Vem aí a Marcha pela Carta Democrática
Foto: Divulgação/Faculdade de Direito da USP
Manifesto pela democracia que já caminha para 700 mil adesões e ambiciona chegar a 1 milhão de assinaturas antes de seu lançamento, em 11 de agosto, pode se desdobrar numa “marcha pela democracia”. Este desdobramento, que já era considerado face ao crescimento das adesões, passou a ser uma resposta desejável às reiteradas acusações do presidente Jair Bolsonaro de que se trata de uma iniciativa elitista.
O documento, inspirado na carta lida pelo jurista Goffredo da Silva Teles, em 1977, como um brado contra a ditadura, foi idealizado por professores e alunos da Faculdade de Direito do Largo de S. Francisco, mas hoje conta uma adesão que vai do padre Julio Lancelotti ao copresidente do Conselho do Itaú Unibanco, Roberto Setubal, passando pela Federação das Indústrias de São Paulo, centrais sindicais e por 11 ex-ministros do Supremo Tribunal Federal.
Depois de dizer que o documento tem a assinatura de “empresários-mamíferos”, Bolsonaro voltou ontem a atacar a iniciativa, em entrevista à rádio Gaúcha. Acrescentou dois adjetivos aos signatários: “cara de pau” e “sem caráter”. Demonstra, claramente, que pretende associar ao documento a imagem de “elitista”, a exemplo do que o ministro da Casa Civil, Ciro Nogueira, fez na semana passada ao dizer que os banqueiros haviam aderido por terem tido perdas com o Pix.
“É uma reação defensiva de quem perdeu o poder de pauta e agora tenta encontrar uma narrativa para responder”, diz Floriano Azevedo Marques, professor da faculdade e um dos organizadores do manifesto. Surpreendido, como outros organizadores, pela adesão ao manifesto, o professor diz que a perspectiva de uma presença superior à capacidade dos espaços da faculdade já os havia levado a cogitar uma expansão não apenas para o largo em frente como também para o Vale do Anhangabaú, separado do prédio do evento por uma ladeira. “Esta reação do presidente acabou ajudando a divulgar o manifesto”, diz.
Com um detalhe. Numa tática bem ao gosto das redes bolsonaristas, a campanha do presidente está usando os mesmos termos (carta, manifesto, democracia) para divulgar um documento em defesa de Bolsonaro. Manoel Fernandes, da Bytes, que monitora as redes, diz que o único objetivo desse tipo de tática é o de confundir o usuário entra nas redes para procurar o documento. Pode cair no da democracia no abaixo-assinado bolsonarista “Manifesto à nação brasileira – defesa das liberdades” que já soma mais de 700 mil assinaturas.
Os organizadores do ato de 11 de agosto já estão em contato com as autoridades públicas para a possibilidade de o ato vir a ter desdobramentos para além do prédio da faculdade. Além de um telão no Largo de S. Francisco, um outro está sendo planejado para o Anhangabaú. A ideia de um texto que enderece mais os problemas sociais do país está, por enquanto, descartada. A percepção é que que o movimento deve focar nas premissas democráticas e adiar as pautas urgentes sob o risco de respaldar as aleivosias do presidente da República sobre o teor da manifestação.
Na linha de ampliar a amplitude do manifesto, há uma torcida, entre seus organizadores, por um pedido de vista no julgamento marcado para hoje, no Supremo Tribunal Federal, sobre a Lei de Improbidade Administrativa.
O tribunal vai definir, ao julgar recurso extraordinário, se as alterações feitas pelo Congresso para amenizar a lei no ano passado, poderão ser aplicadas retroativamente. Também é questionada a mudança que restringiu ao Ministério Público a legitimidade para ajuizar ação de improbidade. Em fevereiro, o ministro Alexandre de Moraes deferiu liminar autorizando a propositura de ação de improbidade também a pessoas jurídicas interessadas.
A avaliação, entre professores da faculdade, é de que se o Supremo rejeitar a retroatividade das mudanças da Lei da Improbidade, a decisão pode colaborar para um clima de animosidade contra a Corte entre os políticos, entre eles o presidente da Casa, o deputado Arthur Lira (PP-AL), que exerce seu mandato com base numa liminar. É de um apoio do Congresso contra o Supremo que o presidente Jair Bolsonaro precisa para sair do isolamento em que se encontra, inclusive, pela amplitude conquistada pelo manifesto democrático.
No mesmo dia em que o manifesto será lançado, em 11 de agosto, Bolsonaro participará de uma sabatina na Fiesp, quando será chamado assinar o manifesto. A reação raivosa, porém, torna improvável que venha a subscrevê-lo.