Lula prepara declaração de responsabilidade fiscal

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Foto: Edilson Dantas/Agência O Globo

Lula e Tebet já conversaram sobre a situação fiscal, mas a proposta do futuro governo, caso seja eleito, ainda está sendo calibrada, segundo interlocutores de ambas as equipes. Por um lado, o PT diz que não há clareza sobre a desordem provocada por Bolsonaro no Orçamento de 2023 e isso dificulta a apresentação de qualquer projeto. Por outro, Tebet diz que é preciso respeitar a decisão do ex-presidente de ter uma nova âncora que não seja o teto de gastos. Uma coisa parece certa, segundo relatos da senadora: Lula está comprometido a repetir os resultados de seus dois governos, ou seja, fechar com as contas no azul, que é o que importa.

No PT, existe o incômodo com a pressão feita pelo mercado por uma proposta fiscal. Primeiro, porque Bolsonaro também não apresentou projeto e ainda destruiu o arcabouço atual, criado no governo Temer. Segundo, porque acredita que houve evolução no debate entre economistas liberais no mundo, sobre a relação entre estímulos e inflação, e o Brasil ficou para trás.

Sobre o primeiro ponto, o partido tem razão, de acordo com a economista Monica de Bolle, a única brasileira a integrar os quadros do Peterson Institute, um dos principais think tanks americanos e referência no debate econômico liberal. Sobre o segundo, ela explica que, de fato, muita coisa mudou desde a crise financeira internacional de 2008, mas isso não significa que os governos ganharam uma licença para gastar.

— Muita gente achava que a combinação de estímulos fiscal e monetário iria levar a uma crise inflacionária. Qualquer livro básico de economia mostra isso. Mas, evidentemente, o mundo é muito mais complicado do que um gráfico de oferta e demanda. A conclusão é que essa relação depende mais do contexto do que antes se supunha — explicou Monica.

No cenário atual, a inflação no mundo subiu, mas, além dos estímulos, houve dois choques de oferta, diz. Primeiro, com os problemas nas cadeias de suprimento, provocados pela pandemia. Depois, com a guerra na Ucrânia e os efeitos sobre o setor de energia. Ela entende que o Brasil precisa reequilibrar as contas, mas concorda com o PT de que há histeria no mercado.

—Primeiro, é preciso saber o tamanho do buraco das contas públicas antes de se formular qualquer proposta. Esse é o ponto de partida. E é bom lembrar que este governo pode fazer terra arrasada caso seja derrotado. O quadro pode piorar muito e ainda há demandas fortes por gastos em várias áreas, principalmente no combate à fome — defendeu.

Monica esteve entre os críticos de primeira hora do teto porque a regra não tinha flexibilidade para períodos de crise. Acha que Lula está ampliando alianças e isso terá reflexo no seu programa. O mercado, diz, irá reclamar agora, mas se adaptar depois. O risco maior está no enfraquecimento da democracia, em caso de reeleição de Bolsonaro. Essa é sua preocupação.

O governo conseguiu derrubar artificialmente a inflação pelo terceiro mês seguido, como mostrou ontem o IBGE. O IPCA teve deflação de 0,29%, em linha com o esperado. O problema para a estratégia eleitoral de Bolsonaro é que a redução dos preços ficou muito concentrada nos itens de energia, que tiveram redução de impostos. Como mostra o gráfico ao lado, no acumulado do ano os alimentos continuaram pesando fortemente sobre o bolso dos brasileiros. Enquanto o índice de inflação subiu 4,09% até setembro, a inflação de alimentos disparou 10,89%. O leite longa vida caiu 13% em setembro mas acumula alta de 50% no ano.

Inflação de alimentos — Foto: Editoria de Arte

Os economistas liberais cobram o PT mas não condenam a intervenção do governo na Petrobras. A estatal está sendo usada para fins políticos, sob as asas de Paulo Guedes — assim como a Caixa. Os preços dos combustíveis estão com defasagens de 8% na gasolina e de 10% no diesel, segundo a associação de importadores, mas a ordem de Brasília é clara: segurar os reajustes até as eleições. Caio Paes de Andrade veio direto da equipe do ministro da Economia para a presidência da empresa, atropelando regras de compliance e a Lei das Estatais.

O Globo