Candidaturas LGB+ bombam em 2022

Destaque, Todos os posts, Últimas notícias

Foto: Estadão

20 candidaturas LGBT+ conquistaram cargos federais e estaduais nas eleições deste ano. O número representa a quebra do recorde nacional registrado em 2018, quando nove candidaturas foram eleitas no Brasil. Erika Hilton (PSOL-SP) e Duda Salabert (PDT-MG) foram as primeiras mulheres trans eleitas à Câmara de Deputados.

Os dados sobre o número de candidaturas foram coletados pela Aliança Nacional LGBTI+ e organizações parceiras. Segundo a Aliança, foram 355 membros da comunidade LGBT+ disputando as eleições neste ano, com 20 eleitos e 233 suplentes. Foram contabilizadas candidaturas de seis lésbicas, cinco mulheres e um homem bissexuais, quatro mulheres trans, dois gays e duas pessoas sem registro na fonte do cadastro quanto à identidade de gênero ou orientação sexual.

Para Toni Reis, diretor-presidente da Aliança Nacional LGBTI+, é um crescimento muito significativo, representando um trabalho que começou em 1986 — ano em que o Brasil registrou as primeiras candidaturas por candidatos autodeclarados homossexuais. Se na época nenhum candidato venceu o pleito, hoje o cenário é diferente, algo que Reis atribui às organizações humanitárias, movimentos sociais e representação na mídia. “Estamos vendo como uma grande vitória da visibilidade. Também quebramos o recorde de candidaturas lançadas e temos muitas pessoas na primeira e segunda suplência”, observa.

Consegui ir na rota contrária desse sistema político opressor, que me colocou em condições desumanas, e conquistar o reconhecimento e confiança das pessoas. Erika Hilton (PSOL-SP), eleita deputada federal por São Paulo

Em outro levantamento, a Organização Não-Governamental (ONG) VoteLGBT analisou autodeclarações feitas na sua plataforma pelos próprios candidatos às eleições deste ano. Segundo relatório da instituição, foram 317 membros da comunidade LGBT+ disputando as eleições neste ano, com 18 candidaturas eleitas. Dessas, 16 são mulheres e 14 delas são negras, representando a interseccionalidade de gênero, raça e orientação sexual. “É uma vitória do movimento das minorias para mostrar que, enquanto não tiver diversidade, não haverá democracia. Especialmente quando falamos do espaço legislativo, que se tornou um vazio a ser conquistado”, analisa Evorah Cardoso, pesquisadora e integrante do VoteLGBT.

Fábio Felix foi reeleito para deputado distrital no Distrito Federal com mais de 51 mil votos, se tornando o mais votado da história na unidade federativa. Felix acredita que foi um recado claro para conservadores de que há espaço para “construção de um novo projeto”. “Vamos continuar defendendo direitos humanos e direitos sociais com muita força e fazendo uma oposição firme à extrema-direita. Esse resultado histórico nas urnas prova que é isso que a população espera de nós, que sejamos um contrapeso no governo do DF”, afirma.

O deputado aponta que no primeiro mandato realizou iniciativas na área de direitos humanos, liderando comissões de combate ao feminicídio, racismo, LGBTfobia e capacitismo. “Vamos continuar defendendo esses direitos e, no novo mandato, o legado que pretendemos deixar é o combate à fome. No DF, mais de 300 mil pessoas estão em estado de insegurança alimentar”, aponta.

 

Eleita deputada federal em São Paulo, Erika Hilton vê a vitória nas eleições como fruto e conquista de uma luta dos movimentos sociais para repensar a política. Hilton foi eleita com 256 mil votos, ficando em 9º lugar na lista de vagas para a bancada paulista. “Consegui ir na rota contrária desse sistema político opressor, que me colocou em condições desumanas, e conquistar o reconhecimento e confiança das pessoas. Isso é mais que um mandato, é um projeto político de reparação, ocupação e resgate da cidadania desses grupos minoritários”, diz.

Em Minas Gerais, Duda Salabert conquistou 208 mil votos. “Fiquei feliz porque foi uma vitória histórica, coletiva e de direitos humanos. A vitória de pessoas travestis e transsexuais no Congresso Nacional significa ampliar o conteúdo democrático da sociedade brasileira”, afirma.

Duda deseja deixar no primeiro mandato um legado de políticas a serviço da justiça social, ambiental e climática. “Precisamos mostrar a relevância de o País voltar a discutir temas estruturais como moradia, emprego e educação, questões que nós, travestis e transsexuais, lidamos diariamente. A maior parte da nossa comunidade é expulsa de casa antes dos 13 anos, não concluiu o ensino médio e está na prostituição. Nossa luta cotidiana é atravessada por essas questões estruturais”, afirma.

O legado que Érika Hilton gostaria de deixar também vai de encontro a essas políticas: construir um programa de combate à fome, promoção de empregos e criação de políticas de habitação. “Eu me sentiria muito orgulhosa ao olhar para trás e ver que realizamos políticas públicas sérias de enfrentamento à miséria, fome, ausência de moradia digna e ao completo abandono da população de mulheres trans e travestis”, descreve.

Hilton ainda relata que apenas a eleição e a oportunidade de atuar no Congresso Nacional já é motivo de honra. “É uma sensação de vingança, por todas as travestis mortas, executadas a pauladas, por todas que foram jogadas nas ruas e não puderam compartilhar desse espaço. Me sinto honrando a memória delas. Isso para mim é grandioso, mostra que estamos avançando”, acrescenta.

Evorah Cardoso nota que a escalada do conservadorismo pode dificultar o mandato das candidaturas LGBT+. Aprovação de projetos, repasse de recursos eleitorais, iniciativas de inclusão política e impunidade por LGBTfobia são algumas das instâncias mais prejudicadas, segundo Cardoso. “Se torna um projeto institucional e estrutural de violência política pelos partidos, isso pode ser extremamente prejudicial”, nota.

A pesquisadora também observa que esses fatores impactam na candidatura de pessoas LGBT+ em partidos de centro e direita. No primeiro turno somente candidaturas de esquerda conseguiram se eleger. “Sabemos que existem LGBTs na direita e é essencial que os partidos olhem para essas pessoas, criando políticas de inclusão”, ressalta.

Estadão