Governador do PR diz que direita substituirá extrema-direita

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Foto: Edilson Dantas

Reeleito governador do Paraná em primeiro turno com 69% dos votos válidos, Ratinho Jr. (PSD) acredita que a direita sai fortalecida das eleições deste ano, mesmo com a derrota de Jair Bolsonaro (PL). Em entrevista ao GLOBO, ele vincula Bolsonaro à “extrema-direita” e defende a oxigenação de líderes para as próximas eleições. “Se serei eu, não sei, mas alguém nós vamos ter que apresentar para ser uma alternativa no futuro”, afirma Ratinho Jr., que faz elogios à nova geração de governadores, citando nomes como Eduardo Leite (PSDB), Romeu Zema (Novo) e Tarcísio de Freitas (Republicanos). O governador ainda critica a possibilidade de o presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva (PT) não respeitar o teto de gastos e afirma que os recados do novo governo, até agora, não estão sendo bons.

Como será a sua relação com o novo governo?

Institucional. Eu não sou do grupo do PT, meu candidato perdeu a eleição e nós temos que ter uma relação institucional, respeitosa. O estado do Paraná é um estado forte. Ontem, o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) divulgou o PIB (Produto Interno Bruto) dos estados, nós passamos o Rio Grande do Sul e agora somos a quarta economia do país. Naturalmente, qualquer presidente da República tem que ter um bom relacionamento institucional conosco.

O senhor já conversou com o presidente Lula?

Não. Tive um café da manhã com o vice-presidente eleito (Geraldo) Alckmin na quarta-feira da semana passada. Foi uma conversa tranquila, o vice-presidente Alckmin é muito fácil de lidar, uma pessoa extremamente gentil.

Qual é a sua avaliação sobre o início da transição do governo Lula?

Me preocupa muito a questão econômica, de não respeitar o teto de gastos. Talvez um dos grandes ativos que a gestão pública brasileira teve foi a responsabilidade fiscal conquistada na década de 1990. A gente abrir mão desse ativo que não deixa gastar mais do que se pode pagar é algo que tem que ter muito cuidado. Possivelmente, eles (da equipe do Lula) devem ter alguma análise disso aí, vão aprofundar com a sociedade, porque, por enquanto, do que a gente está ouvindo, os recados não estão sendo bons, né? E o que tira as pessoas da pobreza é o emprego. Esse é o maior programa social. Se a economia não vai bem, você não tem uma geração de emprego. Eu acho que tem que ter essa cautela neste momento para não assustar quem gera riqueza, que são aqueles que geram emprego.

O PSD será base do governo Lula. O senhor concorda com a decisão? Foi consultado?

Fui consultado. Eu falei para o presidente (Gilberto) Kassab: eu perdi eleição, eu não tenho como ser base desse desse governo, né? E os deputados que são da nossa bancada aqui do estado do Paraná dificilmente vão ter tranquilidade em votar (com o PT) pois todos estiveram do outro lado da trincheira. Mas eu também não sou o dono do partido. Quem decide isso é a maioria. O PSD nacionalmente ficou muito dividido.

O senhor preferiria que não fosse base?

Eu preferiria que ficasse independente. Vejo que o PSD tem uma megaoportunidade de se consolidar como o partido de equilíbrio do Brasil.

Bolsonaro segue como o principal líder da direita no país?

Acho que tudo é muito cedo. Mas, claro, pela votação que ele teve e por ter sido presidente, ele sem dúvida alguma vai ser um ator muito importante nesse processo. Apesar de achar que ele acaba ainda ficando uma extrema-direita. Talvez possa surgir num cenário aí no futuro uma centro-direita, um personagem que ocupe esse espaço com mais cautela, (de forma) mais ponderada no processo.

Como a direita sai das eleições? Está enfraquecida?

Eu acho que aqui a direita saiu muito fortalecida dessa eleição. A direita do Brasil, em tese, não existia. Ou ela não tinha uma organização. Hoje, as pessoas entendem o que é direita, esquerda, centro, centro-direita, centro-esquerda. A população passou a compreender melhor esse esse tabuleiro político. Penso que a direita brasileira, muito pelo contrário, se fortaleceu. O fato de não ter uma vitória eleitoral não significa que não teve uma vitória política. (…) O espectro da centro-direita vai ser organizado, vai ocupar espaço, e vai fazer um contraponto daquilo que entendemos que porventura possa acontecer, (como o novo governo) impor o caminho que os países de esquerda estão tomando na América do Sul em especial.

O que achou da postura do presidente após a derrota, de não cumprimentar Lula após a vitória?

É uma questão pessoal dele, cada um tem sua visão. Até onde tenho acompanhado, (Bolsonaro) autorizou a transição logo nos dois primeiros dias depois da derrota. (…) A parte institucional ele está fazendo.

E as manifestações contra o resultado das urnas?

