Alckmin ainda sofre resistências no PT

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Foto: Cristiano Mariz / Agência O GLOBO

Aliado improvável até um pouco antes da campanha eleitoral, o ex-governador e vice eleito Geraldo Alckmin (PSB) foi alçado a protagonista da transição por Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e, na visão de pessoas próximas e integrantes do grupo, deverá assumir a função de “gerentão” do terceiro mandato do petista.

Desde a instalação do gabinete, do qual é o coordenador-geral, Alckmin tem sido elogiado por colegas pelo seu perfil executivo, reconhecido inclusive dentro do núcleo duro do PT. Por outro lado, setores do partido veem com desconfiança o destaque dado ao ex-tucano, temendo a possibilidade de o vice se cacifar como sucessor de Lula em 2026, o que poderia inviabilizar nomes da própria sigla.

Petistas também acreditam que, mais cedo ou mais tarde, haverá conflitos por visões antagônicas que o político de centro possui em relação à legenda em áreas como economia, segurança pública e agricultura.

Não foi por acaso que, em sua primeira visita a Brasília, há dez dias, Lula fez questão de dizer que Alckmin “não disputa vaga de ministro”. O recado era uma tentativa de acalmar integrantes do PT. Dentro do partido, a decisão de dar a ele o comando da transição gerou antipatia de alas mais à esquerda, especialmente pelo trauma da legenda com o vice de Dilma Rousseff, o ex-presidente Michel Temer (MDB), considerado por ela como um dos articuladores do seu impeachment, em 2016.

Diferentemente de Temer, indicado ao cargo como uma escolha do seu partido e relegado a “vice decorativo”, Alckmin foi convidado para comandar a transição pelo próprio Lula. O vice comentou com aliados ter considerado o gesto uma “demonstração de extrema confiança” do presidente eleito, a quem teria prometido retribuir com lealdade e trabalho.

Auxiliares que o acompanham desde a época em que era governador de São Paulo afirmam que ele está mergulhado no projeto e animado com a nova vida. Dedica pelo menos 16 horas por dia à transição e combina com o petista cada passo.

Os dois conversam diariamente por telefone, mesmo na última semana, quando Lula viajou ao Egito para participar da Conferência do Clima, a COP 27. Nas ligações, informa o chefe sobre o dia a dia no CCBB e o andamento das negociações da PEC da Transição no Congresso.

Neste processo, contou com a linha direta que mantém com o presidente do Congresso, Rodrigo Pacheco (PSD-MG). Ambos são aliados desde 2018, quando Pacheco, candidato ao Senado, subiu no palanque do então presidenciável Alckmin em Minas.

A pessoas próximas, Pacheco afirma que enxerga o vice de Lula como um facilitador do diálogo e alguém que teve papel importante nas discussões da PEC. Foi ao senador que Alckmin recorreu quando enfrentou o primeiro ruído com a equipe de transição. Após o ex-ministro Guido Mantega enviar uma carta ao Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) pedindo o adiamento da eleição ao comando do órgão, numa tentativa de inviabilizar a candidatura do economista Ilan Goldfajn, Alckmin ligou para Pacheco, que no mesmo dia manifestou nas redes sociais seu apoio à indicação do brasileiro. Na ocasião, Mantega havia sido recém-escalado para o núcleo de Planejamento da transição, posto do qual abriu mão na sexta-feira.

Na leitura de um auxiliar, Alckmin faz o estilo “operário padrão”: pega a tarefa e coloca para funcionar. O modo de trabalho também tem ajudado a manter uma relação azeitada com dois petistas com quem tem dividido decisões estratégias da transição: a presidente do PT, Gleisi Hoffmann, e o ex-ministro Aloizio Mercadante, a quem aliados atribuem uma personalidade difícil. O trio é responsável por fazer um pente-fino em todos os quase 300 nomes anunciados até agora para participar da transição.

— Nossa relação está excelente, temos trabalhado juntos, produzido juntos, dividido responsabilidade juntos. Ele é uma pessoa de trato fácil e tem se dedicado bastante. Estamos desde a campanha trabalhando o dia inteiro juntos, viajávamos juntos. Está dinâmico, construtivo e agradável o trabalho com ele — disse Mercadante ao GLOBO.

No cotidiano da administração do novo governo, a expectativa é que Alckmin assuma um papel que possa ter influência em todos os ministérios, com um perfil executivo do dia a dia do governo, enquanto Lula terá um papel mais institucional, atuando como o chefe de Estado que irá viajar o mundo para reconstruir as relações do Brasil com o mercado internacional, pacificar a relação entre as instituições e focar no combate à fome e à miséria.

Em público, Alckmin se define como o “copiloto” de Lula. Integrantes da transição, no entanto, já o enxergam como um coringa do petista. Embora o presidente eleito tenha indicado não pretender colocá-lo em um ministério, há uma leitura de que caso em alguma das pastas não haja consenso, Alckmin surgirá como opção. Um desses casos poderá ser o Ministério da Defesa, para o qual Lula busca alguém que, ao mesmo tempo, seja alinhado ao governo eleito e tenha uma boa relação com as Forças Armadas.

Petistas, no entanto, admitem que ao assumir o comando da transição, Alckmin deverá ter um papel mais executivo no futuro governo e que seria um desperdício colocá-lo na Defesa. O vice eleito é visto como versátil tanto na articulação política quanto na coordenação de um grande programa de infraestrutura.

A aposta nos bastidores da equipe de transição é que Alckmin poderá assumir no governo papel semelhante ao que ao ex-ministro José Dirceu teve no primeiro governo e Dilma Rousseff, no segundo. A depender do seu desempenho até a data da posse, acreditam ser possível que o presidente eleito o coloque para gerir seu programa de infraestrutura, uma espécie de novo Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). Ao lançar Dilma à sua sucessão, Lula lhe deu a alcunha de “mãe do PAC”.

Aliados de Alckmin desde a época de Palácio dos Bandeirantes, porém, refutam a comparação e lembram que ambos os casos não acabaram bem. Dirceu foi preso e condenado em dois escândalos de corrupção — mensalão e Lava-Jato —, enquanto Dilma sofreu impeachment após perder o apoio de sua base aliada no Congresso.

O Globo