construção de novas — o PT se diz aberto a investimentos públicos e privados, nesse caso.
— Queremos viabilizar a capacidade de refino adicional para o Brasil, seja pela Petrobras ou por agente privado. Se algum agente privado quiser construir refinaria nova ou dar um upgrade em refinarias que já existem, o PT e o Lula não têm nada contra isso — afirma Paul.
Os investimentos públicos em refino de petróleo representam uma repetição da política energética do partido. As gestões petistas tentaram construir quatro refinarias, mas as obras foram interrompidas ou os projetos reduzidos após as revelações da Operação Lava-Jato. As investigações da Polícia Federal e do Ministério Público Federal que começaram na estatal deflagraram uma crise sobre o partido, com prisão de dirigentes, inclusive do próprio ex-presidente Lula — a condenação dele foi anulada pelo Supremo Tribunal Federal.
O partido é um crítico ferrenho da venda de refinarias da Petrobras, desenhada pela empresa e pelo Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) justamente para atrair capital privado e concorrência para o setor. Nos encontros com o mercado, o PT tem falado em interromper a venda em curso de refinarias da estatal.
Para os conselheiros do Cade, a quebra do monopólio da Petrobras no refino e no gás seria a única forma de estimular a competição no setor.
Investidores do setor afirmam que a venda de refinarias é o meio mais rápido de aumentar a capacidade das estruturas, que já estão prontas, mas demandam recursos. Por isso, esses investidores defendem a manutenção das vendas de refinarias.
Em nome do PT, o senador também defende a formação de “estoques reguladores” e a criação de uma conta de estabilização de preços para ser ativada nos períodos de crise internacional de preços e desabastecimento. O Brasil importa cerca de 30% do diesel consumido nacionalmente, por exemplo, o que faz com que oscilações internacionais sejam trazidas para o mercado interno.
— A proposta não visa achatar o preço e nem dar prejuízo a ninguém. Queremos trabalhar com nível pouco abaixo do preço de paridade de importação e, quando houver uma excepcionalidade, alta brutal do petróleo por qualquer razão, guerra, furação, qualquer coisa que eleve o preço, entra um dispositivo que acumulou ao longo do tempo, entra esse recurso, que vem de dividendos excepcionais — explica o senador ao GLOBO .
A esses empresários, o PT tem dito que não será dado um “cavalo de pau” no modelo de gestão e nem haverá mudanças “traumáticas”. Tem repetido que a gestão terá credibilidade, estabilidade e previsibilidade, termos já usados por Lula e pelo seu candidato a vice, Geraldo Alckmin, em discursos a empresários e repetido nesta terça-feira pelo presidenciável em palestra na Fiesp.
O senador reforça ainda que não serão tomadas “decisões fechadas em gabinetes”, com a ideia de levar segurança às medidas que serão adotadas caso a chapa vença a eleição. A Petrobras foi o foco do maior escândalo de corrupção das gestões petistas, descoberto pela operação Lava-Jato.
— Não será algo ruim nem para empresa e nem para o mercado. Sairemos de um ambiente hermético para um ambiente que abre horizonte. Com tudo racionalmente explicado, com lógica de empresa estatal mista, que precisa do investidor privado, ao mesmo tempo em que ele precisa confiar no acionista majoritário — diz o senador.
O argumento se contrapõe ao tom que o próprio Lula tem usado ao tratar da estatal. Em entrevista ao UOL, o petista falou que a atual política de preços da Petrobras é “para agradar aos acionistas em detrimento de 215 milhões brasileiros”, prometendo cálculo em função dos custos nacionais “porque produzimos em real, pagamos salário em real”. Em discurso em Campina Grande (PB), em 2 de agosto, afirmou que a Petrobrás “não pode ficar dando dinheiro a acionistas americanos”.
Durantes os encontros com investidores, Jean Paul tem respondido uma série de perguntas sobre refino, distribuição e a política de investimentos da Petrobras.
— Procuro não passar uma visão política e ideológica, pois são investidores com perfil observador e crítico. É o acionista conservador que olha o horizonte para daqui 10 e 20 anos. Sou recebido sem nenhuma resistência, os ânimos são de curiosidade e quando percebem que eu tenho resposta para tudo, entendem do que a gente está falando.
As propostas para políticas de preço de combustíveis têm sido discutidas por um grupo formado por José Sergio Gabrielli, ex-presidente da Petrobras do governo Lula; Magda Chambriard, ex-diretora-geral da Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) do governo Dilma Rousseff; além de representantes de sindicatos. Gabrielli foi condenado pelo Tribunal de Contas da União (TCU) por prejuízos provocados à Petrobras na compra da refinaria de Pasadena, nos Estados Unidos. Essa refinaria foi comprada com o objetivo de ampliar a oferta de derivados para o Brasil, após a descoberta do pré-sal.