Candidatos em primeiro sempre fogem de debates

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Foto: Reprodução Band

Desde a redemocratização, a maior parte dos candidatos à Presidência que lideravam as pesquisas fugiram de embates diretos no primeiro turno, mas foram eleitos. Faltar o debate na televisão pode, porém, ser uma estratégia furada, porque, sem a presença de um dos candidatos, os rivais contam com caminho livre para ataques. Mas o que pode ser pior: ter um desempenho ruim no evento ou não participar?

Especialistas ressaltam que o cenário eleitoral para 2022 é diferente. Esta é a primeira vez que um presidente concorre com um de seus antecessores. Inédita, a disputa força os presidenciáveis Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e Jair Bolsonaro (PL) a participar dos encontros para se defender e dividir as críticas. Assim que um deles confirma a presença, fica mais difícil para o outro recusar.

No entanto, depois do debate de domingo, na Band, o núcleo duro da campanha de Bolsonaro começou a reavaliar a presença do candidato nos próximos confrontos. O presidente teve uma avaliação negativa frente ao eleitorado nas redes sociais, conforme levantamento da empresa de consultoria Quaest. O PT também avalia a ida de Lula a novos debates.

Jairo Pimentel, consultor da Ponteio Política e cientista político, avalia que a ausência de Lula e Bolsonaro seria pior para eles, porque as críticas atravessariam a ausência para resvalar no comprometimento dos dois com eleições dentro da normalidade:

— A disposição do Lula em participar foi o que motivou Bolsonaro. Os dois participaram até para evitar abrir espaço e dividir as críticas. Bolsonaro tentou associar Lula à corrupção, o que aconteceu no primeiro bloco, mas seu desempenho foi comprometido pelo ataque à Vera Magalhães. Nesse sentido, seria melhor ele não ter participado, apesar de ter ido bem, segundo sua bolha. Ele se prejudicou na proposta de atingir outros públicos. Por esse lado, era melhor ter ficado em casa — explicou Pimentel.

Ainda de acordo com o consultor, Bolsonaro tem mais a perder do que a ganhar participando de outros debates, mas uma hora ele vai ter que participar, senão pode chegar mais fraco ao segundo turno. O professor também avalia que o não comparecimento do presidente nos debates pode até mesmo impulsionar um movimento para definir a eleição no primeiro turno, puxado pelos eleitores de Ciro Gomes (PDT).

Já o cientista político Eduardo Grin, da Fundação Getúlio Vargas (FGV), diz que faltar ao debate pode custar votos importantes a Bolsonaro no primeiro turno. O especialista acredita que a campanha de Lula ainda vai “trucar” o presidente, confirmando o petista em todos os próximos debates:

— Bolsonaro vai ficar sem opções. Faltar seria contraditório, já que ele sempre diz que é macho. Ao mesmo tempo, o presidente não consegue ter outro discurso que não seja o do cercadinho, e se ele não se colocar para disputar os votos com Lula, não vai conseguir diminuir a diferença nas pesquisas.

Segundo o também cientista político Felipe Nunes, diretor da Quaest, a ausência de Bolsonaro nos debates, por exemplo, pode gerar efeitos positivos e negativos para todos os candidatos.

— Sem Bolsonaro, a audiência diminui. O público interessado em ouvir o presidente não liga a televisão. Além disso, a ausência dele também poderia tirar o Lula, o que também diminuiria a relevância do debate. Há consequências para o jogo, com manutenção do status quo e diminuição das possibilidades de mudança — disse.

O não comparecimento de Bolsonaro ainda poderia ser revertido em ganhos para Lula, porque o petista está na frente nas pesquisas de intenção de voto. Ao mesmo tempo, embora a ausência do presidente represente uma chance a menos para virar votos fora da bolha bolsonarista, o pesquisador avalia que Bolsonaro teria que ir ao debate disposto a falar com outros públicos — o que não parece ser o caso.

Professor titular da FGV, o cientista político Carlos Pereira avalia que a repercussão dos debates nas mídias tradicionais e sociais podem desestabilizar o cenário de intenções de voto consolidadas. Por isso, é muito arriscada a estratégia de se recusar a participar dos embates, bem como também é muito arriscado participar e ter um desempenho ruim, dando vazão a quebras mais vigorosas para os candidatos alternativos.

O Globo