Confira a fome que Bolsonaro nega existir

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Foto: Guito Moreto/ Agência O GLOBO

Sou mãe de três crianças que sustento sozinha. Só Deus sabe como tem sido uma incerteza a gente ter o que comer.

No fim de agosto, cheguei a vender parte das minhas panelas para alimentar meus filhos. Fui para as ruas de Japeri, onde moro, na Baixada Fluminense, e consegui R$ 12 pelas peças: o suficiente para comprar algumas salsichas, alho e um quilo de arroz, que garantiram o jantar.

Aqui em casa, às vezes, faço torresmo com pelanca que ganho no mercado. Parentes e amigos também ajudam. Mas nem sei mais o que é um café da manhã. Para beber, tento engambelar os meninos com água morna com açúcar. Mas há dias sem nada. E quando a fome aperta, eu me desespero.

A Clarissa Vitória, de 10 anos, quer ser veterinária. O Luiz Felipe, de 7, bombeiro. E o Sadrak, de 5, policial. Eles são as bênçãos da minha vida. E por isso não paro, porque quero vê-los se tornarem o que eles sonham ser. Na frente da minha casa, tenho um bicicletário: são R$ 2 por bicicleta dos vizinhos que guardo. Mas é trabalho que me rende pouco: uns R$ 40 por semana, e ainda tomo alguns calotes.

Também cato material para reciclagem. Costumava fazer faxina, mas faz uns três meses que não aparece nada. Já o pai dos meus filhos não me ajuda. Estamos separados há dois meses, porque não aguentava mais as agressões que eu sofria.

Fixo mesmo é o Auxílio Brasil. Recebo e no mesmo dia vai tudo embora. Pago os fiados que acumulo no mês, compro o botijão de gás, embora na maior parte do tempo eu cozinhe num fogão a lenha improvisado. É também quando meus filhos têm o que eles gostam: um iogurte, um biscoito, uma broa… Se eu tivesse mais condições, um dos meus maiores desejos seria terminar minha casa. Construiria um banheiro, porque, hoje, o que tem é um vaso sanitário, sem chuveiro nem pia. A água vem de um buraco que fizemos tubulação. Luz, só há na sala, onde fica o colchão em que dormimos.

Moro dentro de uma casa de rato, que saem de buracos no chão e, às vezes, passam por cima da gente. É horrível! Mas não perco a fé de que uma hora vai melhorar. E, para isso, eu quero trabalhar.

Acredito que um emprego com carteira assinada seria a grande transformação. Precisaria também de uma creche, principalmente para meu filho mais novo. Os três estudam, mas meio período. E seria necessário ter onde deixá-los no resto do tempo.

O Globo