Campeão de votos, Boulos quer diálogo com centro-direita

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Foto: Bruno Santos/ Folhapress

Deputado federal de São Paulo com mais votos, Guilherme Boulos (PSOL) afirma que, apesar do avanço da direita, a esquerda também teve vitórias importantes no Congresso.

Ele cita a eleição de deputadas transexuais, indígenas e a expressividade da própria votação comparando-a com a de Eduardo Bolsonaro (PL). No Congresso, o novo parlamentar afirma que pretende reeditar em forma de lei políticas adotadas pelo movimento sem-teto.

Membro da campanha de Luiz Inácio Lula da Silva (PT), o psolista também afirmou que o apoio de Ciro Gomes à campanha de Lula é importante e minimizou o impacto da adesão de Rodrigo Garcia a Bolsonaro. Agora, diz, é importante dialogar com o eleitor da terceira via e com quem não foi votar no primeiro turno.

Qual a avaliação do impacto nacional e no estado após Rodrigo Garcia anunciar apoio incondicional a Tarcísio e Bolsonaro? O Rodrigo Garcia reeditou a farsa do BolsoDoria que nós tínhamos visto já há quatro anos. É lamentável que não entenda os riscos para a democracia. Agora está sofrendo questionamentos dentro do seu próprio partido, imagina do eleitorado. Não acredito que o eleitorado que votou no Rodrigo vá acompanhar essa decisão desastrosa.

Ciro Gomes, por sua vez, anunciou seguir a decisão do PDT de apoiar Lula, sem citar o nome dele e de forma tímida. Esse tipo de apoio ajuda? O Ciro declarou apoio ao Lula. E o PDT declarou apoio ao Lula. Isso é muito importante. Não apenas o Ciro, mas o partido que está capilarizado em nível nacional.

Acredito que houve uma antecipação de voto útil que diferencia as pesquisas de vésperas e as urnas. Quem era eleitor do Ciro ou da Simone [Tebet] propenso a votar no eleitorado já votou. Eu acredito que a maior parte do eleitorado de Ciro e Simone virá para o Lula.

Houve algum erro na campanha de Lula que tenha causado uma performance melhor de Jair Bolsonaro (PL) do que se esperava e há algo a se mudar? Eu entendo o nó na garganta e o sentimento das pessoas de frustração por não ter uma vitória no primeiro turno. Mas vamos lembrar que a esquerda nunca ganhou uma eleição no primeiro turno na eleição presidencial, mesmo quando o Lula saiu do governo com mais de 80% de aprovação. A campanha conquistou 57 milhões de votos, que foi a maior votação de um candidato em primeiro turno. O Lula está seis milhões de votos à frente do Bolsonaro. Então acho que seja o caso de correções de rota.

Eu acho que a nossa campanha vai ter que dialogar com eleitores que apostaram numa terceira via. Uma parte importante desses eleitores, embora não tenha Lula como primeira opção, rejeita Bolsonaro pelo governo trágico. E fazer um diálogo com eleitores que não foram votar. Uma parte expressiva da abstenção foi em regiões onde o Lula tem votação maior.

Bolsonaro também conseguiu apoios, incluindo do governador Romeu Zema (Novo), de Minas. Qual é o impacto desses apoios? Apoio do Zema e Cláudio Castro surpreende um total zero de pessoas. Ambos já estavam articulados com Bolsonaro desde o primeiro turno. Para não ter problema nos estados, não tinham declarado de maneira pública porque queriam puxar o eleitorado do Lula. Agora tanto o Cláudio Castro como o Zema já eram do time do Bolsonaro, isso não é nenhum apoio novo.

No estado, como avalia a estratégia de Haddad de centrar críticas em Rodrigo Garcia. Isso não ajudou Tarcísio? Quem está no governo é o Rodrigo Garcia. O Haddad é candidato de oposição. Não faz sentido fazer campanha sem questionar o governo do Doria e Rodrigo Garcia. Agora, o Haddad não poupou o Tarcísio, teve embates duros nos debates de televisão.

Existe alguma pauta do MTST (Movimento dos Trabalhadores Sem Teto) que o senhor pretende encampar prioritariamente como deputado? O centro do mandato que vou ter na Câmara vai ser combate à desigualdade, que é o maior drama brasileiro. Tem duas iniciativas que são muito importantes que o MTST já desenvolveu e eu quero levar para transformar em projetos de lei.

Uma é a política de cozinhas solidárias, movimento fez isso sem ter a caneta na mão, com apoio, doações, que está matando a fome milhares de pessoas pelo Brasil. A segunda é um programa de moradia popular, Bolsonaro acabou com o Minha Casa Minha Vida.

