Ex-ministro da Defesa diz que militares não querem confusão

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Foto: Estadão

Ex-ministro das Relações Exteriores das gestões de Luiz Inácio Lula da Silva e Itamar Franco e ex-ministro da Defesa de Dilma Rousseff, Celso Amorim disse ao Estadão que, após a saída do presidente Jair Bolsonaro (PL), os “ataques antidemocráticos” serão página virada. “Isso não vai prevalecer. Eles (militares) querem olhar para o futuro. Todos querem olhar para o futuro. É página virada. A própria eleição virou isso para trás”, afirmou.

Os militares fazem parte de um dos grupos que mais ficaram em evidência durante a gestão de Bolsonaro na Presidência. Além do Ministério da Defesa, pasta que Lula já avisou que vai escolher um nome civil, integrantes vindos das Forças Armadas chegaram a comandar, durante o atual governo, pastas como Minas e Energia e Saúde, além de estatais como Correios e Petrobras.

Desde o fim do período eleitoral, apoiadores radicais de Bolsonaro estão acampados em quartéis pedindo, entre outras coisas, a anulação da eleição de Lula – em outra frente, mais de mil protestos com interdição parcial ou total de estradas foram desfeitos pela Polícia Rodoviária Federal (PRF). Em relação a isso, os militares optaram por adotar uma postura dúbia. Como antecipou o Estadão, em 11 de novembro, os comandantes do Exército, Marinha e Aeronáutica declararam ser a favor do direito de manifestação, mas pregaram contra “excessos”. Já o general Eduardo Villas Bôas, ex-comandante do Exército, foi além e elogiou os bolsonaristas que atacam o resultado das urnas e as instituições do Judiciário, ressaltando a “incrível persistência” deles.

Amorim não vê os gestos com preocupação e avalia que o comando das Forças Armadas respeita as instituições democráticas. “Ele (Villas Bôas) já é uma pessoa da reserva há muito tempo, não tem nenhum sentido mais, não tem mais peso. Pode ser respeitado por alguns, admirado, mas não tem peso”.

Até agora, o nome mais cotado para chefiar o Itamaraty é o do embaixador Mauro Vieira, que foi ministro das Relações Exteriores no governo Dilma Rousseff. Ministro das Relações Exteriores durante todos os oito anos dos governo anteriores de Lula e integrante do grupo de relações internacionais da transição, Amorim evitou falar em nomes para o cargo, mas disse que, independente de ser ou não diplomata de carreira, precisa ser alguém que entenda da área.

Leia a entrevista:

Como tem sido o diálogo com o atual governo? Nas conversas que teve com o senhor, o chanceler Carlos França se mostrou disposto a ajudar?

Foi uma conversa cordial, amistosa, ele teve uma atitude positiva, republicana, veio me visitar aqui em São Paulo, facilitando o trabalho de transição do ponto de vista administrativo. Nós já temos pessoas lá (na equipe de transição) designadas pela comissão para atuar lá dentro (do Itamaraty), não para tomar decisões, mas para se informar, para ver orçamento, essas coisas.

Qual será o perfil do novo ministro das Relações Exteriores? Será necessariamente um diplomata de carreira?

Não sou eu que decido isso. Não é o grupo de trabalho (da transição) que decide isso tampouco, é o presidente. O perfil tem que ser de uma pessoa competente, que entenda de relações internacionais.

O senhor pode voltar a ser o chefe do Itamaraty?

Não sei. Quem julga isso não sou eu.

Como avalia a eleição de Ilan Goldfajn para comandar o BID?

Aquilo ali o Brasil adotou a posição que podia adotar. Não tinha que sair correndo apoiando, o candidato já tinha sido apresentado pelo outro governo (foi indicado pelo governo Bolsonaro). Também não vetamos. Acho que o Tesouro americano tinha muito interesse na eleição dele e ele ganhou. Não levantamos objeções.

Mas o ex-ministro da Fazenda Guido Mantega chegou a anunciar que o governo eleito poderia escolher outro nome.

Nome brasileiro não teve. Não sei, não posso falar pelo Mantega. Não tive nenhuma instrução do presidente nesse sentido. A única instrução do presidente foi que pudéssemos buscar o mais amplo consenso latino-americano com qualquer nome.

Além do grupo de relações internacionais, o senhor também vai fazer parte do grupo de Defesa na transição?

Não sei, vão nomear ainda. Às vezes me surpreendem, eu não sabia nem que eu ia fazer parte do grupo de relações internacionais e me colocaram, mas a Defesa, não sei.

Bolsonaro instrumentalizou as Forças Armadas e há hoje uma relação conturbada de militares com o PT. O general Villas Boas chegou a incentivar protestos contra a eleição de Lula. Isso pode ser superado?

Tudo na política é delicado. Isso não vai prevalecer. Eles querem olhar para o futuro, todos querem olhar para o futuro. É página virada, isso ficou para trás, a própria eleição virou isso para trás. Ele (Villas Boas) já é uma pessoa da reserva há muito tempo, não tem nenhum sentido mais, não tem mais peso. Pode ser respeitado por alguns, admirado, mas não tem peso. Nas Forças Armadas o que interessa é o Alto Comando.

Estadão