Mais pobres atribuem auxílio Brasil a Lula

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Foto: Miguel Schincariol/ AFP

O Auxílio Brasil continua sendo a principal aposta de Jair Bolsonaro (PL) para crescer nas pesquisas — sobretudo entre o eleitorado de menor renda. Além de prometer a permanência do benefício em R$ 600 caso reeleito, o presidente da República anunciou recentemente um “bônus” de R$ 200 para quem conseguir um emprego. As investidas, até agora, não deram certo: o candidato do PL não despontou nos levantamentos eleitorais como esperado. E dados da pesquisa “A Cara da Democracia” mostram que a tentativa tem gerado um efeito contrário ao desejado pela campanha: o aumento da percepção de que Luiz Inácio Lula da Silva (PT) criou o Auxílio Brasil.

Em julho, a pesquisa feita pelo Instituto da Democracia (IDDC-INCT) mostrou que 74% dos eleitores brasileiros afirmavam que Bolsonaro era o “responsável pela criação do Auxílio Brasil”. Outros 3% atribuíam a autoria ao ex-presidente Lula. E um quinto dos eleitores (21%) não sabia dizer. Passados dois meses, e faltando duas semanas para as eleições, o cenário é outro: agora, 14% afirmam que a paternidade do benefício é do petista — um aumento de 11 pontos percentuais em relação ao último levantamento. O universo de eleitores que apontam Bolsonaro como o autor do Auxílio caiu: de 74% passou para 57%, redução de 17 pontos percentuais. Outros 22% não souberam responder à pergunta.

Percentual dos que dizem que Bolsonaro criou Auxílio Brasil caiu em dois meses — Foto: Pesquisa "A cara da democracia", do Instituto da Democracia (IDDC-INCT)

A percepção de que o petista criou o Auxílio Brasil é maior entre os seus próprios eleitores: 21% dos apoiadores do ex-presidente citam o nome de Lula quando questionados sobre a paternidade do programa. O contrário também é válido. 72% dos que votam em Bolsonaro acreditam que a autoria do benefício é dele. A maioria (56%) dos eleitores de Ciro Gomes (PDT) dizem que criador do Auxílio foi o presidente da República, mas uma parcela acima da média (17%) cita Lula como responsável.

O aumento do percentual de pessoas que atribuem a Lula a criação do Auxílio Brasil não é a única má notícia para o presidente da República. A pesquisa também perguntou a opinião dos eleitores sobre o valor do Auxílio. A maioria (68%) acredita que irá diminuir. Apenas 10% acham que o valor vai aumentar e 20% não sabem dizer. Um percentual significativo, de 39% dos eleitores, ainda acredita que o montante atual não será mantido após as eleições de outubro.

Os resultados mostram que a estratégia petista de apontar o Auxílio Brasil como uma ação estritamente eleitoreira de Bolsonaro tem surtido efeito, afirma Sergio Simoni Junior, professor de ciência política e de políticas públicas da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS).

— Esse aumento da percepção de que Lula é o autor do Auxílio Brasil e de que o valor do benefício irá diminuir após as eleições é um efeito esperado do horário eleitoral. Agora, a oposição tem um canal para falar que Bolsonaro defendia um auxílio menor, ao contrário da bancada do PT, e que o valor de R$ 600 vai só até dezembro, já que Orçamento de 2023 enviado ao Congresso prevê um auxílio no valor antigo (valor médio de R$ 405) — afirma professor. — Temos uma disputa de enquadramentos discursivos que, na campanha, fica mais parelho entre governo e oposição. Fora do período eleitoral, o governo tem mais chances de ditar os assuntos do dia a dia.

Em um dos vídeos divulgados em suas redes sociais, Lula diz que “o povo tem que pegar esse dinheiro (do Auxílio) e, na hora do voto, dar um banana” para Bolsonaro e votar em alguém que faça as coisas “mais corretamente” no país. A ofensiva dos petistas contra o Auxílio, que é uma das principais apostas de Bolsonaro para alavancar os índices de popularidade, tem preocupado a campanha do candidato do PL, que chegou a ir à Justiça para excluir um vídeo em que o deputado André Janones (Avante) diz que o Auxílio Brasil vai acabar em dezembro. O pedido de remoção foi negado pela ministra Cármen Lúcia, do Tribunal Superior Eleitoral (TSE).

Apesar de Bolsonaro apostar suas fichas no Auxílio Brasil para crescer nas pesquisas, Sergio Simoni Junior afirma que a transformação de auxílios em votos não é automática nem mecânica como consequência de sua implementação.

O professor analisou os efeitos do Auxílio Emergencial na popularidade de Bolsonaro e concluiu que a relação entre receber o Auxílio Emergencial e avaliar positivamente o governo variou ao longo do tempo. Mesmo com a magnitude e impacto na vida de beneficiários, em alguns momentos, Bolsonaro não obteve dividendos positivos de popularidade devido à política de transferência.

—Nossa tese é que, durante a pandemia, Bolsonaro tinha uma relação dúbia com o Auxílio. Não foi o principal responsável pelo Auxílio e uma hora defendia o benefício, dizendo que estava ajudando a população, e depois era crítico, falando que não seria possível mantê-lo, caso contrário o país quebraria. Essa posição dúbia fez com que ele não tivesse muito retorno eleitoral — diz o professor da UFRGS, que ainda acrescenta. — O Bolsonaro não tem uma trajetória de defender essas políticas (de transferência de renda). Não é uma pauta dele. E isso ajuda a entender a dificuldade de converter o Auxílio em voto. As pessoas que recebem o Auxílio Brasil não votam de forma cega, não desconsideram o passado. Elas têm um contexto. E essa defesa do presidente do Auxílio Brasil não é muito crível. É uma mensagem forçada. Lula, por outro lado, é um político que fez por anos a defesa dessa política.

A pesquisa “A Cara da Democracia” mostra um amplo apoio da população ao Auxílio Brasil: 82% dos eleitores brasileiros se dizem favoráveis à medida. O percentual oscilou negativamente na comparação com o mês de julho, quando 85% apoiavam o benefício. Hoje, só 12% são contra a medida e 4% acham que depende do contexto. Cerca de um terço dos eleitores (33%) relata ter recebido o recurso este ano ou afirma viver com alguém que foi contemplado em 2022.

Feita pelo Instituto da Democracia (IDDC-INCT), a pesquisa entrevistou presencialmente 1.535 eleitores em 101 cidades de todas as regiões do país entre os dias 9 e 14 de setembro e foi contratada pelo CNPq e Fapemig. A margem de erro total é de 2,5 pontos percentuais para mais ou menos com índice de confiança de 95%.

O Globo