Partidos pró-Bolsonaro flertam com governo Lula

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Foto: Cristiano Mariz/O Globo

A 40 dias da posse de Luiz Inácio Lula da Silva (PT), o Republicanos, partido da base de apoio do atual governo e que esteve coligado a Bolsonaro na eleição, fez um aceno ao petista ao anunciar a disposição de dialogar e colaborar no Congresso com o próximo titular do Planalto. No mesmo dia, o vice-presidente eleito, Geraldo Alckmin (PSB), formalizou o ingresso de 74 parlamentares de 12 legendas diferentes na equipe de transição e, com isso, abriu as portas do governo provisório a siglas que podem dar sustentação a Lula no Congresso a partir de 2023.

Com a nova leva de deputados e senadores anunciados, já são 103 congressistas, entre membros da atual legislatura e recém-eleitos, incorporados ao grupo de trabalho. As cadeiras da transição estão sendo usadas para formar um arco de alianças capaz de garantir governabilidade a Lula. Apesar disso, até agora, o PT é a sigla que tem o maior número de integrantes no governo provisório: 41% dos nomeados, o que tem desagradado a outras siglas que negociam com os petistas. O desafio dos aliados de Lula agora é atrair ao menos uma parte dos partidos que estão com o presidente Jair Bolsonaro (PL), daí a importância da recente manifestação do Republicanos, que tem uma bancada eleita de 41 deputados.

Parlamentares na transição — Foto: Editoria de Arte

O movimento da legenda se deu por meio de uma nota divulgada pela bancada do partido no Congresso. O texto informa que o Republicanos decidiu adotar posição de independência ao futuro governo, mas “sem se negar ao diálogo e à colaboração”. No mesmo comunicado, confirmou o plano de apoiar a reeleição do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), ao comando da Casa. Filiado a outra sigla da base de Bolsonaro, Lira já abriu conversas com o PT. A nota diz ainda que a reunião foi comandada pelo presidente do Republicanos, o deputado Marcos Pereira (SP).

O partido, ligado à Igreja Universal, abriga alguns dos principais representantes do bolsonarismo, como a ex-ministra do atual governo e senadora eleita Damares Alves (DF), o vice-presidente e senador eleito, Hamilton Mourão (RS), assim como o próximo governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas. O Republicanos informou que a decisão foi tomada por unanimidade. O GLOBO apurou, contudo, que integrantes da legenda ligados a Bolsonaro eram favoráveis a que a sigla se declarasse oposição ao futuro governo.

Ao GLOBO, Damares afirmou que, apesar do texto divulgado na nota oficial, ela fará uma dura oposição a Lula no Senado, “independente” da postura do partido:

— Sendo meu partido independente ou não, farei questão de lembrar aos brasileiros que o presidente eleito não foi absolvido de suas condenações e continua condenado por corrupção.

A ex-ministra disse ainda que a reunião da bancada evidenciou que o Republicanos é “ mais conservador de todos os partidos”.

Presidente da legenda, Marcos Pereira mantém canal aberto com algumas das principais lideranças petistas, como a presidente do PT, a também deputada Gleisi Hoffmann. Além disso, as duas siglas já caminharam juntas no passado. O vice-presidente de Lula durante os seus dois primeiros mandatos, o empresário José de Alencar, foi filiado ao Republicanos, que se chamava PRB à época.

A legenda comandada por Pereira também ocupou ministérios durante gestões petistas, como o da Pesca e dos Esportes, no governo de Dilma Rousseff. Em 2016, o partido foi o primeiro da base do governo a romper com a petista e entregar os cargos na administração pública. Em 2019, a sigla mudou de nome sob o pretexto de deixar para trás a aliança com a esquerda e se diferenciar por ser um partido conservador.

A posição adotada pelo Republicanos nesta terça-feira foi encarada por aliados de Lula como uma sinalização positiva. Parte deles acreditava que a sigla engrossaria as fileiras da oposição a partir do ano que vem.

Paralelamente, o vice-presidente eleito e coordenador da transição, Geraldo Alckmin, anunciou os nomes de mais 74 deputados e senadores que vão integrar o governo provisório. A lista contém representantes das diferentes matizes ideológicas filiadas a PSD, MDB, PT, PDT, Solidariedade, PCdoB, Avante, Pros, Rede, PSB, PSOL e PV. Em comum, todas demonstram disposição de caminhar com Lula. O partido com maior quantidade de membros anunciados ontem é o PT, com 31 nomes. Já o PSD foi contemplado com dez postos e o PSB, com 7.

O time de novos integrantes da transição tem personagens como o deputado federal Alexandre Frota (Pros-SP), que atuará no núcleo temático da cultura, o deputado federal eleito Mauro Benevides (PDT-CE), que foi o principal assessor econômico da campanha presidencial de Ciro Gomes e integrará o grupo responsável pelo planejamento, e o deputado federal e candidato a senador derrotado Alessandro Molon (PSB-RJ). Também serão incorporados a senadora Leila do Vôlei (PDT-DF), para o grupo de Esportes, e a deputada federal e candidata a governadora de Pernambuco derrotada Marília Arraes (Solidariedade-PE).

Não por acaso, a relação divulgada por Alckmin é formada tanto por parlamentares que estão em fim de mandado quanto por recém-eleitos. O futuro governo precisa do Congresso desde já. Antes mesmo assumir, Lula tenta aprovar a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) da Transição. O texto abre espaço de R$ 198 bilhões no orçamento para bancar parte das promessas feitas pelo petista, como a manutenção do pagamento de R$ 600 do Auxílio Brasil, que voltará a se chamar Bolsa Família.

Durante entrevista coletiva em que anunciou os novos nomes, Alckmin afirmou que Lula não vai anunciar os futuros ministros de seu governo na “correria”.

— Sobre os ministros, o presidente Lula tem 40 dias para ir anunciando — disse Alckmin, que citou o seu próprio caso quando foi eleito governador de São Paulo, ocasião em que demorou a escolher secretários, e acrescentou: — A gente não deve ter essa correria.

Ele foi questionado sobre a ausência de nomes para a área de Defesa, um dos poucos núcleos temáticos para o qual ninguém foi escalado até agora. Alckmin afirmou que eles seriam conhecidos nos próximos dias, depois que Lula chegasse em Brasília, o que estava previsto para ocorrer ontem à noite. Mais tarde, porém, o petista cancelou o embarque, e não foi confirmado se ele irá à capital nesta semana.

O Globo