Projeto que inviabiliza ONGs avança na Câmara

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Foto: Câmara dos Deputados

Na pauta da Câmara desta terça-feira, o projeto de lei que regulamenta a atividade do lobby no país é alvo de críticas de um grupo de organizações não governamentais (ONGs) que veem falhas na proposta em discussão. O texto prevê uma série de normas para a atividade profissional de entidades que atuem na “representação de interesses”, o que envolve lobby de empresas, mas também causas como a ambiental, indígena, antirracista, entre outras. São previstas punições como multa e suspensão da atividade profissional para quem desrespeitar as regras criadas pela nova lei.

Segundo o texto, as infrações, no caso das entidades, seriam punidas primeiro com advertência e, depois, por uma suspensão da atividade profissional de 30 dias até um ano. Essa suspensão proibiria uma ONG de participar de audiências públicas ou fóruns, ou até de se reunir com parlamentares.

A intenção do projeto é regulamentar uma atividade comum tanto no Executivo quanto no próprio Conrgesso. A proposta determina, por exemplo, que todas as reuniões com representantes de empresas ou entidades deverão ser divulgadas pelo governo em até três dias úteis. A ordem é detalhar informações como data, horário, local e razão do encontro.

O relatório prevê também que entidades que representam interesses possam fornecer brindes de baixo valor econômico ou promover “hospitalidade” em eventos, mas só se pagarem diretamente aos fornecedores os custos da viagem e hospedagem e seja respeitada a integridade profissional.

O assunto é discutido há quase 40 anos no Congresso, mas nunca avançou por falta de consenso em alguns pontos. O Chile foi o primeiro e até hoje é o único país da América Latina a regulamentar o lobby, que tem lei própria desde 2014.

Segundo nota assinada por mais de 60 ONGs (organizações não governamentais), o projeto de lei, na prática, acabará por limitar a atuação de entidades da sociedade civil perante o Poder Público.

O argumento é que as infrações previstas estão definidas de forma muito subjetiva no texto, como, por exemplo, “atuar de forma de modo a constranger ou assediar participantes de eventos”, “prejudicar ou perturbar reunião” e “deturpar dolosamente o teor de dispositivo de lei, de nota técnica ou ato de autoridade, bem como de depoimentos, documentos e alegações”.

“São infrações altamente subjetivas, que permitirão a qualquer autoridade que se sinta contrariada com o posicionamento ou o questionamento de uma organização da sociedade civil abrir um procedimento administrativo e penalizar aqueles que a criticarem ou a seus aliados”, diz a nota.

O documento é assinado pela SOS Mata Atlântica, WWF Brasil, Transparência Brasil, Médico sem Fronteiras, Observatório do Clima, Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), Conectas Direitos Humanos, Greenpeace Brasil, entre outras organizações.

O líder do PT, Reginaldo Lopes (MG), disse que é contra a votação do texto como está hoje.

— O (texto atual) do projeto é fraco. Só quer policiar quem entra no Congresso — diz, se referindo à atuação de lobistas e entidades nos corredores do Senado e da Câmara.

A proposta da Câmara, segundo essas entidades, “limita severamente o direito democrático de participação e manifestação da sociedade civil, o que contraria não só a Constituição, como tratados internacionais dos quais o Brasil é signatário”.

O relatório, do deputado Lafayette Andrada (Republicanos-MG), está na pauta da sessão da Câmara dos Deputados na tarde desta terça-feira. Procurado, ele não respondeu. O projeto original, apresentado por Carlos Zarattini (PT-SP) em 2007, não previa as punições criticadas pelas ONGs. Se o texto for aprovado, ainda precisará passar pelo Senado.

“O projeto mantém graves lacunas sobre a isonomia, ao estabelecer regras idênticas para setores com características diversas e que defendem direitos e interesses completamente diferentes, igualando a representação de interesses econômicos aos defensores de interesses individuais homogêneos, difusos e coletivos”, diz a nota assinada pelas ONGs.

No relatório, está prevista também a punição para infrações como prometer vantagens a agentes públicos e ocultar os clientes contratantes, entre outras hipóteses de falta de transparência e integridade. Os agentes que deixarem de ser transparentes — especialmente deixando de divulgar encontros com lobistas — ou receberem vantagens indevidas também incorrerão em infrações punidas pela lei.

O Globo