Manifestação, se não tiver violência, é uma manifestação, faz parte da democracia. Como a gente já viu por décadas muitas manifestações do outro campo também. Faz parte do show. É um direito do cidadão brasileiro falar que não está feliz com o que aconteceu. Eu respeito. Claro que parar rodovias não é o caminho, isso já foi inclusive pedido pelo próprio presidente da República e foi, de certa forma, respeitado.

O senhor cogita uma candidatura presidencial?

Todos aqueles que tentaram fazer isso iniciando um mandato não se deram bem. (…) Minha preocupação hoje é governar bem o meu estado. Esse é meu objetivo. E o futuro a Deus pertence. Acho que o Brasil deve ter, até para fortalecer a democracia, outros atores para poder colaborar com o país. Eu estou com 41 anos e há 36 anos o mesmo candidato é o Lula. Não estou dizendo que ele é ruim ou bom, acho até que ele é um talento político, pois está há tantos anos aí. Mas é bom para minha geração, para o Brasil e para a política não ter uma oxigenação de líderes? Ou ficar dependente de um ou dois líderes do país? É uma avaliação que faço como cidadão. Se vai ser eu, não sei, mas alguém nós vamos ter que apresentar para o país para ser uma alternativa no futuro.

Que nome é bom para ser essa alternativa?

O Brasil tem vários nomes, tem uma geração muito boa de governadores. (Romeu) Zema (Minas Gerais), Tarcísio (de Freitas, de São Paulo), Eduardo Leite (reeleito no Rio Grande do Sul), Mauro Mendes (governador do Mato Grosso), Gladson (Cameli, reeleito no Acre). O Brasil está bem servido de bons gestores, vamos ver qual aquele que terá melhores condições de apresentar um projeto para o país.

O senhor não rejeita essa possibilidade, então?

Eu penso o seguinte: qualquer cidadão que ama o seu país teria a honra de ser candidato a presidente da República. Ter a honra e ser é muito distante, há muitas variáveis. Tem o partido, tem que conspirar o ambiente político para criar esse espaço. Confesso que isso não me embriaga. É um processo natural no futuro que pode ser daqui quatro, dez, 20 anos ou pode não ser.

Quais demandas pretende levar do Paraná ao Lula?

Um dos assuntos é a Ferroeste, um corredor de 1,3 mil quilômetros que liga Maracaju (MS) até o porto de Paranaguá, no Paraná. Ele vai atender o grande setor produtivo do nosso estado, do Mato Grosso do Sul e do oeste catarinense. É um projeto no qual que investimos R$ 40 milhões e está pronto para ir para a Bolsa de Valores, precisamos só da licença prévia que está no Ibama sendo analisada. Se houver boa vontade do governo federal, em poucos dias do início do mandato do presidente Lula conseguimos fazer com que esse projeto saia do papel, até porque é uma concessão do estado.

Como ficou a sua relação com o senador eleito Sergio Moro, após não ter apoiado o ex-juiz na eleição, e sim o então candidato Paulo Martins?

Eu assumi o compromisso com o nome de consenso com o presidente Bolsonaro, que era o Paulo Martins. Quando eu assumi o compromisso, Moro estava tentando viabilizar a candidatura em São Paulo, e o União Brasil já estava na minha base. E quando ele resolveu ser candidato pelo Paraná, eu fui muito franco com ele e com o presidente do partido pelo seguinte: se vocês quiserem manter aliança comigo, nós vamos manter, mas eu tenho a minha palavra e um compromisso com Paulo Martins e vou ter que pedir voto para ele. Eles compreenderam, foi um jogo limpo e por isso não ficou nenhum tipo de mágoa. Eu falo com ele (Moro), já estamos construindo pautas de interesse do estado do Paraná para Brasília, agora é tocar a vida.

O que explica a derrota do senador Alvaro Dias, que até buscou aliança com o senhor, após tantos anos?

Alvaro é uma pessoa que tem uma história linda na política paranaense, fez um histórico aqui desde a década de 1960 e o povo do Paraná tem muito respeito por ele. Mas penso que talvez a população chegou num momento que queria oxigenar, dar oportunidade para outras pessoas, acho que foi isso, não é um voto contra ele.

Qual marca quer deixar neste segundo mandato?

Consolidar o Paraná como o estado mais sustentável do Brasil. Já fomos eleitos duas vezes pelo ranking de competitividade dos estados e fomos referência pela OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico) em julho do ano passado como região referência para a sustentabilidade do mundo, ao lado de uma província do Japão. Então, nós queremos consolidar isso de forma muito forte. Nós temos um projeto que já começamos no primeiro mandato de transformar o Paraná na central logística da América do Sul. Nós somos o centro de 70% do PIB produzido na América do Sul. Queremos consolidar esse projeto logístico que nós temos no estado e consolidar como a melhor educação no Brasil, que fomos eleitos pelo Ideb (Índice de Desenvolvimento da Educação Básica) neste último levantamento.

O Globo