Movimentos de moradia tinham algumas críticas ao programa por excluir parte da população pobre e lançamentos para faixas salariais mais altas. Vale voltar o programa ou é preciso criar outro? Um novo programa de habitação tem que aprender com acertos e erros do programa anterior. Minha Casa Minha Vida construiu 5 milhões de casas, colocou subsídio para as famílias que mais precisavam.

Agora, a experiência que teve inclusive dentro do Minha Casa Minha Vida, que é o de entidades, movimentos sociais fazendo gestão direta das obras, em regime de mutirão, os futuros moradores poderem construir sua própria casa, é uma experiência que eu vou trabalhar para que seja valorizada.

A direita cresceu no Congresso nestas eleições, incluindo pessoas ligadas ao presidente. As pautas de esquerda defendidas pelo senhor não podem ficar inviabilizadas com essa composição? Não, se você olhar a bancada bolsonarista é minoritária no Congresso. É verdade que a direita elegeu nomes para o Parlamento, mas também é verdade que a esquerda teve vitórias importantes.

Quem imaginaria que um líder do movimento sem-teto, muito estigmatizado, seria o deputado mais votado de São Paulo, acima do filho do presidente? Quem imaginaria que se elegeria uma mulher negra trans ou duas mulheres indígenas, um pastor negro de esquerda? Então, eu não acho que a eleição para o parlamento significou somente uma força da direita, significou também uma força do elemento de renovação da esquerda.

O partido do senhor, o PSOL chegou a se dividir sobre o apoio a Lula, do mesmo campo ideológico. O senhor acha que o partido estaria disposto a negociar com o centrão em nome da governabilidade caso Lula seja eleito? O PSOL decidiu por uma maioria significativa o apoio ao Lula. Entrou de corpo e alma na campanha do Lula. Eu coordeno a campanha do Lula em São Paulo. O PSOL entrou na campanha do Fernando Haddad, apontando a unidade necessária para derrotar o bolsonarismo.

Certamente o PSOL vai estar comprometido com reconstrução do Brasil, que seja popular, que avance nos direitos sociais, mantendo a coerência com o que sempre defendemos, um projeto que sirva maioria a mais pobre. O programa do Lula propõe do teto de gastos, revogação da reforma trabalhista, uma reforma tributária com taxação das grandes fortunas.

Em nome de aliança mais ampla com a direita, essas políticas não podem acabar escanteadas? Eu não acho, porque hoje precisamos criar a frente democrática mais ampla para derrotar o pior governo da nossa história. O Lula também sabe perfeitamente que vai ser preciso uma resposta à situação de miséria que o Bolsonaro deixou o Brasil, com 33 milhões com fome, com desemprego alto, inflação, e tenho certeza que o Lula será presidente para cumprir esses compromissos.

A Câmara teve eleição de mulheres trans e indígenas, grupos que são alvo de violência, incluindo violência política. O senhor acha que esse tipo de situação pode se repetir no Congresso? O bolsonarismo forjou um ambiente de violência política muito preocupante no Brasil. Isso acontece nos espaços de poder, no Parlamento, isso acontece nas ruas, vimos três pessoas serem assassinadas durante a campanha por serem de esquerda. O primeiro passo para inibir a violência política é derrotar o Bolsonaro.

Durante um ato de campanha do senhor, um adolescente do MBL foi agredido por militantes. Uma reação assim não alimenta o clima de violência política? Eu não defendo nenhuma forma de agressão. Deixei isso muito claro quando aconteceu o episódio. Também ficou claro que houve uma armação por um grupo que usa táticas bolsonaristas como é o MBL de infiltrar uma pessoa se utilizando de um menor de idade para ir fazer provocação à nossa campanha e depois querendo criar um fato político junto com um policial militar bolsonarista.

Há um acordo para que o senhor seja candidato com apoio do PT à Prefeitura de São Paulo. Como o apoio de Rodrigo Garcia a Bolsonaro e uma eventual aliança do prefeito paulistano Ricardo Nunes (MDB) com esse grupo pode afetar o quadro para 2024? Meu foco está voltado em eleger o Lula e o Haddad. Agora é inacreditável a postura do Ricardo Nunes, um prefeito que a maior parte da cidade não conhece, por isso se utiliza desse desconhecimento fazendo uma gestão trágica e ainda se associando ao bolsonarismo ao lado do Rodrigo Garcia por um cálculo eleitoral mesquinho, antecipado de 2024.

Folha