Lula aposta em conquistar evangélicos
Foto: Ricardo Stuckert
O plano de produzir uma carta direcionada ao público evangélico está dividindo o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e integrantes de sua campanha. O presidenciável resiste ao gesto, defendido por aliados como necessário para avançar no segmento em que o presidente Jair Bolsonaro (PL) encontra ampla maioria. Os petistas divergem também sobre o melhor formato da eventual mensagem: carta, vídeo ou transmissão ao vivo.
A campanha estima que Lula tenha obtido 11 milhões de votos de evangélicos e enxerga margem para crescimento. Avalia que os indecisos desse setor vêm sendo influenciados por “fake news” sobre Lula. Muitos estão nas classes sociais menos favorecidas, vulneráveis à crise econômica, e perderam parentes e amigos durante a pandemia, pontos sensíveis que poderiam favorecer uma adesão ao ex-presidente.
Uma ala do entorno de Lula questiona o efeito prático da iniciativa por entender que não será suficiente para conquistar um apoio representativo. Além disso, lembra que há outra estratégia em curso, por meio da atração desse eleitorado por meio de pautas sociais e econômicas.
Pastores ligados à campanha defendem uma carta em que Lula pregue defesa clara à liberdade religiosa, se comprometa a não levar ao Congresso projetos de lei que alterem normas de valores cristãos, como a flexibilização para as regras do aborto. Também pedem uma posição sobre a prevenção às drogas.
A elaboração do texto passa pela presidente do PT, Gleisi Hoffmann, a ex-ministra Marina Silva, pelo ex-ministro Gilberto Carvalho e os pastores Sergio Dusilek e Ariovaldo Ramos. Dusilek enviou para Gleisi uma sugestão com sete promessas a serem feitas por Lula, entre elas um “pacto pela vida”, em que ele se diria contra o aborto, e o compromisso de não fechar nenhum templo evangélico ou católico.
Inicialmente contra a carta, Dusilek agora entende que o momento da campanha exige do partido um posicionamento enfático. O pastor defende que a carta tenha um caráter pessoal de Lula para gerar empatia entre os religiosos.
— As igrejas viraram diretório de partido, o que não faz o menor sentido. O nível está escalando de um tal jeito que infelizmente uma carta é necessária. Por mais que o ex-presidente evite, o furacão é mais forte e está trazendo o PT para dentro — justifica Dusilek.
Reservadamente, pastores ligados ao PT admitem que a campanha demorou a agir junto aos evangélicos. Embora o PT mantenha perfis e produza conteúdos voltados especificamente para religiosos nas redes sociais, internamente, admite-se que ainda há muito a melhorar.
Em boa parte da primeira fase da corrida presidencial, o PT foi refratário a ações específicas para os evangélicos, sob argumento de tentar manter a pauta religiosa distante da campanha. A estratégia era ganhar votos apresentando propostas sobre economia, fome e desemprego.
Senador eleito pelo Piauí e um dos coordenadores da campanha, Wellington Dias diz que a bola está com Lula:
— Está sendo analisado, depende dele (do Lula), é uma questão de religião, de fé. Ninguém pode obrigá-lo, não é uma estratégia eleitoral simplesmente, é preciso que haja um convencimento ao próprio Lula. Até semana passada, ele mantinha uma posição de não fazer. Mas o fato é esse, a gente precisa lidar com esse tema e o maior desafio da eleição é a mentira — afirma.
Evangélica, a senadora Eliziane Gama (Cidadania-MA) foi uma das responsáveis por tentar convencer o ex-presidente a ceder. Filha de pastor e integrante da Assembleia de Deus, a parlamentar defende um texto incisivo para conter os prejuízos a informações falsas que circulam entre os religiosos, como a de que Lula, se eleito, fechará Igrejas e obrigará meninos e meninas a usarem o mesmo banheiro nas escolas.
Eliziane foi chamada pela campanha para aproximar Lula de religiosos. Ambos estiveram juntos em São Paulo na semana passada, quando o petista chegou a dizer publicamente que não faria uma carta para cada segmento da sociedade. Ao conversar com a parlamentar, Lula argumentou que o Brasil o conhece, que não via necessidade de carta pois todos sabem sua postura em relação aos evangélicos. Acabou, no entanto, convencido do contrário, segundo a senadora:
— Nós apresentamos a necessidade dessa carta compromisso para derrubar uma série de fake news que está sendo apresentado em todo Brasil e cria um clima de certa tensão entre os evangélicos. Com alguns pontos, que são até impossíveis, como fechamento de templos e igrejas — disse a senadora a Globo News nesta segunda-feira.