Bolsonaro “voltará” ao país menor do que saiu
Foto: Vinícius Schmidt/Metrópoles
Apesar de ter perdido a eleição para Luiz Inácio Lula da Silva (PT), o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) impôs ao adversário a disputa mais apertada da história e conquistou mais de 58 milhões de votos, o que levou seus aliados a acreditarem que ele estava cacifado a liderar a oposição ao petista. Desde 30 de outubro do ano passado, porém, Bolsonaro tem emitido sinais dúbios aos apoiadores e perdido capital político. Para piorar, o cerco jurídico em torno do capitão reformado se aperta.
Se antecipar sua volta dos Estados Unidos para os próximos dias por motivos médicos, como sinalizou que fará, Bolsonaro vai encontrar um clima pesado no Brasil, com um de seus ex-ministros mais próximos preso e ainda sob a repercussão do quebra-quebra histórico que militantes dele promoveram em Brasília no dia de janeiro.
A gravidade do momento é reconhecida em privado mesmo pelos aliados mais próximos de Bolsonaro, avaliação que acabou se tornando pública na última semana. Durante uma sessão do Senado, o ex-ministro Ciro Nogueira (PP-PI) foi flagrado pela fotojornalista Gabriela Biló, da Folha de S.Paulo, em uma troca de mensagens no grupo “Ministros de Bolsonaro”.
Na conversa, o ex-ministro da Saúde Marcelo Queiroga afirmava aos ex-colegas de Esplanada que a invasão às sedes dos Três Poderes por “um grupo de radicais” jogou “por água abaixo” a já frágil “percepção do que foi feito no país” no mandato de seu ex-chefe.
Ciro Nogueira lê mensagens de Queiroga e Guedes sobre os ataques terroristas . Para @folha https://t.co/6OUCmDLWMk pic.twitter.com/PY0A97fDzZ
— Gabriela Biló (@gabrielabilo1) January 12, 2023
Outros políticos que foram aliados próximos de Bolsonaro já ensaiam um desembarque. O deputado federal Otoni de Paula (MDB-RJ), por exemplo, foi um bolsonarista radical, mas virou o ano participando até de posses de alguns ministros de Lula e dizendo que é hora de “virar a página do ódio eleitoral”.
Nas redes sociais e aplicativos de troca de mensagem, ambientes onde Bolsonaro sempre se movimentou com destreza e onde conquistou alcunha de “mito”, a situação tem se deteriorado desde a eleição, muito em consequência do isolamento a que o ex-presidente se auto impôs, com poucas aparições desde o fim de outubro.
Em grupos bolsonaristas monitorados pela reportagem em aplicativos como WhatsApp e Telegram, a movimentação e a distribuição de material de propaganda foram drasticamente reduzidas, sobretudo desde a iniciativa frustrada de insurreição promovida em Brasília pelos militantes mais radicalizados.
A disposição do Poder Judiciário para suspender perfis nas redes de influenciadores digitais bolsonaristas acusados de estimular os atos antidemocráticos também tem resultado em um esfriamento do apoio virtual ao ex-presidente.
Com esses reveses, no Índice de Popularidade Digital calculado pela empresa de pesquisa Quaest, o desempenho de Bolsonaro, que chegou a alcançar 88 ao longo da campanha eleitoral, numa escala que vai de 0 a 100, caiu para entre 60 e 40 após sua derrota e despencou para a casa dos 20 pontos na última semana, após o ataque de bolsonaristas a Brasília.
Lula diz que Bolsonaro não aceita o resultado eleitoral. “Ainda hoje eu vi declarações dele não reconhecendo a derrota”.
Presidente classificou grupo que questiona sua eleição como “aloprados com pouco senso de ridículo”.
Assista 👇🏻 pic.twitter.com/gWVvVT6Azs
— Metrópoles (@Metropoles) January 11, 2023
Para além das redes, porém, são as ameaças jurídicas que mais assustam Bolsonaro e seu entorno. E a temperatura subiu muito com os acontecimentos dos últimos dias: o ataque a Brasília, a postagem pelo ex-presidente, dois dia depois, de um vídeo questionando o sistema eleitoral, e da notícia da apreensão, na casa do ex-ministro Anderson Torres, do rascunho de um decreto golpista prevendo uma intervenção federal no Tribunal Superior Eleitoral (TSE).
Além dos processos em que Bolsonaro já era investigado, tanto no TSE quanto no STF, os acontecimentos recentes motivaram o PSol a pedir ao Supremo sua prisão preventiva e a suspensão de suas redes sociais. Um grupo de 80 procuradores da República também demandou ao procurador-geral da República, Augusto Aras, uma investigação criminal contra Bolsonaro por incitação ao crime, citando ataques dele às instituições democráticas ao longo dos últimos anos e o vídeo publicado e apagado horas depois, no último dia 10.
E, no início da noite da última sexta (13/1), o Supremo Tribunal Federal incluiu Bolsonaro no inquérito que apura a instigação e autoria intelectual dos atos antidemocráticos que resultaram em episódios de vandalismo e violência em Brasília.
O pedido foi feito pelo Ministério Público Federal, que acusa Bolsonaro de incitar a prática de crime ao postar vídeo em 10 de janeiro questionando a lisura das eleições presidenciais de 2022.
Bolsonaro também enfrenta ao menos 16 Ações de Investigação Judicial Eleitoral (Aijes), que correm no TSE e podem tirar seus direitos políticos.
Elas questionam o comportamento do ex-presidente de apostar no descrédito das instituições democráticas e o acusam de abuso de poder econômico e político, além de uso indevido dos meios de comunicação social.
O Metrópoles apurou que os advogados do PT cogitam incluir eventuais novas provas nessas ações que tramitam no TSE contra Bolsonaro. No entanto, eles entendem que é preciso esperar que as investigações avancem, para verificar se houve ligação de Bolsonaro com a minuta de decreto golpista e qual o grau de envolvimento.