Bolsonaro inventou que Forças Armadas são um Poder
Foto: Ricardo Stuckert
A demissão do comandante do Exército Júlio César de Arruda pelo presidente Lula, realizada neste sábado, pode ser interpretada como uma tentativa de retomada do controle dos civis sobre os militares. O general Arruda foi substituído por Tomás Miguel Ribeiro Paiva, Comandante Militar do Sudeste e favorito de aliados do presidente para ocupar o posto.
A análise é de estudiosos do tema que veem uma nova fase após os atos golpistas do última dia 8, na praça do Três Poderes:
— Eu concordo com a decisão do Lula (de demitir Arruda). Precisa dar voz de comando e dizer que é o comandante supremo — afirma Renato Sérgio de Lima, presidente do Fórum Brasileiro de Segurança Pública e professor da FGV.
No fim da noite de sábado, o ministro da Defesa José Múcio Monteiro afirmou que houve uma “fratura de confiança” na relação com o Exército.
– Evidentemente, depois desses últimos episódios, a questão dos acampamentos, a questão do dia 8 de janeiro, as relações, principalmente do comando do Exército, sofreram uma fratura no nível de confiança. E nós precisávamos estancar isso logo no início desse episódio. Até para que nós pudéssemos superar esse episódio – disse o ministro em um breve pronunciamento no Palácio do Planalto.
A demissão de Arruda entra na lista de outras crises entre civis e militares desde a redemocratização. O crescimento da participação de integrantes das Forças Armadas no governo federal foi registrado no governo Dilma Rousseff (2011-2016), mas deu um salto na gestão do ex-presidente Michel Temer e se consolidou no governo do ex-presidente Jair Bolsonaro.
Durante a campanha eleitoral, Lula subiu o tom e afirmou que demitiria cerca de oito mil militares. Uma vez empossado, no entanto, o líder petista moderou as críticas em um primeiro momento, e tentou apaziguar os ares com a nomeação de José Mucio no Ministério da Defesa. Até os atos golpistas em 8 de janeiro. O episódio aumentou a desconfiança de Lula com a caserna, sobretudo após a comprovação por vídeos e fotos nas redes sociais de que militares da ativa participaram do ato e deram guarida para os acampamentos golpistas em frente aos quartéis.
Para a professora de Segurança e Política Internacional da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), Danielle Ayres, a crise atual do governo federal com as Forças Armadas “é a maior desde as investigações sobre a ditadura durante a Comissão da Verdade”, no governo Dilma. Para Ayres, a gestão Bolsonaro agravou os conflitos entre civis e militares pela retórica golpista do ex-presidente ao fomentar e insistir numa disputa de poder com o judiciário e o legislativo.
— Bolsonaro institucionalizou a ideia de que as Forças Armadas estavam no mesmo nível dos outros poderes. Principalmente ao recorrer a uma interpretação (equivocada) do artigo 142 da Constituição de que as Forças Armadas são um poder moderador. Elas estão subordinadas aos demais poderes — afirma a professora, que foi vice presidente da Associação de Estudos de Defesa entre 2020-2022.