Crítica de Bonner a padre fake é inédita em debates
Foto: TV GLOBO
O terceiro debate com candidatos à Presidência das eleições 2022 aconteceu nesta quinta-feira, 29, na Rede Globo. O evento foi o último confronto dos presidenciáveis antes das votações para o primeiro turno, no próximo domingo, 2. Marcado por violação das regras, dobradinhas para defesa de ideias em comum e menção constante à corrupção, o debate teve como alvos principais o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e o presidente Jair Bolsonaro (PL).
Padre Kelmon (PTB) protagonizou alguns dos momentos mais tensos do confronto, ao interromper candidatos durante suas respostas e sendo reprimido pelo jornalista William Bonner, mediador do debate. Soraya Thronicke (União Brasil) foi o principal alvo dos ataques de Kelmon. Simone Tebet (MDB) manteve o bom desempenho na defesa de propostas para um eventual governo da emedebista.
Ciro Gomes (PDT) seguiu a estratégia de se posicionar contra a polarização, representada por Lula e Bolsonaro. Felipe d’Ávila (Novo) reiterou em diversos momentos suas propostas liberais e a favor da redução da presença do estado.
Para a editora da Coluna do Estadão, Mariana Carneiro, o ex-presidente Lula se preparou para o “ataque” no debate da Globo. Na avaliação dela, o petista elaborou perguntas sobre diferentes assuntos de maneira espontânea, rebateu acusações de corrupção, mas caiu em uma pegadinha do ‘padre candidato’, que provocou o ex-presidente. “Como debate na TV é mais briga do que proposta, destacou-se Padre Kelmon (PTB), controverso sacerdote que nesta eleição veste, além de uma roupa estranha, o figurino de linha auxiliar de Jair Bolsonaro (PL). Ele conseguiu tirar Lula do sério no terceiro bloco, quando o programa passava da meia-noite”, afirma.
A tensão do último debate antes do primeiro turno se transformou em agressões verbais pesadas a partir de uma fagulha, de acordo com Daniel Fernandes, editor e coordenador das Eleições 2022 no Estadão. “Propostas? Muito pouco. O debate era só polarização mergulhada em gasolina”, afirma.
Fernandes observa que Lula e Bolsonaro se tornaram alvos de questionamentos duros de Luiz Felipe d’Avila e Simone Tebet, respectivamente. “O candidato do Novo questionou Lula sobre corrupção, tema que perseguiu o petista em todo o encontro. Tebet, por sua vez, confrontou Bolsonaro com dados – negativos – sobre sua gestão ambiental”, apontou.
Com as discussões entre Kelmon e os outros candidatos, Daniel Fernandes considera que o debate deixou a tensão para se tornar “uma comédia da pior qualidade”, seguida pelo silêncio — ou a tentativa da produção de silenciar os bate-bocas. “A iniciativa (tática?) fez Kelmon ser advertido por Bonner de maneira veemente. Talvez algo inédito na história dos debates presidenciais realizados desde 1989. Bonner, em silêncio, tentava administrar o caos com visível incredulidade. Sua aparente indignação deveria ser a da população, que em vez de possivelmente vibrar nas redes sociais com as brigas, poderia exigir dos candidatos nas ruas mais propostas, mais projetos”, defende.
Colunista do Jogo Político, do Broadcast, Marcelo de Moraes acredita que o cenário de “vale-tudo” pode afetar o resultado das urnas no primeiro turno, aumentando o desinteresse dos eleitores. “Sob o risco de perder a eleição no primeiro turno, o presidente Jair Bolsonaro apostou suas fichas na tentativa de desgastar Luiz Inácio Lula da Silva para impedir a derrota antecipada”, explica.
A estratégia do chefe do executivo foi bombardear o petista com ataques, associando Lula com acusações de corrupção e travando o debate de propostas. “Cada acusação gerou um direito de resposta, que gerou outro direito de resposta, alimentando um bate-boca no lugar da apresentação de propostas, esquecidas ao longo do debate”, observou.
Rafael Cortez, sócio da Tendências Consultoria e doutor em Ciência Política, acredita que o último confronto entre presidenciáveis mantém aberta a possibilidade de vitória do ex-presidente Lula no primeiro turno. “O petista tem basicamente duas tarefas para conseguir a vitória de oposição em primeiro turno: convencer indecisos e cansados da polarização e especialmente, convencer ao comparecimento eleitoral”, analisa.
Já as opções do presidente Jair Bolsonaro são convencer o eleitorado do desempenho no seu governo ou aumentar a rejeição do petista, para evitar o voto útil. “O debate foi um fiel retrato da campanha presidencial. As alianças tácitas estiveram presentes, com alguma inflexão ideológica”, aponta.
Para Cortez, o debate pouco contribuiu para Bolsonaro reverter a imagem negativa e a rejeição ao seu governo. “O destino da eleição deve passar fundamentalmente pela taxa de comparecimento eleitoral”, conclui.