Capitólio não teve apoio militar como no Brasil
Omissão, negligência, incompetência ou cumplicidade. As explicações possíveis para o comportamento do Exército antes, durante e depois das invasões que vandalizaram as sedes dos três Poderes em Brasília seguem indefinidas uma semana após o famigerado 8 de janeiro de 2023.
Para o antropólogo Piero Leirner, 54, professor titular da Universidade Federal de São Carlos e que pesquisa as Forças Armadas há mais de 30 anos, só não dá para dizer que os militares não tiveram
nada a ver com essas ações.
“Entre as pessoas que protagonizaram os ataques estavam militares da reserva e parentes de militares. Estavam acampados há tempos na frente aos quartéis. Em Brasília, estavam ao lado do Centro de
Inteligência do Exército”, aponta o autor de “O Brasil no Espectro de uma Guerra Híbrida” (Alameda Editorial, 2020).
O antropólogo Piero Leirner, professor da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar) e autor de “O Brasil no Espectro de uma Guerra Híbrida”, pesquisa as Forças Armadas há três décadas
O antropólogo Piero Leirner, professor da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar) e autor de “O Brasil no Espectro de uma Guerra Híbrida” – Arquivo Pessoal
Para ele, “o modo de ação de militares é minimizado, como um programa que está rodando, e a gente não vê, porque eles produziram algo extremamente vantajoso para si: um laranja, o ex-presidente Jair Bolsonaro, para que absorvesse todos os males”.
“Tudo é feito em nome de ‘bolsonaristas radicais’. Mesmo os generais que começaram a produzir ameaças foram chamados de generais bolsonaristas. O uso desse adjetivo faz parecer que se trata de adesão pessoal, e não de projeto”, afirma.
Sugere que esse projeto vem de longa data, visando a estabelecer um centro de governo fincado na inteligência militar como grande dispositivo avaliador do Estado e suas políticas no Brasil. “Para
isso, é preciso um mega dispositivo de informações e um arcabouço legal que dê blindagem efetiva aos militares.”
Segundo Leirner, o efeito mais visível desse projeto são os milhares de militares alocados em cargos civis nas instituições de Estado. Mas o mais importante são os atos e decretos dos últimos anos que concentraram controles em órgãos comandados por generais, como o GSI (Gabinete de Segurança Institucional).
A transição da área da Defesa, diz, é um índice do problema. “Foi a única área em que não houve discussão, num processo pouco transparente que sugere que as escolhas na Defesa foram, na verdade, acordos ou imposições”, aponta Leirner.
Em resumo, diz, só há dois modos de entender a ausência de medidas de contenção dos manifestantes golpistas por parte do governo. “Ou Lula não foi informado sobre o que estava acontecendo, ou foi omisso.”
Folha